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Governo admite liberar a soja por MP

GM, Politica, p.A7
27 de Ago de 2004

Governo admite liberar a soja por MP
Falta de acordo no Congresso prejudica aprovação de lei definitiva, antes do cultivo da próxima safra. O governo já admite a possibilidade de editar uma medida provisória (MP) que autorize o plantio de soja transgênica na próxima safra, que começa a ser cultivada em outubro. Senadores da base aliada e fontes do Palácio do Planalto dizem que publicação da MP é cada dia mais provável porque a Lei de Biossegurança - que regulamentará, entre outros, o manejo de organismos geneticamente modificados (OGMs) no Brasil - não avançou durante o esforço concentrado desta semana, devido às disputas políticas que paralisaram o trabalho no Congresso.
Para ser promulgada antes do início do plantio da safra 2004/2005, o que evitaria a edição da MP, a Lei de Biossegurança terá de ser analisada em três comissões do Senado e votada nos plenários das duas Casas do Legislativo durante o próximo esforço concentrado, marcado para os dias 14, 15 e 16 de setembro. Há um outro complicador para aprovação final do texto em três dias. Antes de analisar a Lei de Biossegurança, os senadores têm de votar a Lei de Informática, que ainda gera polêmica e pode obstruir a pauta.
"O tempo não urge mais, ruge", afirma a líder do PT no Senado, Ideli Salvatti (SC). De acordo com ela, será inevitável a edição da MP caso a Lei de Biossegurança não seja aprovada em setembro. "Agora, a MP seria muito ruim", reconhece. No ano passado, quando o vice-presidente da República, José Alencar, assinou medida provisória liberando o cultivo da soja transgênica na safra 2003/2004, cumprindo ordens do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, foi deflagrada uma crise dentro do governo, em especial com a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
arina foi convencida de que a MP visava a evitar prejuízos para os agricultores brasileiras. Na ocasião, ela recebeu a garantia do governo de que a questão dos transgênicos seria regulamentada em definitivo. A assinatura da MP gerou ainda protestos de integrantes do Poder Judiciário, uma vez que uma decisão judicial condicionava o plantio da soja transgênica Roundup Ready, patenteada pela Monsanto, à realização de um estudo prévio do impacto dos OGMs no meio ambiente e na saúde humana.
O procurador-geral da República, Claudio Fonteles, também ajuizou uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF) a fim de derrubar as disposições da MP, convertida em lei em dezembro de 2003. O processo ainda não foi julgado. Nem mesmo a perspectiva de reavivar esses problemas faz o governo desistir da possibilidade de baixar uma nova MP. "Se o governo não editar, quebra o Estado do Rio Grande do Sul", declara o senador Tião Viana (AC), ex-líder do PT no Senado. A estimativa é que mais de 90% dos produtores gaúchos trabalhem com semente de soja transgênica.
As declarações de Ideli e Viana são confirmadas por um ministro envolvido nas discussões da nova Lei de Biossegurança. Os três ainda dizem acreditar na aprovação do texto, até porque o presidente Lula não gostaria de baixar uma MP de novo, segundo o ministro da Agricultura Roberto Rodrigues. Uma das estratégias do governo é aprovar requerimento de urgência que levaria o texto diretamente ao plenário do Senado, sem a necessidade de passar antes por três comissões da Casa.
No início de agosto, a Comissão de Educação aprovou relatório do senador Osmar Dias (PDT-PR). O texto garante à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) poder para liberar a comercialização de transgênicos. O Ministério do Meio Ambiente discorda e já está trabalhando nos basti-dores do Senado para restabelecer dispositivo, aprovado na Câmara, que reserva tal competência a um conselho formado por mais de dez ministérios. Outro ponto do relatório de Dias admite a utilização em pesquisa de células embrionárias já estocadas e com no máximo cinco dias de existência.
Produtores de algodão tem mesma demanda
Os produtores de algodão têm uma demanda semelhante a dos que plantam soja em todo País, em especial no Centro-Oeste. E tentam convencer Executivo e Legislativo da necessidade de liberar o uso de espécies transgênicas na próxima safra, que começa a ser cultivada na primavera. O cerne do debate é a inclusão da produção brasileira no cenário internacional, depois da vitória na Organização Mundial do Comércio (OMC).
A decisão do organismo multilateral levará a eliminação de subsídios nos Estados Unidos, o maior produtor mundial, com 4,4 milhões de toneladas ao ano. Isto beneficiaria países como Brasil. Para manter competividade no mercado externo, o País precisa ter baixo custo, e isso dependeria da utilização de transgênicos. Este rumo é apontado como sem volta pela Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa). "Ou o Brasil adota esta tecnologia ou ficará fora do mercado do algodão, pois este foi o caminho adotado por nossos concorrentes", diz Helio Tollini, diretor executivo da Abrapa, que acompanha o tema em Brasília.Outro fato circunstancial, que aumenta a pressão para uma decisão rápida do governo, a fim de legalizar os transgênicos, veio à tona nos últimos dias. Muitos fazendeiros compraram sementes, convencidos de que eram convencionais, mas as análises mostraram indícios de Organismos Geneticamente Modificados (OGMs). E o governo prometeu fiscalização dura contra quem estiver fora da lei, pois os trangêncos ainda estão proibidos.
"Se por hipótese, este tendência se confirmar em longa escala, seria um prejuízo imenso para todo o setor", avisa Tollini. Segundo o deputado Luis Carlos Heinze (PP-RS), da Comissão de Agricultura da Câmara, a idéia de liberar logo também o algodão transgênico é bem aceita no Congresso. "Faremos o possível para incluir esse setor na legislação a ser votada, seja ela medida provisória ou projeto de lei". Ele ressalta que há apenas um problema de burocracia a mais em relação à soja. É a falta de um parecer favorável da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNbio). "Isso pode ser resolvido com rapidez", diz Tollini.
Animados com o desempenho de 2003/2004, os agricultores pensam em repetir este ano a colheita de 1.255 toneladas de algodão em pluma. Trata-se de um avanço formidável, se for considerado que em 96/97 a produção nacional foi quase dizimada, ao despencar para 306 mil toneladas, em função de pragas e da política do governo central, o qual liberou as importações, afirma a Abrapa. Da época até agora, o perfil do setor mudou de forma radical, com profissionalização do plantio e entrada de grandes produtores. Sem falar que agora, o Centro-Oeste abriga a maior área produtiva, antes dominada pelo Sul, Sudeste e Nordeste.

GM, 27-29/08/2004, p. A7

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