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Grupos de direitos humanos miram bancos

FSP, Dinheiro, p.B3
06 de Nov de 2004

Grupos de direitos humanos miram bancos
Setor financeiro é novo alvo de ONGs, que contestam empréstimo a projetos que causam danos ambientais ou sociais
Alison Maitland
Do Financial Times
Companhias de petróleo, de mineração e de varejo podem ser o alvo principal das campanhas de direitos humanos por causa de suas operações e cadeias de fornecimento nos países pobres em desenvolvimento. Mas o setor bancário está sendo cada vez mais observado por seu papel no financiamento de projetos que podem envolver abusos aos direitos humanos.
Grupos ambientalistas recentemente pediram a alguns bancos, entre os quais Goldman Sachs, Merrill Lynch e HSBC, para não vender títulos em valor superior a US$ 2 bilhões em nome do Banco de Desenvolvimento da China e do Banco de Exportações e Importações da China. Eles afirmaram que os títulos seriam usados para financiar projetos de infra-estrutura polêmicos, incluindo a Barragem das Três Gargantas.
Em contatos posteriores com as instituições financeiras, os ambientalistas foram informados de que o Banco de Desenvolvimento da China deu uma garantia verbal de que o capital obtido não será usado na barragem, disse Peter Bosshard, diretor de políticas da International Rivers Network, sediada na Califórnia. "Nós gostaríamos de ver uma declaração por escrito do CDB que vá além do projeto das Três Gargantas", ele disse. "Também gostaríamos de saber como os credores vão monitorar o cumprimento das garantias dadas pelo CDB."
Alguns grupos de pressão se concentram especificamente no setor financeiro, como o BankTrack, uma aliança de 15 organizações que inclui a Friends of the Earth e a Rainforest Action Network. O grupo monitora o impacto das finanças privadas e faz campanha para que sejam "estritamente justificadas à sociedade como um todo". A rede Bankwatch, na Europa Central e Oriental, analisa o financiamento internacional de projetos na região.
Os ativistas não são os únicos que estão aumentando a pressão. Investidores institucionais, especialmente aqueles envolvidos em fundos socialmente responsáveis, estão fazendo mais indagações sobre governança, ética e direitos humanos.
A Corporação de Finanças Internacionais (IFC), o braço de empréstimos ao setor privado do Banco Mundial, está levando em conta os direitos humanos para atualizar as salvaguardas que adota para administrar riscos sociais e ambientais em projetos nos países em desenvolvimento. "Dois ou três anos atrás os direitos humanos talvez não estivessem na agenda das instituições financeiras, mas a paisagem está mudando rapidamente", diz a IFC.
Depois existe o constante risco de litígios. Ed Fagan, o advogado americano famoso por processar bancos suíços em nome de sobreviventes do Holocausto, está pedindo US$ 20 bilhões para vítimas de segregação racial, de acordo com a Lei de Alegações de Erros contra Estrangeiros dos Estados Unidos. As companhias visadas por ele incluem Barclays, NatWest e Standard Chartered.
Os grupos financeiros também estão sendo examinados sobre as condições de trabalho em suas próprias cadeias de fornecimento, especialmente quando os empregos são terceirizados, no próprio país ou no exterior. O HSBC foi atacado recentemente por sindicatos por causa de um atraso no aumento de salários prometido para faxineiros terceirizados que trabalham em sua sede em Londres. Em resposta, o banco disse que não podia comentar salários e condições de contrato de funcionários da empresa.
Diante dessas pressões crescentes, os bancos não podem simplesmente ignorar as questões de direitos humanos, diz um novo estudo da KPMG e da F&C Asset Management, uma administradora de investimentos européia com US$ 217 bilhões de fundos sob sua gestão. "Eles provavelmente continuarão sendo chamados ao debate sobre direitos humanos, senão por vontade própria, por obrigação."
Alguns já estão agindo. No mês passado o ABN Amro, o maior banco holandês, revelou que vai analisar os históricos de direitos humanos e corrupção dos países, para reduzir sua exposição a investimentos de alto risco. O ABN salientou os dilemas envolvidos em equilibrar interesses conflitantes. Um exemplo foi sua decisão de apoiar o oleoduto patrocinado pela BP, que atravessa o Azerbaijão, a Geórgia e a Turquia, diante das preocupações de grupos de pressão sobre o risco para as comunidades e o ambiente.
O estudo diz que a reação do setor à sua crescente vulnerabilidade sobre direitos humanos está aumentando aos poucos. "Os direitos humanos estão definitivamente crescendo na agenda corporativa, embora ainda sejam administrados de maneira aleatória e haja pequeno consenso na indústria sobre como abordar os desafios que se apresentam."
As principais preocupações incluem direitos e segurança de funcionários, administração da cadeia de abastecimento, litígios, inadimplência em empréstimos e "o risco para a reputação pelo fato de ser visto como cúmplice de abusos de direitos humanos cometidos por clientes".
Surpreendentemente, diz o estudo, há poucas evidências de que os bancos estejam incluindo sistematicamente questões de direitos humanos em suas avaliações de riscos soberanos ou em projetos. "Todos os indícios são de que as instituições financeiras terão de refinar sua abordagem da administração de riscos de direitos humanos no futuro próximo."
A F&C, recém-formada pela fusão entre F&C Management e Isis Asset Management, diz que pretende usar as conclusões de suas conversas com companhias financeiras sobre administração de riscos sociais e ambientais. "Esse estudo servirá para aumentar a compreensão dos diversos fatores que podem afetar o sucesso comercial e as valorizações financeiras em longo prazo", diz.
O relatório, intitulado "Banking on Human Rights", examina as práticas de nove bancos importantes, incluindo Barclays, HSBC, Morgan Stanley e UBS. Os bancos - sendo os demais ABN Amro, Credit Suisse, Rabobank, Royal Bank of Scotland e Standard Chartered - foram escolhidos devido a seu compromisso público com direitos humanos e seu alcance geográfico.
O estudo salienta exemplos de boas práticas, a começar por uma estratégia abrangente de administração de direitos humanos, dirigida do topo. No Barclays, por exemplo, a responsabilidade por direitos humanos cabe ao vice-presidente, Chris Lendrum.
Alguns bancos estão consultando grupos de direitos humanos quando elaboram políticas de treinamento. O Credit Suisse e o ABN Amro buscam a Anistia Internacional. O HSBC trabalha como World Wildlife Fund.
"O fato animador é que alguns bancos começam a perceber o grande leque de maneiras como os direitos humanos podem impactar suas empresas", disse Mike Kelly, diretor de responsabilidade social corporativa no KPMG. "Estamos vendo o surgimento de novos tipos de parceria que nem se sonharia cinco anos atrás."

FSP, 06/11/2004, p. B3 (Dinheiro – Especial)

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