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Guarapiranga recebe mil sacos de lixo/mês

OESP, Metrópole, p. C1, C3
13 de Abr de 2009

Guarapiranga recebe mil sacos de lixo/mês

Daniel Gonzales

O trabalho é difícil e artesanal: a bordo de um pequeno barco, três homens recolhem com as mãos o máximo que conseguem do lixo que se acumula nas margens do principal manancial da capital paulista, a Represa do Guarapiranga, na zona sul, responsável pelo abastecimento de 4 milhões de pessoas (20% da Região Metropolitana de São Paulo). Os "lixeiros da represa" bateram, em fevereiro, o recorde no volume de lixo retirado da água: cerca de mil sacos.

A Companhia de Saneamento Básico do Estado (Sabesp) decidiu investir em uma operação cata bagulho própria, chamada Defesa das Águas, porque o grande volume de sujeira estava, todos os meses, entupindo os dutos de captação de água para tratamento e distribuição à população, que ficam próximos da foz do Rio Guarapiranga. Desde que a iniciativa teve início, há dois anos, já se retirou da represa um volume equivalente a 1,1 milhão de litros de resíduos, equivalentes a 11 mil sacos de lixo grandes. "Éramos obrigados, quase mensalmente, a recorrer a mergulhadores para desentupir os canos e assegurar o fluxo de água", diz Alexandre Bueno, encarregado de Operações da Sabesp.

As bombas, automatizadas, sugavam a sujeira para dentro do sistema. "Agora, com a coleta de lixo em nove pontos que mapeamos, não é necessário mais fazer isso frequentemente", ressalta Bueno. Neste ano, nenhuma ação subaquática foi necessária. Mesmo assim, perto da torre de captação, 273 sacos de lixo acabaram recolhidos neste ano. Com as chuvas fortes, o problema piorou. Os cinco afluentes do Guarapiranga trouxeram mais lixo dos bairros próximos, onde vivem 800 mil pessoas. Assim, aumentou a quantidade de "ilhas" de sujeira no enorme reservatório, construído artificialmente na década de 1900 - com o tamanho de 2,6 mil campos de futebol.

A proliferação de plantas aquáticas, os aguapés, incentivada pelo calor, também contribuiu para reter mais lixo entre as raízes. E o cheiro da água ficou bem pior. Foi o que notaram frequentadores das praias ao longo da Avenida Presidente Kennedy, na região da Capela do Socorro. "A água cheira forte e a gente vê mesmo muito lixo boiando. O pessoal também não colabora e joga muito resto de comida e embalagens na água", reclama Kelly Yunes de Oliveira, de 23 anos, que costuma levar os filhos à represa nos fins de semana.

Nos próximos dias, o cata bagulho aquático ganhará o reforço de dois barcos tipo balsa, munidos com esteiras e pás para fazer o recolhimento e a rolagem do lixo, para posterior reciclagem - um deles tem até canhão de água. Os equipamentos foram recentemente adquiridos pelo Estado, a um custo de R$ 200 mil cada um. Apelidadas de cata lixo, as embarcações, únicas no País, estão atracadas na represa, mas ainda dependem de uma autorização especial da Marinha para entrar em serviço. Um protótipo foi testado, com sucesso, no Rio Pinheiros. Com o casco chato, se consegue chegar mais perto das margens da represa e cada barco tem capacidade para armazenar 6 toneladas de lixo.

Por meio de um acordo com a Prefeitura, todo o lixo coletado pela empresa estadual fica disposto na área da Marina Santa Clara, um galpão abandonado, onde os caminhões do governo municipal coletam e levam o material para reciclagem. A Sabesp ainda trabalha atualmente em um processo de identificação da propriedade do edifício, para pleitear a desapropriação e a transferência de posse para o governo do Estado.

Lixeiros da represa recolhem de pneus a copiadoras
Para facilitar serviço, serão instaladas "ecobarreiras" flutuantes nos pontos críticos da Guarapiranga

Daniel Gonzales

Enquanto os novos barcos não entram em operação e a coleta de lixo é feita "na mão", o trabalho dos catadores de lixo na Represa do Guarapiranga é penoso e cheio de surpresas. Munidos com um garfo-arpão e luvas, os catadores navegam em dois barcos, que andam juntos. O menor, a motor, serve para se alcançar as margens, em meio a um mar de plantas aquáticas. O maior sai vazio e volta carregado de sacos de lixo. Em meio aos aguapés, a primeira luta é contra os mosquitos. Depois, o sofrimento é para afastar as plantas, chegar ao lixo e apanhar a sujeira presa nas raízes.

Para facilitar os serviços, além da entrada em operação das novas embarcações, um projeto da Sabesp, que sai do papel ainda neste mês, é instalar "ecobarreiras" flutuantes, feitas com tambores vazios, para reter a sujeira perto da foz dos córregos e ribeirões que deságuam na represa.

Um dos pontos mais críticos da represa é a foz do Córrego Guavirituba, próxima da Riviera Paulista. Ali, em cinco minutos, 12 sacos são recolhidos. "Outro dia, achamos uma fantasia de carnaval usada e, uma vez, encontramos um par de chifres, daqueles que o pessoal coloca para decorar paredes", conta Fernando Aguiar, piloto de barco, há oito anos na represa, e há dois trabalhando na coleta dos resíduos nas margens.

Entre a média de 50 sacos por dia, cada um com 100 litros, retirados das águas (em fevereiro), a lista é extensa: bolas, brinquedos, cachorros e cavalos mortos - "outro dia tinha um pit bull ainda acorrentado", diz Aguiar - máquinas, carrinhos de bebê, chuveiros, restos de móveis, pneus, televisores, rádios, uma copiadora de xerox, peças de automóveis. Perto da Avenida Presidente Kennedy, marrecos, patos e outros animais aquáticos nadam em meio a garrafas pet e sujeira. Com a represa cheia - a Guarapiranga estava com 90% do nível, na semana passada - todo o entulho fica acumulado nas margens, à vista de todos.

ESGOTO

A maior parte dos artigos, porém, não é deixada pelos frequentadores, mas atirada nos afluentes - os Rios Embu-Mirim, Embu-Guaçu, Bonito e Parelheiros e os Córregos Guavirituba e Itupu. Além do lixo, poluentes industriais, areia e óleo de veículos, eles também carregam esgoto para a represa. A previsão da Sabesp é despoluir os cursos d?água até o fim de 2012. De dois anos para cá, o Projeto Córrego Limpo, em parceria com a Prefeitura, investiu R$ 18,5 milhões na limpeza, que já contempla o tratamento de 70% do esgoto lançado nos córregos e, por consequência, na represa. A intenção, segundo os governos do município e do Estado, é resgatar a vocação do Guarapiranga como centro turístico para a classe média.

OESP, 13/04/2009, Metrópole, p. C1, C3

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