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Funai teme retrocesso na demarcação

Jornal do Brasil-Rio de Janeiro-RJ
Autor: (Cynthia Garda )
28 de Ago de 2002

O antropólogo Artur Nobre Mendes, 45 anos, presidente da Fundação Nacional do Índio (Funai), trabalhou 20 anos na área de assuntos
fundiários do órgão. Até a Constituição de 1988, os índios tinham 31 milhões hectares de terra demarcada. Hoje são 88 milhões, 10% do território nacional. Ele propõe que o próximo governo inclua os índios na discussão do estatuto das sociedades indígenas - que tramita há mais de dez anos no Congresso - e crie um fundo para o desenvolvimento desses povos. E defende a maior autonomia da Funai, inclusive para contratações.
- Qual o espaço para a questão do índio na eleição?
- Acho que não ocupou espaço nenhum. Houve iniciativas dos índios para abrir esse espaço. O candidato do PT foi a Manaus por iniciativa deles. O Conselho Indigenista da Funai está tentando dialogar com as equipes dos candidatos. Até agora, o que se tem é de ouvir falar, nenhuma proposta concreta.
- Índios dominam pouco os meios de pressão?
- Sim. Houve um aumento substancial do orçamento da Funai, principalmente em demarcação, mas ele padece desse mal. Trabalhamos priorizando coisas de maneira dramática.
- Qual a verba total?
- R$ 104 milhões, fora pessoal. Estamos em agosto, e foram liberados R$ 50 milhões.
- Até o fim do ano toda a verba será liberada?
- Espero que sim.
- Esse orçamento inclui a verba para demarcação?
- Tudo. Demarcação, assistência, apoio à produção.
- O acervo da Funai é seguro, não há riscos de fogo, de deteriorar o material?
- Não. A documentação relativa a terras indígenas não está armazenada de forma adequada. O acervo histórico do indigenismo está no Museu do Índio, no Rio, que foi revitalizado. Agora, com verbas do Sivam, vamos fazer o mesmo aqui.
- Pode-se dizer que a demarcação evolui principalmente na região Norte?
- Deu-se prioridade a essa região, que estava mais atrasada. Além da questão fundiária, o
histórico do contato e a atuação missionária influem nas demais regiões. Estamos
demarcando áreas no Norte e, nas demais regiões, rever as áreas minúsculas demarcadas
pelo antigo Serviço de Proteção ao Índio. Só que essa revisão envolve dificuldades legais e
práticas. Demarcar 10 hectares no Sul do país equivale a 10 mil hectares na Amazônia. Não só pelo custo financeiro, mas social.
-Faltam programas para garantir a sobrevivência e proteção dessa terra?
- Esse é o nó da questão. A Funai avançou em demarcação. Em outras áreas, fez várias
tentativas e não conseguiu um modelo - caso do aproveitamento dos recursos naturais e
desenvolvimento econômico. A Funai não conseguiu apontar caminhos que definissem uma
política e gerassem frutos nem vencer esse desafio pós-demarcação, porque ele ultrapassa a
Funai. É uma questão de Estado.
- Essas populações estariam vivendo o drama de um país sem projeto de desenvolvimento
sustentável?
- Talvez. A Amazônia inteira vive esse dilema. Qual a vocação da região? A discussão se
reflete nas terras indígenas, com uma diferença: o índio tem a vocação para preservar. Quando depreda é porque absorveu hábitos que o desviam de seu comportamento tradicional. As terras indígenas são as áreas com maior chance de conciliar desenvolvimento e preservação.
- Qual seu temor diante da mudança de governo?
- Que haja um retrocesso na demarcação. Há pressão política para reduzir as áreas
demarcadas e temo que haja um retrocesso. Com todos os problemas, a população indígena
voltou a crescer por isso.

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