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Funai localiza 3 corpos em terra indígena

FSP, Brasil, p.A6
10 de Abr de 2004

BRASIL PROFUNDO
Funai localiza 3 corpos em terra indígena
Mortos podem ser garimpeiros que teriam sido atacados a tiros por índios em Rondônia na quarta-feira

RUBENS VALENTE, DA REPORTAGEM LOCAL

A Funai (Fundação Nacional do Índio) informou ter localizado ontem três corpos no interior da terra indígena cinta-larga Roosevelt, em Espigão d'Oeste (534 km de Porto Velho, em Rondônia). Como a área é de difícil acesso, os corpos não foram resgatados.Segundo 16 garimpeiros ouvidos anteontem pela Polícia Civil, um grupo de índios atacou a tiros, por volta das 11h da última quarta-feira, um grupo estimado de 60 garimpeiros que extraíam clandestinamente diamantes na terra indígena, numa área à beira do rio Roosevelt.Morreram pelo menos quatro garimpeiros, de acordo com os depoimentos, mas todos disseram que o número pode ser maior. Com base nos relatos, o delegado da Polícia Civil de Espigão d'Oeste Raimundo Souza Filho estimou que o número de mortos possa ser de 12.Hoje pela manhã, segundo a Funai, um helicóptero da Polícia Federal de Ji-Paraná (RO) deve ir à região tentar resgatar os três corpos já localizados ontem e encontrar outros cadáveres.No início da noite de ontem, dois delegados da Polícia Federal, deslocados de Porto Velho e Pimenta Bueno -também em Rondônia- para assumir as investigações, disseram aos cerca de 50 parentes e garimpeiros amigos dos desaparecidos, que passaram o dia reunidos na frente da delegacia da Polícia Civil de Espigão d'Oeste, que não poderiam entrar na área enquanto não houvesse uma autorização da Funai.A ordem não havia sido dada até as 19h de ontem. A demora levou os garimpeiros a suspeitar que os autores do crime possam ter tempo para se livrar dos corpos, enterrando-os na mata ou ateando fogo.A assessoria de comunicação da Funai, em Brasília, informou que o órgão tomou a frente nas buscas porque está amparado em lei e que o acesso à área será permitido à PF hoje pela manhã.Garimpeiros que sobreviveram ao ataque se ofereceram como guias para ajudar a PF a localizar os possíveis corpos.Segundo os garimpeiros, havia pelo menos 250 pessoas extraindo o diamante na área, no dia do ataque, e cerca de 60 no garimpo atacado. Esse grupo, acampado em 30 barracas de lona, fazia a extração do tipo mais rudimentar, com pás e picaretas e sem ajuda de maquinário. O grupo que os atacou seria formado por 30 ou 35 índios.AlertaPor orientação do governador de Rondônia, Ivo Cassol (PSDB), foi criada uma força-tarefa de policiais civis e militares para dar suporte à PF. O grupo requisitou dez camionetes para entrar na área quando autorizado.O governador enviou em 31 de setembro um ofício ao gabinete do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, advertindo para o risco de novos atos de violência na reserva, segundo revelou anteontem o site de notícias "Rondoniagora"."[...] Solicito à Vossa Excelência providências para evitar um novo conflito com derramamento de sangue, como já ocorreu em anos anteriores", dizia o ofício, protocolado no gabinete ministerial em 1o de outubro.O governador pediu, no ofício, que fosse criado um plano para exploração comercial do diamante da terra indígena. Hoje essa atividade é proibida por lei em áreas indígenas -as terras e o subsolo pertencem à União.A assessoria do ministro informou que não tinha condições ontem, devido ao feriado, de confirmar ou não o teor do ofício enviado pelo governador. A assessoria informou que o Ministério da Justiça tomou desde o ano passado, por meio da Polícia Federal e da Funai, medidas para acompanhar a situação em Roosevelt."O ministério está olhando com atenção para o assunto, e a Polícia Federal vai continuar suas ações de inteligência e monitoramento", informou a assessoria.
"Eu vi quatro mortos dentro de um buraco"
DA REPORTAGEM LOCAL O garimpeiro Francisco Alves Pereira, 46, o "Piauí", caminhou por dois dias na mata e chegou ontem exausto e ferido na delegacia da Polícia Civil de Espigão d'Oeste (RO), 48 horas depois de seu grupo ter sido atacado num garimpo na terra indígena Roosevelt, em Espigão d'Oeste."Eu vi quatro mortos dentro de um buraco, um por cima do outro", contou Pereira, que identificou três deles. Seriam "Baiano Divino", cujo nome, segundo a polícia, é Francisco das Chagas Alves Saraiva, morador de Cacoal (RO), "Parasinho" e "Ari"."O "Baiano" foi enforcado com uma corda, tinha um tiro na cabeça e outro no peito", contou Pereira. Os corpos estavam jogados num buraco aberto por uma árvore que desabara. Pereira saiu correndo ao ouvir os primeiros tiros. O garimpeiro passou a caminhada comendo só farinha e bebendo água de riachos. Com ferimentos nos braços e nas pernas, causados pela vegetação, foi atendido no hospital de Espigão e logo liberado.Outro garimpeiro, que se identificou como "Elias", contou ter encontrado rastros de sangue e duas flechas numa estrada onde um grupo de garimpeiros teria sido rendido pelos índios horas antes. "Eles mataram e jogaram [os corpos] ladeira abaixo", acredita o garimpeiro."A maioria dos garimpeiros dizia que, se viessem os índios, não ia correr. Os que não correram, morreram, e os que correram e os índios pegaram, morreram", disse. Pelas suas contas, há pelo menos 20 desaparecidos. "Elias" disse que o trabalho garimpo havia rendido "migalhas", aproximadamente R$ 580 desde outubro passado. (RV)

FSP, 10/04/2004, p. A6

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