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Filme sobre os Yawanawá é sucesso no exterior

Página 20-Rio Branco-AC
Autor: Romerito Aquino
28 de Mar de 2004

Documentário de Joaquim Tashkã sobre a cultura dos índios acreanos vai concorrer ao Sundance Festival, dos Estados Unidos

Yawanawá dançam como seus ancestrais dançavam e assim mantêm viva a cultura de seu povo

O Acre pode não saber ainda, mas um povo de sua terra está fazendo muito sucesso pelo mundo afora. O sucesso vem das cores vivas de seus corpos, dos penachos coloridos de suas roupas, dos imensos cocás emplumados de suas cabeças e, principalmente, da grande alegria de seus rostos e de seus sorrisos fáceis que denotam a extrema felicidade que sentem ao dançarem e participarem de rituais, jogos e brincadeiras dos tempos de seus ancestrais.

Tudo isso está em "Yawá", um filme documentário fantástico de mais de uma hora de duração que vem mostrando ao mundo o esplendor da cultura e das tradições dos Yawanawá, índios que habitam na bela selva situada ao longo do rio Gregório, município de Tarauacá, no Vale do Juruá acreano.

Yawá, que quer dizer queixada, o porco que anda em grandes bandos na floresta amazônica, é um filme diferente porque foi feito através do olhar e do talento de um próprio Yawanawá, nascido e criado na selva da terra do "povo da queixada", como se traduz para o português o significado dessa nação indígena tarauacaense. O índio é Joaquim Tashkã Yawanawá, que há alguns anos saiu de sua aldeia e foi para os Estados Unidos aprender a compor e tocar música, enveredando depois para o fascinante mundo do cinema.

Vindo da selva acreana, onde foi mostrar o filme em avant-premiere para o seu povo, Joaquim Tashkã passou por Brasília rumo aos Estados Unidos para começar a apresentar seu trabalho em vários estados norte-americanos. Em Brasília, decidiu mostrá-lo, também, a um grupo de privilegiados amigos que cativa na capital federal.

Com uma hora e 20 minutos de duração, o filme leva seus expectadores a uma viagem inimaginável de cores, movimentos e emoções, provocados pelos encantos das muitas cenas das danças e dos mais variados cantos do povo da selva. Pintados de urucu e de outros frutos da floresta, em belos e variados desenhos originais, crianças, jovens - muitos jovens! - adultos e velhos Yawanawá se revezam em danças e nas brincadeiras realizadas comumente no centro de uma das suas quatro aldeias espalhadas ao longo do rio Gregório.

As filmagens se concentram na semana em que dura, no mês de setembro, o chamado festival anual da cultura do povo Yawanawá. Neste mês do ano, todas as aldeias se juntam para festejar durante sete alegres dias - de noite e de dia, o que Joaquim chama de "Yawá", que vem a ser "a celebração de dança e da expressão artística, cultural e espiritual do povo Yawanawá". No Yawá, que acabou se transformando no titulo do filme, os homens e as mulheres da tribo se revezam em danças separadas e, outras vezes, se juntam para ampliar ainda mais a beleza dos rituais que os Yawanawá fazem naqueles dias de festa para louvar a beleza e a grandeza da mãe natureza. Grandeza que, segundo Joaquim, pode ser vista a toda hora no céu, nos rios, nas matas, nos animais, nas aves, nas árvores, nas flores e em outras extraordinárias belezas existentes no interior da floresta.

Por sua extraordinária qualidade, que o coloca no mesmo nível de documentários feitos por canais internacionais como o Discovery Chanel e o National Geografic, o filme de Joaquim Tashkã estará concorrendo em maio próximo ao prêmio de melhor documentário do Sundance Festival, o segundo maior evento cinematográfico dos Estados Unidos depois do Oscar.

De São Francisco, na Califórnia, onde tem exibido seu filme em casas lotadas, o cineasta informa que já está estudando proposta feita pela National Geografic para veicular o documentário do povo Yawanawá. Ele avisa, ainda, que vai estrelar o filme em seguida nos estados do Novo México e Minesota e também no Havaí. Depois, Joaquim pretende vir ao Brasil lançar Yawá em Rio Branco, em São Paulo e no Rio de Janeiro. Daí, segue para a Europa para atender convites já formulados por estúdios de alguns países do velho continente.

Elaborado com a mais moderna tecnologia digital, o filme de Joaquim já está sendo reproduzido em VHS e DVD. Segundo o cineasta e coordenador da Organização Yawanawá, como Joaquim gosta de ser chamado, Yawá contou com o apoio inicial do ator xará Joaquim Phoenix, do filme O Gladiador, ganhador de vários Oscar em 2002, e da empresa norte-americana Aveda, que há 12 anos mantém parceria comercial com os Yawanawá. A equipe do filme, que foi montado com a assessoria de dois pajés Yawanawá, é composta de Joaquim Tashkã, que fez os trabalhos de produção, direção, roteiro, texto e narração em português; do Joshua Sage, na edição e composição das imagens; e de Laura Soriano, na supervisão, edição, texto e narração em inglês, a segunda língua em que o filme foi narrado.

Pela Internet, Joaquim concedeu, de São Francisco, na Califórnia, entrevista para o Página 20, que publicamos nesta página.

"Um filme fora de série"

Por que Yawá se tornou o título de seu filme?

Yawá é a celebração de dança e expressão artística, cultural e espiritual do povo Yawanawá. O filme foi feito a partir de uma perspectiva totalmente Yawanawá. Diferente de outros documentários, onde o índio é um ser citado e notado como um material de exploração de mundo desconhecido, Yawá mostra o universo Yawanawá de forma inspiradora. Esperamos que, através de nossos cantos e nossas imagens, possamos inspirar outros povos indígenas ao redor do mundo que estão em processo de resgate de sua identidade cultural e ancestral. Esperamos que eles possam incentivar-se e inspirar-se a recobrar e valorizar suas próprias tradições e começar a buscar suas próprias raízes culturais e espirituais.

Como surgiu a idéia do filme?

Tudo surgiu a partir de uma reflexão interna do povo Yawanawá sobre sua própria história no passado e na atualidade. Após uma grande reflexão dos ganhos e perdas, depois de mais de um século de colonização, vimos que todas nossas danças e expressões artísticas, culturais e espirituais não foram apagadas e esquecidas da memória de nosso povo. Elas tinham sido apenas deixadas para trás, dando vaga aos costumes ocidentais trazidas pelos patrões seringalistas e missionários. A maneira que encontramos para mostrar isso para nossa própria gente foi organizar uma semana dedicada à nossa cultura ancestral. E, para mostrá-la ao mundo afora, fizemos Yawá com muita inspiração, baseado na história e na memória de nosso povo Yawanawá.

Qual é a importância do filme para o seu povo?

O evento e o filme causaram um grande impacto na comunidade, mudou a história de nosso povo. Para nós Yawanawá, Yawá foi o nosso renascimento e redescobrimento enquanto povo com uma cultura, uma identidade e uma espiritualidade viva em pleno século XXI. Assim surgiu Yawá, que foi trabalhado a quatro mãos por mim, por Joshua Sage e pela Laura Soriano. O filme também foi editado a quatro mãos, no fundo da minha casa, em Rio Branco. Yawá é totalmente um filme indígena inovador. Usando o mais moderno e compacto em tecnologia digital, com computadores Macintosh Powerbook G3 e G4, YAWA, o filme foi feito de forma orgânica, contando com assessoria dos pajés Yawarani e Tatá, supervisado por Raimundo Tuin Kuru, uma liderança tradicional e grande conhecedor da história do povo Yawanawá. Depois de editado, o filme foi mostrado na aldeia e, depois que ouvimos sugestões e comentários, ele foi reeditado, chegando assim a um produto final fora de série.

Quem ajudou a fazer Yawá?

Yawá contou com apóio inicial do ator Joaquim Phoenix, um dos principais atores do filme O Gladiador, que financiou os equipamentos para filmagem e para edição. Contamos ainda com apóio e patrocínio da empresa norte-americana Aveda Corporation, que já mantém parceria com os Yawanawá há 12 anos.

Como tem sido a recepção do público que assiste Yawá?

Qualquer pessoa que assiste Yawá sai bem impressionada e com uma nova perspectiva de um povo indígena. Lembro-me, claramente, o que ocorreu no primeiro dia em que foi lançado aqui nos Estados Unidos, em 26 de janeiro deste ano. Logo após a apresentação, chegou uma mulher chorando e me disse: 'Já vi vários documentários em toda minha vida, feitos por antropólogos sobre a questão indígena, a qual tenho muito respeito e aprecio. No entanto, nunca vi uma coisa tão original e pura. Nunca vi tanto espírito de união e comunidade. Nunca vi tanta alegria, nunca vi tantas coisas bonitas juntas numa mesma comunidade. Nunca vi uma coisa igual a isto. Obrigado a você e a seu povo por continuarem Yawanawá para sempre.

Tem sido boa a freqüência de expectadores?

Estou nos Estados Unidos fazendo valer Yawá e as apresentações aqui são lotadas e depois das apresentações, os comentários sinceros e abertos vem de diferentes perspectivas. Estou exibindo agora o filme aqui em São Francisco (como dizem os Chicanos, mistura de mexicanos e americanos), em Califa - nickname para Califórnia. Daqui, vou ao Novo México, Minesota e Hawaí e depois voltamos ao Brasil para lançar Yawá em Rio Branco, São Paulo e Rio de Janeiro. Nessas locais, aproveito também a oportunidade para negociar os projetos sociais e ambientais do nosso povo Yawanawá.

Como está sendo veiculado o filme?

Yawá está sendo reproduzido em duas versões, em fita VHS e também em DVD. A versão DVD está mais interessante porque tem a opção extra com fotos e cantos Yawanawá. Está sendo apontado para o Sundance Festival e também tem proposta para exibição no Geografic Chanel, entre outros. Isso tudo me dá vontade de gritar bem alto: VIVA O POVO DO ACRE E O POVO YAWANAWÁ.

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