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20 de Abr de 2016
Nessa semana, o governo federal resolveu dar prosseguimento a seis processos de demarcação de Terras Indígenas (TIs). No terça (19), Dia do Índio, a Fundação Nacional do Índio publicou os estudos de identificação e delimitação de quatro TIs, nos estados de Mato Grosso do Sul, Paraná, Amazonas e Pará - um total de 1.408.879 hectares, que elevam a sete o número de TIs identificadas nos dez meses de João Pedro Gonçalves da Costa à frente da Funai. Hoje (20) foi a vez do Ministro da Justiça Eugênio Aragão assinar as primeiras portarias declaratórias de sua gestão, reconhecendo-as como de posse permanente indígena: a TI Estação Parecis, com 2.170 hectares, e a TI Kawahiva do Rio Pardo, com 411.848 hectares, ambas no estado do Mato Grosso.
As quatro terras identificadas pela Funai tiveram seus estudos iniciados há pelo pelo menos oito anos e duas estão fora da Amazônia Legal: a TI Ypo'i/Triunfo, na fronteira do Mato Grosso do Sul com o Paraguai, e a TI Sambaqui, no litoral do Paraná. Uma das mais comemoradas pelo movimento indígena é a TI Sawre Muybu, do povo Munduruku, no Pará - diretamente impactada pela construção do Complexo de Hidrelétricas do Rio Tapajós. Na margem direita do Rio Negro (AM), está a TI Jurubaxi-Téa, identificada na mesma leva. As duas terras declaradas pelo Ministério da Justiça estão na Amazônia Legal, mas sofrem com pressão intensa de madeireiros e fazendeiros.
Para Sonia Guajajara, da coordenação da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), as ações do Executivo pela demarcação de terras são uma grande conquista. Ela frisa que o reconhecimento de terras em áreas de conflito, fora da Amazônia Legal, pode ser interpretada como uma afronta aos parlamentares da bancada ruralista, mas diz que o movimento indígena não vai recuar: "Temos que demonstrar que não estamos com medo e que estamos juntos, pressionando a Funai. A Funai tem que cumprir o seu papel institucional independentemente da situação política do momento. A nossa principal bandeira de luta continua sendo o avanço na demarcação de terras. Apesar desse contexto de pressão, ameaças e retrocessos que vivemos, não vamos recuar".
No pacote de publicações dessa semana, o Executivo também autorizou a realização de um novo concurso público para a Funai, seis anos depois do último, em 2010, além de ter reconhecido e declarado cinco áreas como Territórios Remanescentes de Quilombo. Duas semanas atrás, a presidente Dilma Rousseff já havia assinado a homologação da Terra Indígena Cachoeira Seca do Iriri, no Pará.
Espera, luta e justiça
No município de Colniza (MT), a Terra Indígena Kawahiva do Rio Pardo, declarada como de posse permanente de um povo em isolamento voluntário, conhecidos como Kawahiva do Rio Pardo, sofre com invasões de madeireiros, garimpeiros e fazendeiros - e estava à espera da assinatura do ministro da Justiça desde 2013. Em outubro de 2015, a ONG Survival International lançou uma campanha demandando urgência na proteção da terra, diante da ameaça de extermínio dos Kawahiva por madeireiros.
A TI Estação Parecis, do povo Paresi, enfrenta há anos, além da contaminação por agrotóxicos e fome, a pressão de fazendeiros, na Justiça e em área: em 2009, a cacique Valmireide Zoromará foi assassinada a tiros por um gerente da fazenda Boa Sorte, que confessou o crime. A área já havia sido declarada com 3.620 hectares em 1996, mas passou por reestudo e agora é declarada com 2.170 hectares. Em 2014, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região já havia decidido que os Paresi deveriam ter suas terras, que ocupam desde o século XIX, restituídas.
Entre as identificadas, a TI Ypo'i/Triunfo, de ocupação tradicional do povo Guarani Ñandeva, em Paranhos (MS), também é reivindicada há décadas pela comunidade indígena, que, até ver a área de 19.756 reconhecida, enfrentou despejos, perseguições e mortes de lideranças. Em 2009, Ypo'i/Triunfo foi palco de uma ação de despejo ilegal por fazendeiros da região de fronteira com o Paraguai, em que foram assassinados os professores guarani Genivaldo e Rolindo Vera. O corpo de Rolindo segue desaparecido.
A TI Sambaqui, do povo Guarani Mbya, está na área impactada por empreendimentos de construção submarina e de ampliação do canal do Porto de Paranaguá, no litoral do Paraná. A área, em que a presença guarani é documentada desde os anos 1940, foi identificada com 2.795 hectares, após oito anos de estudos.
Nos rios da Amazônia
Sawre Muybu, de ocupação tradicional do povo Munduruku no Médio Tapajós (PA), também é aguardada há anos e seu reconhecimento oficial é uma das exigências ao governo, em uma carta redigida pelos Munduruku em sua 26ª Assembleia, no início de abril. No texto, eles se dizem preocupados com a política energética dos governos Lula e Dilma e que não aceitarão a construção de cinco hidrelétricas nos Rios Tapajós e Jamanxin: "O rastro do tempo mostra o que ocorreu com os parentes do rio Tocantins, que até hoje, mais de 30 anos depois de serem expulsos de seu território, ainda esperam as compensações que o governo prometeu quando foi construída a usina de Tucuruí. As consequências do barramento dos rios Xingu, Madeira, Teles Pires, e o que aconteceu com o rio do Doce, são os maiores exemplos de que estes projetos não servem para nós".
A morosidade na publicação dos estudos de Sawre Muybu levou os Munduruku a fazer a autodemarcação de sua terra em 2014, visto que o relatório de identificação dos 178.173 hectares como Terra Indígena já estava pronto para publicação desde 2013, segundo denúncia da ex-presidente da Funai, Maria Augusta Assirati. No final de 2015, o movimento Ipereg recebeu um prêmio da ONU pela iniciativa da autodemarcação.
"É a melhor notícia que nós podíamos receber hoje", comemora Marivelton Baré, da diretoria da Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro (Foirn) e da Associação das Comunidades Indígenas do Médio Rio Negro (Acimrn). Segundo ele, a identificação e delimitação da TI Jurubaxi-Téa, nos municípios de Santa Isabel do Rio Negro e Barcelos (AM), era reivindicada pelas comunidades e pelo movimento indígena regional há 22 anos - mas os estudos de identificação só foram iniciados em 2007. Em 2014, a Justiça Federal no Amazonas obrigou a Funai a publicar os estudos de identificação de terras no Médio e Baixo Rio Negro em até dois anos, por conta das invasões e de problemas de acesso à saúde e educação diferenciadas pelas comunidades.
Marivelton conta que a morosidade no processo de identificação prejudicou por muito tempo a vida das oito comunidades dos povos Baré, Tukano, Baniwa, Nadöb, Pira-Tapuya, Arapaso, Tariana, Tikuna, Coripaco e Desana, que enfrentam a escassez de pescado e os impactos da pesca comercial, do turismo de pesca esportiva, do garimpo e da extração de madeira e seixo. Segundo Marivelton, a identificação reforça a proteção da área contra as atividades ilegais e pode ser um caminho para a organização das comunidades em torno de iniciativas de geração de renda e gestão territorial: "É garantido, é por direito e foi recebido com bastante alegria e satisfação pelas comunidades e por todos nós. Nós estamos prontos para os processos que ainda faltam, até chegar à homologação".
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