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Fumaça para afastar ''urucubaca''

JB, País, p. A4
16 de Ago de 2004

Fumaça para afastar ''urucubaca''
Ministro Márcio Thomaz Bastos participa do Quarup e fuma cigarro para fazer ''descarrego'' de energias negativas

Gisele Teixeira

O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que muito tem ajudado o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a afastar a urucubaca, teve um momento reservado para o ''descarrego'' de energias negativas no último fim de semana.
Sábado à noite, ele aproveitou sua primeira visita ao Quarup, ritual indígena de homenagem aos mortos, para experimentar o petimaop, cigarro feito de folhas e cuja fumaça é usada ritualmente para afastar o mau-olhado, a inveja, a tristeza e a dor.
- A fumaça levará embora os problemas do governo e, mais calmo, o presidente poderá dar mais atenção aos índios - afirmou o velho pajé Sapaim, o mais conhecido da etnia Kamayurá, organizadora da festa.

O apoio à questão indígena é uma das bandeiras mais antigas do Partido dos Trabalhadores. E, segundo Márcio Thomaz Bastos, foi incorporada pela administração petista.
- Nós temos um projeto de governo que é ter demarcadas, homologadas e pacificadas todas as questões indígenas até o fim do governo Lula - garantiu Thomaz Bastos durante a festa realizada no Parque Nacional do Xingu (MT), porção sul da Amazônia brasileira. Ele acrescentou que o Estado brasileiro tem uma dívida multissecular com os povos indígenas e que esse governo, ''que veio para fazer mudanças'', vai resgatar essa dívida.

A participação do ministro em um dos mais conhecidos rituais indígenas renova esta defesa, mas não minimiza a lentidão com que algumas demandas deste segmento vêm sendo tratadas. Por enquanto, a prática está bem longe do discurso. Além de empurrar com a barriga as homologações mais conflituosas, o governo desmantelou ações que estavam dando certo, como as desenvolvidas na área da saúde. Thomaz Bastos evitou comentar estes assuntos.
- Hoje só falo de Quarup - desviou Thomaz Bastos.
A cerimônia é realizada uma vez por ano durante o fim da estação das chuvas, e é marcada por prantos e lamentações. É quando os índios choram, pela última vez, a partida de seus entes queridos.

Este ano, além da tribo Kamayurá, principal homenageada, participaram da festa os índios Aweti, Kalapalo, Kuikuro, Trumai, Yawalapiti e Waurá.

Para os índios que promovem o Quarup, os mortos são representados por troncos que são fincados no pátio da aldeia promotora da festa. Um, ao lado do outro, os paus são pintados e ornamentados com adornos plumários e cintos masculinos.

Ao anoitecer, acendem-se fogueiras diante de cada tronco. Enquanto os moradores da aldeia anfitriã se revezam, chorando os falecidos homenageados, os visitantes, cada etnia por sua vez, entram na aldeia, trazendo achas de pindaíba para remanejar as fogueiras.

Este ano, cinco pessoas foram homenageadas, sendo uma delas um não-índio, o empresário e jornalista Roberto Marinho, morto em 2003. Além de contar com um número bem significativo de visitantes e turistas, o ritual mostrou que os índios estão aprendendo algumas táticas de não-índios, como o marketing.

JB, 16/08/2004, País, p. A4

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