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Frente parlamentar em Defesa da Amazônia Sustentável

Estação Vida-Cuiabá-MT
04 de Jul de 2003

Deputada Federal Perpétua Almeida - O mundo aprendeu a enxergar a Amazônia como um imenso universo verde, como o pulmão do mundo, como a guardiã de um laboratório vivo e natural. Causa espanto a dimensão fluvial, a biodiversidade, a mitologia indígena. Pouca atenção se dedica ao estudo e à defesa dos povos que vivem na floresta, povos que há milênios preservam a mata historicamente agredida. Em síntese, tem-se a Amazônia como uma espécie de grife do ''ecologicamente correto'' desprezando-se o fato de que ali vivem, há milênios, grupos humanos organizados. E isso não pode ser visto como mero detalhe.
Certamente aí está a raiz da desinformação sobre a história e os conceitos preservacionistas do amazônida. Daí provém a base de análise de profetas apocalípticos que enchem a imprensa com perguntas infundadas, como ''Amazônia, adeus?''
Aprendemos com Ajuricaba. Ainda no século XVII, esse índio resistiu à invasão dos portugueses. Quando já não podia mais lutar, atirou-se, acorrentado, às águas do Amazonas. O exemplo do líder indígena nos acompanha ao longo da história. Mas isso não foi o bastante para impedir que a biopirataria nos perseguisse como uma praga secular. Se no século XIX os viajantes estrangeiros levaram indizíveis cabedais de conhecimento, ingleses levaram da Amazônia as sementes de seringa e construíram os seringais da Malásia. Hoje, produtos como o açaí e o cupuaçu são patenteados por nações estrangeiras sob o olhar inerte e passivo do Brasil.
Nunca se desenvolveu neste país um programa de efetiva proteção das riquezas naturais da Amazônia. O governo, ao longo da história, sempre se portou como um canoeiro maluco que rema contra a corrente, enquanto isso, lá nos seringais, nós resistimos, com pequenos e grandes fatos.
Quando criança, em Porto Walter, com meus irmãos, incentivados pelas autoridades locais, apanhávamos sementes na floresta e vendíamos para comprar material escolar. Era a floresta nos ensinando a importância de sua preservação e a necessidade de tê-la como fonte de recursos. Já agora, nos últimos cinco anos, lutamos contra a coleta da chamada ''floresta morta''. Existem por toda a região quantidades de árvores mortas, madeira de lei que pode ser colhida sem prejuízo à floresta.
Enquanto os profetas anunciadores de desgraças gritam em defesa do óbvio, os amazônidas defendem, de fato, a soberania nacional. Neste exato momento, no oeste do Acre, índios Ashaninkas lutam contra madeireiros peruanos. Eles insistem em invadir as áreas ashaninkas em busca de mogno e outras madeiras de lei.
A Amazônia é um organismo vivo e precisa de proteção. Os povos que vivem na floresta, para a floresta, da floresta, praticamente sem qualquer apoio, têm feito isso ao longo dos séculos. E daí precisamos agir, ajudar essa gente. Enfim, precisamos defender esta nossa incalculável riqueza.
Em entrevista à Folha de S.Paulo, o líder indígena Sebastião Manchineri define bem nossa luta. ''Somos guerreiros, não guerrilheiros, e, por natureza, nos defendemos. Esperamos que os nossos mecanismos de defesa, que são as leis, sejam eficazes''. Ele fala com a autoridade de quem preside a Coordenadoria das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica, representante de 400 povos indígenas espalhados pelo Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Guiana Francesa, Peru, Suriname e Venezuela.
Essa gente vive na floresta e ainda nutre a esperança de dispor de mecanismos legais para a defesa de um patrimônio que é da nação brasileira. O Congresso Nacional é o espaço natural dessa batalha. A batalha da construção de mecanismos que fortaleçam a defesa da Amazônia. O próprio Sebastião Manchineri delega a nós, os políticos, a missão de capitanearmos a luta. A certa altura da entrevista alerta que não cabe aos povos da floresta buscar mandatos parlamentares, mas ''a nossa possibilidade de continuar como povos é fortalecer nossos sistemas e organizações e valorizar as nossas ações internas''.
Aí está o caminho para defendermos a Amazônia. É imprescindível a formação de um bloco parlamentar que olhe prioritariamente para os problemas da região. A Frente Parlamentar de Defesa da Amazônia Sustentável começa a se formar. Fomentaremos o debate no Congresso sobre as potencialidades de uma Amazônia sustentável. Faremos ações em conjunto. Somos, os representantes da Região Norte, uma bancada pequena, 65 deputados e 21 senadores eleitos por sete estados. Mas podemos contar com o apoio de parte das bancadas dos estados vizinhos, além de parlamentares simpáticos à causa. Já aqui estaria dado o primeiro passo para a formação de uma imensa união em defesa de um bem que é dos brasileiros e como tal deve contar com a defesa dos congressistas. A causa é nacional, e as ações também devem ter essa chancela. Essas ações, no entanto, devem correr com celeridade e ter conseqüência imediata. Recentemente, fruto de um debate da assembléia Legislativa do Acre, apresentei emenda à Reforma Tributária garantindo, em lei, tratamento diferenciado e favorecido aos produtos e serviços que façam uso sustentável da biodiversidade e dos recursos naturais renováveis. A proposta conseguiu apoio em tempo recorde, com a adesão de mais de 200 parlamentares. Isso sinaliza uma predisposição dos congressistas em defender não só a Amazônia, mas projetos que garantam a sustentabilidade de nossos produtos naturais. Há uma fragilidade intensa pairando sobre a Amazônia brasileira. Problemas graves como biopirataria, narcotráfico, derrubada ilegal de madeira assolam a região. Soma-se a isso o fato de não termos um efetivo suficiente da Polícia Federal e Exército guardando nossas fronteiras. E os brasileiros já não têm mais o direito de permanecer inertes, muito menos de apenas gritar. Estamos sendo agredidos em nossa soberania e contra isso é que se deve rebelar o Congresso Nacional.

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