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Falta de verbas deixa índios sem curso superior

Jornal do Brasil-Rio de Janeiro-RJ
Autor: Fernanda Nidecker
23 de Dez de 2003

Programas não têm como se expandir

Depois de prestar vestibular quatro anos seguidos, a índia Linda Marubo, de 38 anos, comemorou quando viu, em julho passado, seu nome na lista dos aprovados para o curso de medicina de uma faculdade particular de Manaus, no Amazonas. A alegria durou pouco. Sem dinheiro para pagar os estudos, Linda teve seu sonho adiado mais uma vez após tentar em vão o apoio da Fundação Nacional do Índio, a Funai.

- Estou desistindo de ser médica, porque não posso pagar uma faculdade particular e não consigo passar para uma universidade pública - lamenta Linda, que sustenta seus dois filhos com os R$ 200 que ganha como artesã.

Dos 360 mil indígenas que vivem hoje no Brasil, cerca de 1.300, segundo dados da Funai, estão cursando o ensino superior, sendo que, destes, 60% a 70% estão em instituições particulares. Com esta fatia, a instituição gasta, em média, R$ 1,6 milhão anuais em mensalidades, hospedagem, alimentação e material escolar. A quantia inclui ainda despesas com cerca de 20 mil indígenas que deixaram suas aldeias para cursar o ensino médio nas cidades

Segundo a coordenadora do Departamento de Educação da Funai, Maria Helena Fialho, não está previsto aumento da verba destinada à área em 2004.

- Há 200 indígenas recém-aprovados no vestibular esperando o apoio da Funai e não sabemos se terão ajuda - explica Maria Helena, esclarecendo que os alunos que já contam com o benefício não serão prejudicados.

A coordenadora afirma ainda que a instituição está preocupada com a qualidade do ensino de algumas universidades particulares freqüentadas pelos indígenas.

- A base que temos do ensino médio não é suficiente para entrar numa universidade pública - afirma Anaiá Matos de Souza, de 31 anos, estudante de direito e presidente da Associação dos Universitários Indígenas de Brasília.

Anaiá é um dos 15 universitários apoiados pela Funai no Distrito Federal, cinco dos quais estão com as matrículas trancadas por não conseguirem aliar os estudos ao trabalho. Segundo a instituição, 30% dos indígenas abandonam os estudos por falta de recursos.

Líder do Movimento Estudantil Indígena do Amazonas (Meiam), Linda Marubo afirma que o objetivo do indígena com diploma universitário é voltar para a comunidade.

- Estou cansada de ver gente morrendo na minha aldeia com câncer de colo de útero. O certo seria que nós pudéssemos ser médicos, advogados e dentistas para cuidar da nossa gente - defende a líder do Meiam.

Representantes do movimento já se reuniram com enviados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e autoridades de universidades públicas do Amazonas para propor um sistema de cotas que garantisse aos indígenas um número de vagas nos cursos mais concorridos, como medicina e direito. A proposta previa, ainda, que os indígenas concorressem entre si no processo de seleção.

- Todos os pedidos foram negados - queixa-se Linda.

Para tentar amenizar o quadro de exclusão que castiga os indígenas aspirantes ao diploma, dois deputados apresentaram, este mês, dois projetos de lei na Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara.

A proposta do deputado federal Murilo Zauith (PFL-MS) defende o acesso irrestrito dos indígenas a qualquer universidade pública, desde que não sejam desclassificados no vestibular. A medida não prejudicaria o número de vagas já previsto para os demais candidatos.

Mais ambicioso, o deputado federal Carlos Abicalil (PT-MT) propõe a criação da Universidade Federal Autônoma dos Povos Indígenas, vinculada ao Ministério da Educação, com sede em Cuiabá (MT), e funcionando em rede com as demais universidades do país. O curso prevê a inclusão, nas grades curriculares, de disciplinas que abordam a legislação, cultura, arte e história das diversas etnias do país.

- A criação de uma universidade pública indígena é uma iniciativa que faz justiça à relevância desses povos na história da construção do Brasil, além de reconhecer a importância e a valorização dos estudos do tema - afirma o deputado.

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