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Fazendeiros fecham entrada com cadeado

Folha de Boa Vista-RR
Autor: MARILENA FREITAS
28 de Nov de 2001

A notícia de que mais uma área está sendo avaliada para ser demarcada, a maloca Anaro, na região do Amajari, fez com os fazendeiros daquela região colocassem cadeado na porteira que dá acesso à comunidade, onde moram 63 índios. A situação desconfortável está deixando os indígenas irritados.
A comunidade recorreu à Justiça para tentar garantir o direito de ir e vir, mas a Justiça Federal negou a liminar. O único caminho de acesso às malocas é por dentro das fazendas. Agora eles são obrigados a buscar uma rota alternativa, o que é mais complicado porque não existe estrada.
O local foi fechado no dia 10 deste mês e só é aberto para passar pessoas estranhas depois de um prévio interrogatório feito pelo fazendeiro Luís Teixeira, que mora no início da estrada. "Se for da Funai, não entra aqui", afirmou enfático.
Teixeira resolveu abrir a porteira e permitir o acesso da imprensa e da equipe de saúde do CIR (Conselho Indígena de Roraima) depois de uma hora de conversa, após certificar-se que as pessoas não estavam a serviço da Funai, mas que iriam levar medicamentos para a comunidade.
Ele alegou que a decisão dos fazendeiros é por conta da nova demarcação que abrange aproximadamente 18 mil hectares, indo do rio Parimé até o sítio arqueológico da Pedra Pintada. "Sou roraimense e moro aqui há 40 anos", disse, ao salientar que é dono de duas das 15 fazendas.
"Não quero nem ver o pessoal da Funai aqui porque eles só querem fazer o mal para a gente. Estamos revoltados porque eles (equipe da Funai) fizeram tudo escondido. Trabalhei muitos anos aqui e estou velho para agora perder tudo", desabafou Teixeira.
INDÍGENAS - Os índios da região afirmam que a atitude tomada pelos 15 fazendeiros está causando transtornos para a comunidade. Impedidos de passar, eles são obrigados a transitar por outro caminho que dá acesso ao Surumu, tendo que percorrer mais quilômetros e enfrentar a estrada, que está cheia de buracos.
"Sábado passado precisamos fazer uma remoção para levar a paciente para Boa Vista e tivemos que usar a outra estrada. Nem tentamos passar por lá porque a ordem é não deixar a gente passar, principalmente de carro", disse o agente de saúde indígena Sílvio Guilherme.
A paciente Ivanete dos Santos Padilha foi picada por um inseto que caiu dentro da rede dela às 3 horas da madrugada. "Por não ter médicos no Surumu, a levamos para o hospital de BV-8 (Pacaraima). Levamos cerca de uma hora e meia para chegar lá. Se ela tivesse piorado, teria morrido", complementou.
A indígena Djanira Maria Cruz, 67 anos, disse que nasceu e se criou naquela região e que não aceita ser fechada a estrada de acesso. "Não sou idiota nem palhaça para ter que me abaixar para passar pela cerca. Para buscar meus trocados (aposentadoria), esse mês fui obrigada a ir pelo Surumu", contou ao salientar que teme pela vida dos filhos.
"Tenho medo que eles peguem meus filhos à traição", disse. Segundo ela, a comunidade do Anaro era bem maior, mas os índios foram fugindo porque os primeiros fazendeiros daquela região levavam os indígenas para trabalhar em serviços pesados e semi-escravos.
"Até panela barro e outros objetos levavam para eles", relembrou ao dizer que considera discriminatória a forma de tratamento dada pelos fazendeiros. "Índio não tem nome para eles. Só chamam a gente de caboclo", acrescentou. Atualmente, a comunidade cria 63 cabeças de gado e 180 cavalos, mas tem pouco pasto disponível para alimentar os animais.
A enfermeira do convênio de saúde entre o CIR (Conselho Indígena de Roraima) e a Funasa (Fundação Nacional de Saúde), Zoraia Alves, responsável pela região do Amajari, disse que a cada três meses é necessário entregar remédio na comunidade.
Para Zoraia, a situação pode se tornar complicada na hora que for necessário fazer uma remoção, como ocorreu no sábado. Além disso, o fechamento da porteira acaba por comprometer o trabalho de saúde porque a equipe perde tempo, tendo que passar entre os arames e andar cerca de 500 metros para ir pedir permissão ao fazendeiro para passar.
O assessor do CIR, André Vasconcelos, informou que entidade já ingressou com recurso para garantir o direito de ir e vir. "A idéia dos índios é não se confrontar com os fazendeiros, mas esperar a decisão da Justiça", disse.

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