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General Felix diz que ate hoje nenhum governo deu atencao a Amazonia

OESP, Nacional, p.A16
03 de Mar de 2005

General Félix diz que até hoje nenhum governo deu atenção à Amazônia
Ministro afirma que presença da União tem sido "espasmódica"; Exército decide aumentar efetivo para combater crime no Pará
Leonel Rocha
Enviado especial
O ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, general Jorge Armando Félix, admitiu ontem que a região amazônica não tem recebido a devida atenção nos últimos anos. "Os governos, todos os governos, ao longo do tempo têm ficado ausentes da área", disse o general, ao desembarcar em Altamira para instalar na cidade o escritório do Gabinete de Gestão Integrada (GGI). A presença do Exército no Pará também foi ampliada.
O GGI foi criado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para tentar resolver crises regionais como a que provocou o assassinato da irmã Dorothy Stang, no dia 12, em Anapu, em disputas de terras.
"A presença dos governos tem sido espasmódica", disse o general, que passou o dia visitando Anapu, Medicilândia e Altamira. Félix, que voltou a Brasília no fim da tarde, avisou que o governo federal enviará seus ministros mais vezes para visitar e até despachar na Amazônia, principalmente onde os conflitos agrários são mais intensos, como na Terra do Meio, no Pará. "Os ministros vão circular mais por esta área para caracterizar a presença e o apoio do governo para a resolução dos problemas. É firme a intenção do governo de se instalar aqui."
Félix estava acompanhado dos representantes das três Forças Armadas, Ministérios da Justiça, Trabalho, Integração Nacional, Meio Ambiente, Desenvolvimento Agrário, Planejamento e Comunicação, além das Polícias Federal e Rodoviária Federal, Ibama, Incra e Abin, que compõem o Grupo de Gestão Integrada.
O GGI terá três instâncias. A federal será comandada pelo general e composta pelos ministros, seus secretários gerais e assessores de Brasília. A segunda instância será composta por funcionários dos órgãos federais em cada Estado e a terceira, chamada de operacional, será instalada em microrregiões para prestar assistência direta à população. O GGI também contará com representantes do governo estadual.
Félix disse ainda que, no Pará, a idéia é dar continuidade ao planejado pelo Incra. "Vamos cumprir uma série de mandados de imissão de posse sem açodamento, sem gerar tensões nem fazer política de terra arrasada." Ontem mais uma imissão de posse foi cumprida e a gleba 108 foi desapropriada para que nela seja instalado um Projeto de Desenvolvimento Sustentável, defendido por Dorothy. O Incra já executou a imissão nas glebas 129 e 55.
Para dar mais segurança aos membros do GGI, o Exército decidiu aumentar o seu efetivo no Pará. Chega hoje a Altamira mais uma Companhia de Infantaria de Selva, com 140 homens. Já estão na área cerca de 2 mil homens e 6 helicópteros do 4.o Batalhão de Aviação da Força. "Não há prazo para o Exército reduzir o seu efetivo na região", disse Félix.

Acusado de mandar matar freira avisa à PF que quer se entregar
Leonel Rocha
O fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, indiciado como mandante do assassinato da missionária Dorothy Stang, morta por dois pistoleiros, dia 12, em Anapu, no Pará, mandou ontem um recado à Polícia Federal: está disposto a se entregar em uma das superintendências da PF se o processo em que é acusado for transferido para a Justiça Federal.
A mensagem foi repassada ao superintendente da PF no Estado, José Ferreira Sales, por um jornalista de Belém que manteve contato com um intermediário do fazendeiro. Bida continua foragido.
Segundo o recado, Bida se sentirá mais seguro se for julgado na instância federal, onde teoricamente haveria menor ingerência política e o fazendeiro teria maiores chances de se livrar da acusação ou receber uma pena menor do que a pedida no indiciamento. Nos relatórios das polícias Federal e Civil, Bida foi indiciado por co-participação em homicídio doloso qualificado. A pena prevista varia de 12 a 28 anos de cadeia.
"Recebemos a mensagem de um jornalista e estamos negociando com os advogados para checar estas informações e em que condições ele quer se entregar", disse o superintendente da PF, que omitiu o nome do jornalista. Sales esteve ontem em Altamira, Anapu, Pacajás e Parauapebas acompanhando o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Instituicional (GSI) da presidência da República, general Jorge Armando Félix.
O superintendente da PF disse ainda que Vitalmiro estaria contratando um advogado de Belém para negociar a sua rendição. "O advogado contratado em Altamira é apenas um preposto deste novo escritório da capital", comentou Sales. O advogado Antônio Septímio - que se apresentou como defensor de Bida - disse desconhecer o recado e duvidar de que a informação seja verdadeira.
Antônio Septímio admitiu, no entanto, que a transferência do caso para a instância federal é uma boa alternativa para Vitalmiro.
O delegado que presidiu o inquérito na esfera federal, Ualame Machado, disse que a proposta é inviável, já que a tendência é que o processo fique mesmo na esfera estadual da Justiça. "Esta proposta significa que ele não vai se entregar", comentou o delegado. "Vamos prendê-lo antes", prometeu Machado.

Os assassinos de irmã Dorothy
New York Times
No mês passado, no Estado do Pará, no Brasil, pistoleiros pararam uma americana na estrada e a mataram. De acordo com seus companheiros, a freira, Dorothy Stang, leu a Bíblia para seus matadores antes de ser assassinada.
Irmã Dorothy, nascida em Ohio mas naturalizada brasileira, tinha sido uma defensora dos trabalhadores rurais desde os anos 70, ajudando camponeses a sustentar-se com pequenas glebas e extraindo produtos da floresta, sem danificá-la. Ela esforçou-se também por protegê-los das gangues de criminosos interessados naquelas terras.
O assassinato público de uma freira americana não é apenas um crime horrível - é um aviso. Os grileiros estão dizendo ao governo que quem manda no Pará são eles. O governo brasileiro reagiu com vigor, mas resta saber se ele é suficientemente forte para mostrar aos grileiros que eles estão errados.
A violência não é nova no Pará, mas aumentou porque um trecho de uma rodovia está para ser asfaltado, para criar um caminho permanente para escoar os produtos para outros mercados. O valor da terra subitamente explodiu, e grileiros estão matando camponeses e queimando suas casas para tomar-lhes as propriedades. Eles cortam árvores para vender a madeira e repassam as áreas abertas para fazendas de gado e soja.
Desde a morte de irmã Dorothy, o governo mandou 2.000 soldados para manter a ordem no Pará, anunciou a proibição de comercialização da madeira numa área de 8,3 milhões de hectares ao longo da nova rodovia e criou mais duas áreas de proteção florestal sob controle federal. O desafio é fazer essas medidas serem obedecidas e mantidas.
As tropas adicionais não deveriam ser apenas uma medida temporária, mas o início de uma implantação da lei. Garantir a proteção das florestas será difícil porque os madeireiros têm agido à vontade, há muito tempo. É também dramaticamente importante definir com clareza os títulos de terras.
Por fim, cabe ao governo punir os matadores de líderes rurais, como irmã Dorothy. A organização religiosa à qual ela pertencia informa que aproximadamente mil ativistas rurais foram mortos de 1985 a 1996; no ano passado, apenas cinco pessoas foram presas por causa dessas mortes. Desde o assassinato de irmã Dorothy, pelo menos outros quatro líderes rurais foram executados. O governo esquerdista do Brasil parece ansioso por fazer da morte de irmã Dorothy um fermento de mudança, mas precisa, para isso, resistir a forças que, até agora, mostraram-se sempre mais fortes que a lei.

OESP, 03/03/2005, p. A16

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