VOLTAR

Governo flácido e ambíguo": diretor de ações para Amazônia pede demissão

Amazônia.org
Autor: LIMA, André
11 de Jul de 2008

Governo flácido e ambíguo": diretor de ações para Amazônia pede demissão

O diretor de ações para Amazônia do Ministério de Meio Ambiente, o advogado André Lima, pediu ontem demissão em carta dirigida ao ministro Carlos Minc. Lima alega ter apreciado as iniciativas do ministro e agradece pela confiança recebida, mas considera que o centro do governo tem conduzido nos últimos meses a questão amazônica com ambiguidade e colocando o MMA "cada vez mais isolado".
Lima fora o inspirador e coordenador das medidas tomadas desde ano passado em relação ao desmatamento. Com um passado de ativista respeitado no Instituto Socioambiental e uma "credibilidade profissional" a defender, ele faz questão de deixar claras e inequívocas as razões de sua saída, avisando que deseja prevenir quaisquer interpretações a respeito. Lista de forma objetiva as razões de sua saída, mostrando inconformidade com a ida a Noruega do ministro Mangabeira para discutir o fundo idealizado pelo MMA, assim como o adiamento da divulgação dos dados do sistema DETER do INPE.
O site Amazônia teve acesso à íntegra da carta de André Lima, que pode ser lida aqui.

Caríssimo Ministro Minc,
Como o senhor já deve ter tomado conhecimento, na data de ontem comuniquei à nossa secretária executiva meu pedido de exoneração do cargo de Diretor do Departamento de Políticas para o Combate ao Desmatamento, que exerço desde fevereiro deste ano, após outros oito meses acumulando a Diretoria de Articulação de Ações da Amazônia, na Secretaria Executiva deste Ministério.
Ajudei a formular sob a condução da Ministra Marina e do Secretário Capobianco ao longo de 2007 a estratégia de ação do Governo Federal em curso, que resultou no Decreto Federal 6.321/07, que se desdobrou na seleção dos municípios prioritários para combate aos desmatamentos na Amazônia em 2008 (os famosos 36 municípios responsáveis por 50% dos desmatamentos de 2007). Desse decreto derivaram: o recadastramento rural do INCRA, o embargo obrigatório do uso econômico das áreas ilegalmente desmatadas, a co-responsabilização da cadeia produtiva pelos desmatamentos ilegais, as novas regras para o acesso ao crédito rural definidas pelo Banco Central, os planos estaduais de prevenção e combate aos desmatamentos, a Operação Arco Verde. Essas medidas vinham até o primeiro trimestre deste ano sendo formuladas e negociadas sob a liderança do MMA e com forte apoio do centro do governo.
A situação revelada pelos dados do INPE a partir de outubro do ano passado e principalmente no início deste ano demanda por parte do governo como um todo muita clareza, transparência, firmeza, determinação e coordenação em tempo real, tal qual a dedicada ao PAC, ou aos Biocombustíveis, como resultados necessários de uma vontade política inequívoca.
Infelizmente a "ambiguidade" com que o governo vem conduzindo o tema do desmatamento na Amazônia nos últimos três meses (vide indefinição em relação à coordenação política do PPCDAm, e da Operação Arco Verde, Mangabeira na Noruega tratando de Fundo Amazônia proposto, formulado e negociado pelo MMA, atrasos na divulgação dos dados do INPE, dentre outras, nos mantém (MMA) no corner, cada vez mais isolados em uma guerra que deve, como o próprio Decreto Federal 6321/07 indica, ser pautada pela "responsabilidade compartilhada". O exemplo, portanto, deve partir obviamente do próprio centro do poder federal.
O Plano de Combate aos Desmatamentos na Amazônia proposto, formulado e coordenado por este governo federal desde 2003 e que foi determinante para os três anos consecutivos de queda nas taxas de desmatamento entre 2004 e 2007 (59%), foi um primeiro passo inédito e fundamental no rumo da estratégia da responsabilidade compartilhada. Entretanto, como já anunciávamos no meio do ano passado, e revelado com a saída da Ministra Marina, nas atuais condições de descoordenação, de per si o plano é insuficiente para manter a queda consistente e permanente da degradação de nossas florestas tropicais. Isso porque a boa política é aquela que além de enfrentar as reais causas do problema é praticada com eficiência e eficácia. Para tanto é absolutamente necessário, além da capacidade e do método de condução, a coordenação firme e fina pelo centro do nosso governo, a presidência da república por intermédio da Casa Civil, como ficou consignado no Decreto s/n de março de 2003 que criou o GT Interministerial que formulou o PPCDAm.
O senhor enquanto Ministro tem feito um trabalho importante e de destaque ao estabelecer um diálogo direto e aberto com a sociedade para manter a agenda no centro da atenção e retirar o MMA do isolamento a que está submetido ganhando apoio junto à sociedade. Mas é preciso um sinal claro e explícito do centro do nosso governo para que toda a burocracia caminhe de forma integrada com ações concretas e estratégicas. Constância é fundamental nessa agenda onde um mês pode fazer uma grande diferença. A falta desse atributo é flagrante em relação ao tema em questão. O governo responde apenas às taxas de desmatamento e mais recentemente até isso passa a ser questionado o que é sintomático e gravíssimo.
Em função da flacidez, da forma periférica e, no mínimo, ambígua com que o centro do governo vem tocando o assunto nos últimos meses, notadamente a partir da reação de parte da sua base aliada que se sente no mínimo desconfortável com o acerto e a vitalidade das medidas em curso é que se torna inviável minha permanência no MMA. Sou socioambientalista já com alguns anos de militância, não sou técnico ou gestor público do MMA, não estou no governo na qualidade de militante de partido político e, portanto, não posso mais sacrificar minha vida particular (tempo com a família, condição financeira) e credibilidade profissional nessa condição que foge totalmente da minha governabilidade.
Me coloco a sua total disposição para esclarecer os detalhes que voce julgar necessário conhecer. No front junto à sociedade civil organizada,onde quer que eu vá oferecer minha energia profissional e militância, me coloco ao seu dispor para ajudar no que for preciso e possível para construirmos fora da burocracia de governo alternativas estratégicas que o auxiliem na formulação e proposição de ações e pactos que façam a agenda avançar com qualidade e eficácia.
Estou a disposição da Secretária Izabella por mais alguns dias para transferir de forma responsável ao meu (minha) sucessor(a) a agenda e a estratégia em curso.
Grato pela confiança que me foi dada.
Atenciosamente,
André Lima

Amazônia.org, 11/07/2008

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.