VOLTAR

A fuga dos peruanos

CB, Brasil, p. 12
04 de Abr de 2009

A fuga dos peruanos
Funai afirma ter constatado a existência, no Amazonas, de índios isolados vindos da Reserva Territorial Murunahua. Quatro grupos estariam fugindo da devastação da região original no país vizinho

Edson Luiz
Da equipe do Correio

Sertanistas da Fundação Nacional do Índio (Funai) descobriram casualmente, por imagens do Google Earth, a entrada no Brasil de índios peruanos isolados, próximo ao Rio Envira, no Acre. O grupo ainda não foi identificado, mas a Funai acredita tratar-se de integrantes da etnia Pano, que estariam fugindo da devastação da Reserva Territorial Murunahua, no departamento de Pucallpa. Até agora, foram localizadas duas malocas com aproximadamente 60 pessoas. Uma outra tribo, provavelmente nômade, e também peruana, migrou durante o verão para um local que fica a 50km da cidade de Santa Rosa, às margens do Rio Purus. A estimativa é de que existam na região cerca de 600 índios arredios.
Os sertanistas já tinham informações sobre a entrada de índios arredios peruanos em território brasileiro, mas a certeza surgiu por acaso. "Um amigo me mostrou imagens do Google Earth de uma clareira no meio da floresta, em uma mesma região onde já havíamos ouvido gritos de pessoas por várias vezes quando passamos de barco em uma expedição", afirma o sertanista José Carlos dos Reis Meirelles Júnior, responsável pela Frente de Proteção Etnoambiental Rio Envira, criada há 10 anos pela Funai. Segundo ele, as coordenadas indicadas pelo Google Earth foram localizadas por GPS e em seguida um sobrevoo no local, em abril do ano passado, confirmou a presença dos índios peruanos.
Os levantamentos feitos por Meirelles indicam que existem pelo menos três grupos indígenas isolados na região do Rio Envira, sendo que dois deles estão no local há vários anos. "Notamos que também está havendo um crescimento populacional", conta o sertanista. A outra tribo está no Igarapé Xinane, e veio do Peru há pelo menos dois anos, quando começou a devastação de suas terras por madeireiros que atuam no Parque Nacional Alto Purús. A Funai não sabe exatamente como eles são, mas pelo tipo de maloca e alimentação, acreditam serem índios panos, que deram origem a várias etnias brasileiras que também vivem próximas à fronteira.
Um quarto grupo foi localizado próximo ao município acreano de Santa Rosa, mas seria uma outra etnia, provavelmente Mashco-Piro, que são nômades. Eles migram e passam uma temporada em várias regiões. Atualmente, a tribo ocupa uma área localizada entre os Rios Envira, Iaco e Chandless - os dois últimos afluentes do Rio Purus. O deslocamento ocorre principalmente durante o verão, quando as chuvas diminuem na Amazônia brasileira.
"Por volta de 1910, Felizardo Teixeira, um cearense amansador de índios arredios que vivia no Acre, descreveu como eram os índios da época, e as características são as mesmas dos peruanos e de outras etnias isoladas da região", observa Meirelles.
Cultivo
A exceção fica por conta das moradias. Enquanto que o grupo vindo do Peru habita duas malocas coletivas, com 60 a 70 pessoas, os outros que já estavam no local têm residência individual. Os moradores da área do Rio Purús, por sua vez, têm malocas espalhadas e de arquitetura diferente e cobertas de palhas novas, o que indica que são recém-chegados. Os roçados também são diferenciados, mas o cultivo de milho, banana, mamão e mandioca é comum entre todos. Um dos grupos, entretanto, produz algodão para a confecção de mantas e redes.
No sobrevoo feito por Meirelles no ano passado, ele pôde observar crianças entre índios adultos em antigas malocas, já identificadas, mas não viu nenhuma pessoa no grupo oriundo do Peru. A suspeita é de que todos se esconderam quando ouviram o barulho do avião. "Quando fogem é sinal de que tiveram experiência traumática no passado, principalmente com fatos relacionados a madeireiros", explica Meirelles. Segundo ele, nas outras tribos, os moradores não se intimidaram com a aeronave e atiraram flechas para o alto.

CB, 04/04/2009, Brasil, p. 12

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.