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Governo precisa definir política indigenista para preservar os direitos históricos desses povos, diz Francisco Loebens,

Correio da Cidadania-São Paulo-SP
Autor: Rodrigo Valente
07 de Mai de 2003

Há algumas semanas, estivemos diante de episódio polêmico evolvendo a homologação e a demarcação das terras Raposa/Serra do Sol em Roraima, onde surgiram denúncias de que o governo estaria negociando a não demarcação de tais terras para obter apoio de políticos do estado para suas reformas. Para comentar o episódio e avaliar a política indigenista, o Correio entrevistou Francisco Loebens, dirigente do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Para Loebens, o governo Lula deve sinalizar mudança em sua política, homologando a demarcação das terras Raposa/Serra do Sol em Roraima.

Correio da Cidadania: Qual sua avaliação sobre a política indigenista praticada pelo governo Lula até o momento?
Francisco Loebens: Pouca coisa nova aconteceu até agora. O que existe é uma grande indefinição em relação a essa política. Os setores indígenas e as entidades de apoio a esses povos estavam na expectativa de que poderia haver uma sinalização concreta de mudança e que uma nova política viria a responder efetivamente aos direitos dos povos indígenas. Seria um marco importante nessa mudança exatamente a homologação das terras indígenas Raposa/Serra do Sol em Roraima, que, por motivos injustificáveis até agora, não foram homologadas pelo governo.

CC: Segundo matéria do jornal Folha de São Paulo (20/04/2003), está havendo uma escalada de violência nas disputas por demarcação de terra. A que você atribui esta escalada?
FL: Esse aumento da violência é decorrência dessa indefinição e da articulação dos setores anti-indígenas, que encontram espaço para acirrar o conflito pela posse das terras. Já no início desse ano, tivemos as mortes de 7 lideranças indígenas, a maioria delas por motivos de terra. Isso evidentemente se dá em função da timidez da resposta do governo em relação à afirmação dos direitos indígenas. Por isso, os setores anti-indígenas ganham força na disputa de seus interesses, e isso repercute no aumento da violência contra os índios e suas comunidades.

CC: Neste momento, quais têm sido os maiores obstáculos para a demarcação de terras?
FL: Na questão da garantia das terras indígenas, existem situações diferentes pelo país afora. Alguns problemas são diretamente ligados às terras indígenas que já foram demarcadas, mas que, atualmente, estão ocupadas por terceiros que retêm a posse dessas terras e que acirram o conflito. Existe uma outra situação que são as terras indígenas que ainda dependem de demarcação o governo, entre as quais está a terra indígena Raposa/Serra do Sol, que neste momento aguarda o decreto de homologação. Todos os índios de Roraima e do país estão se perguntando por que a homologação não está saindo, se não existe nenhum problema, já que todas as fases anteriores do processo demarcatório já foram concluídas. Existem ainda terras onde nenhuma providência oficial foi tomada. Inclusive, nesse último encontro nacional dos povos e organizações indígenas, houve uma reivindicação para que sejam agilizados os grupos de trabalho para identificação de limitação de terras indígenas no Brasil.

CC: Em relação à não homologação das terras Raposa/Serra do Sol em Roraima, fala-se que houve acordo político entre o governo federal, o governador, que trocou sua antiga sigla pelo PT, e a bancada do estado no Congresso, para que essa apoiasse as reformas propostas pelo governo em troca da não homologação. O que o CIMI tem a dizer sobre essa questão?
FL: Percebemos uma estratégia muito clara dos políticos de Roraima no sentido de imigrarem para a base de apoio do governo federal com o intuito de inviabilizar as demarcações. Inclusive, saiu na imprensa que a condição que o governador Flamorion Portela estava colocando para sua filiação ao Partido dos Trabalhadores era que o governo Lula vetasse a demarcação das terras indígenas no estado. O governo tem desmentindo isso. Mas, se não houve esse acordo, por que as cinco áreas de Roraima que estão esperando demarcação, entre elas a área Raposa/Serra do Sol, não estão sendo homologadas?

CC: Qual é a expectativa do CIMI para a questão indígena nos próximos anos?
FL: A expectativa é que, de fato, o novo governo abra possibilidade da participação indígena na definição da sua política para a questão. Que se criem condições para que os diferentes povos indígenas do Brasil possam direcionar essa política, no sentido de fazerem valer os direitos históricos que esses povos têm. A expectativa é que os parâmetros dessa política possam ser definidos através do novo estatuto dos povos indígenas com base nos preceitos constitucionais de 1988.

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