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Grupo interdita trecho da BR-101 em protesto contra a morte de indígena na Bahia: 'parem de nos matar'

G1 Bahia - https://g1.globo.com
26 de Jan de 2024

Conhecida como Nega Pataxó, Maria Fátima Muniz de Andrade era liderança espiritual e professora com importante atuação junto aos jovens e mulheres indígenas.
Por g1 BA e TV Santa Cruz

26/01/2024 15h41 Atualizado há 4 dias

Um grupo fez um protesto nesta sexta-feira (26), em um trecho da BR-101, em frente ao Parque Nacional de Monte Pascoal, na cidade de Itamaraju, no sul da Bahia. O ato ocorreu em manifestação a morte de Maria Fátima Muniz de Andrade, assassinada a tiros no domingo (21).

Os indígenas também reivindicaram a celeridade na demarcação dos territórios. "Parem de nos matar", foi a frase escrita em um dos cartazes levados pelos manifestantes.

Na segunda-feira (21), integrantes do Movimento dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST) já tinham interditado trechos da BR-101, nas cidades de Teixeira de Freitas, Itamaraju e Itabela, também em protesto pela morte de Maria Fátima Muniz.

Em nota, o MST informou que cerca de 500 famílias participaram da ação, se solidarizou com o povo Patoxó Há-Há-Háe e pediu celeridade nas investigações.

Filha pede justiça
"Ela foi assassinada brutalmente", disse a filha da indígena Maria de Fátima Muniz, conhecida como Nega Pataxó, morta a tiros durante um ataque de fazendeiros na Fazenda Inhuma, na região de Potiraguá, no sul da Bahia. Ela era pajé e irmã do cacique Nailton Muniz, do povo Pataxó Hã Hã Hãe, baleado na ação.

Tainá Muniz lamentou a morte da mãe e afirmou que não é verdadeira a versão relatada pelos fazendeiros e comerciantes suspeitos de envolvimento no crime.

"Não foi só um tiro, eles agrediram ela. Então a gente quer justiça por isso e também que a Lei Maria da Penha entre [em ação] porque eles bateram muito em mainha, não só no rosto como no corpo dela também", afirmou a filha de Nega Pataxó.
Tainá também destacou a posição que Nega Pataxó representava para o povo Pataxó Hã Hã Hãe.

"A gente não quer que fique por isso mesmo, porque ela era uma grande líder e hoje ela está fazendo falta para a gente. Está doendo muito e o coração da gente está sangrando", disse Tainá Muniz.
Pajé, professora e irmã de cacique: conheça indígena morta durante disputa de terras na Bahia
Caciques da etnia Pataxó Hã Hã Hãe se reuniram na quinta-feira (25), com representantes dos direitos humanos, órgãos municipais e estaduais e da Defensoria Pública da Bahia na Aldeia Caramuru/Paraguassu para discutir o conflito por disputas de terra na região.

Entre os assuntos, eles falaram sobre a Lei e Reestruturação Organizacional, sancionada pelo governador Jerônimo Rodrigues, que permite a criação da Companhia de Mediação de Conflitos Agrários.

Segundo o Ministério dos Povos Indígenas, Nega Pataxó era liderança espiritual e professora com importante atuação junto aos jovens e mulheres indígenas.

Bahia tem a segunda maior população indígena do Brasil e mais de 90% dela vive fora de territórios étnicos, aponta IBGE
Assim como o irmão, ela integrava redes de saberes tradicionais de universidades brasileiras, sendo doutora em Educação por Notório Saber pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). O cacique Nailton Muniz também é doutor por Notório Saber em Comunicação Social pela mesma universidade.

O corpo de Maria de Fátima Muniz foi velado com a presença de dezenas de indígenas, da ministra Sônia Guajajara e de sua comitiva formada por lideranças, entre elas a presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, e a deputada federal Célia Xakriabá (PSOL).

Em meio à repercussão da morte da indígena Nega Pataxó, o governador Jerônimo Rodrigues (PT) sancionou na segunda-feira (22), a Lei de Reestruturação Organizacional. A legislação permite a criação da Companhia de Mediação de Conflitos Agrários e Urbanos (Cimcau) da Polícia Militar.

Trata-se de um departamento dedicado a questões que envolvem povos originários, comunidades tradicionais, movimentos sociais e grandes coletividades de pessoas. Nesse sentido, conflitos relacionados à posse de terras, como o que vitimou a indígena, serão tratados pela companhia.

"É essencial que o estado tenha uma companhia que trate dos temas de crises, de conflitos rurais e urbanos, de forma exclusiva e estratégica. A criação dessa e de outras unidades faz parte do compromisso do Governo do Estado em fortalecer o trabalho das nossas forças de segurança", disse Rodrigues.
O texto foi sancionado durante agenda da gestão em Feira de Santana, cidade a cerca de 100 km de Salvador.

A companhia foi instalada na capital baiana, mas a atuação da PM vai abranger também o interior.

De acordo com a gestão estadual, a iniciativa dá à Bahia um instrumento inovador de policiamento ostensivo, a fim de qualificar a resposta do Estado para casos complexos de disputas fundiárias em que há risco de confronto. A Cimcau vai trabalhar junto à coordenação de conflitos fundiários da Polícia Civil, também criada pelo governador.

O major José Pinho da Silva estará à frente da companhia, responsável pelo planejamento, coordenação e execução das ações de segurança pública durante o cumprimento de mandados judiciais de manutenção ou reintegração de posse.

O governo estadual afirma que os policiais militares que atuarão na unidade terão formação especializada em:

mediação de conflitos;
gestão de crise;
estrutura agrária do Brasil;
combate ao racismo e promoção dos direitos de povos e comunidades tradicionais, podendo intervir de maneira preventiva e intersetorial.
Ataque a tiros
A área foi ocupada por indígenas no sábado (20), por ser considerada pelos Pataxó Hã Hã Hãe como de território tradicional. O ataque ocorreu no domingo (21), quando os fazendeiros e comerciantes cercaram a área com dezenas de caminhonetes e tentaram recuperar a propriedade com uso de violência, sem decisão judicial.

O filho de um fazendeiro, de 20 anos, e um policial militar reformado foram presos em flagrante. A Polícia Civil de Itapetinga, que investiga o caso, disse que um laudo de microcomparação balística confirmou que o tiro que matou Nega Pataxó partiu de um revólver calibre 38, disparado pelo jovem.

Além da morte da indígena, a dupla presa é suspeita de tentar matar o cacique Nailton Muniz Pataxó. Ele foi atingido no rim e passou por cirurgia no Hospital Cristo Redentor, em Itapetinga. Depois do procedimento, ele foi transferido para outra unidade de saúde, cujo nome não foi divulgado por questão de segurança.

Outros indígenas ficaram feridos na ação, entre eles uma mulher que teve o braço quebrado. Eles foram hospitalizados, mas não correm risco de morte. Um fazendeiro também teve o braço ferido por uma flecha.

Por causa da violência na região, comunidades tradicionais pediram reforço de segurança à Força Nacional. Até a manhã desta quinta, ainda não receberam resposta.

Ministra na Bahia após episódio de violência

Na segunda-feira (22), uma comissão, liderada pela ministra Sonia Guajajara, visitou a Bahia para acompanhar a investigação do ataque. Na terça (23), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se colocou à disposição para encontrar uma solução "pacífica" sobre disputa de terras que terminou com a morte da indígena.

De acordo com a Secretaria de Segurança Pública (SSP-BA), a situação aconteceu durante a ação de um grupo intitulado Movimento Invasão Zero. Já o Ministério dos Povos Indígenas afirmou que o ataque aconteceu por causa de disputa de terras entre indígenas e fazendeiros.

Ainda de acordo com o MPI, cerca de 200 ruralistas da região se organizaram através de um aplicativo de mensagens e convocaram os fazendeiros e comerciantes para recuperar a área por meios próprios. Eles cercaram o local com dezenas de veículos.

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Além dos fazendeiros que foram detidos, um indígena que portava uma arma artesanal também foi preso. Quatro armas de fogo encontradas com os fazendeiros foram apreendidas e encaminhadas para o Departamento de Polícia Técnica (DPT).

A Secretaria da Segurança Pública determinou o reforço, por tempo indeterminado, do patrulhamento ostensivo na região.

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