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Falta de gás argentino e boliviano paralisa usinas

OESP, Economia, p. B3
03 de Jul de 2010

Falta de gás argentino e boliviano paralisa usinas
Duas térmicas com 1.100 MW de capacidade estão paradas após rompimento de contratos, levando o País a contratar usinas mais caras e poluentes

Renée Pereira

Os problemas na integração energética entre Brasil e América do Sul não se resumem aos tratados governamentais. Contratos bilaterais firmados entre empresas privadas também têm sido desrespeitados.
Hoje, por exemplo, duas usinas termoelétricas (AES Uruguaiana e Termocuiabá), com capacidade de 1.100 megawatts (MW) de energia, estão paradas por causa do rompimento de contratos de fornecimento de gás natural da Bolívia e Argentina. Enquanto isso, o Brasil contratou nos últimos anos dezenas de térmicas a óleo diesel e óleo combustível, mais caras e extremamente poluentes, para garantir o abastecimento do País.
No caso da AES Uruguaiana, instalada no Sul do País, o caso foi parar na Câmara Internacional de Comércio. Os problemas começaram em 2005, com a interrupção de gás da Argentina que provocou prejuízos milionários para a empresa, afirma o diretor da AES Tietê, Ricardo Cyrino. A outra usina foi a Termocuiabá, que teve o fornecimento de gás interrompido pela Bolívia. Para cumprir contratos, a usina chegou a operar com óleo diesel. Mas hoje está parada.
Segundo especialistas, a deficiência da infraestrutura dos países vizinhos põe em risco o mercado brasileiro. Foi o que ocorreu recentemente com o racionamento da Venezuela. Na década de 90, o Brasil optou por abastecer a capital de Roraima com a energia da Venezuela e construiu uma linha de 211 km. O acordo era de 200 MW por 20 anos.
Mas o país vizinho só conseguia mandar 100 MW, até cortar 60% do total por causa de uma crise local. Para evitar apagões, o Brasil reativou uma térmica a óleo. Como o problema foi causado pela falta de chuva, a Venezuela não vai arcar com o prejuízo.
No governo, ninguém admite que os acordos têm sido descumpridos. "Todos os acordos foram cumpridos. Nunca houve interrupção do fornecimento de gás ou energia", diz o diretor do Departamento de Energia do Itamaraty, André Corrêa Lago, Ele reconhece que algumas revisões feitas nos acordos, de Itaipu ou da Bolívia, têm o objetivo de contribuir para o desenvolvimento dos vizinhos. "Para o Brasil, não interessa crescer sozinho."
O secretário de Minas e Energia, Altino Ventura, tem opinião semelhante: "Estamos assumindo o custo para a sociedade, mas é difícil dizer se houve prejuízo. Afinal, usamos mais de 90% da energia de Itaipu."

Cronologia
2004
Argentina
Constatação de insuficiência de gás natural da Argentina
2005
Paraguai
Aumento da remuneração pela cessão de Itaipu para o Paraguai
2006
Bolívia
Nacionalização dos ativos da Petrobrás, na Bolívia
2010
Venezuela
Racionamento de energia na Venezuela

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100703/not_imp575753,0.php

Governo aposta na integração da América Latina

Renée Pereira

Os incidentes ocorridos nos últimos anos não alteraram os planos do governo brasileiro de ampliar a integração regional. Hoje o Itamaraty e a Eletrobrás comandam uma série de estudos de hidrelétricas e linhas de transmissão em parceria com Argentina, Uruguai, Peru e Guiana. "Todos vão na direção da integração energética", afirma o superintendente de Operações no Exterior da estatal, Sinval Gama.
Segundo ele, a América Latina é a única região do mundo autossuficiente do ponto de vista energético e sua interligação poderá trazer ganhos para todos os países. Especialistas temem, no entanto, que a ampliação dessa integração traga ainda mais prejuízos para o Brasil.
"Antes de o País se lançar em outras aventuras, o governo precisa explicar por que perdeu em todas até agora", diz o presidente do Instituto Acende Brasil, Claudio Sales. "É preciso avaliar a que custo esses novos projetos serão feitos."
O consultor Abel Holtz, especialista em energia, teme que o ressurgimento do nacionalismo - em relação aos recursos naturais - em alguns países da América Latina torne qualquer negociação muito arriscada. Além disso, destaca ele, é preciso conhecer algumas peculiaridades dos países vizinhos.
Holtz cita como exemplo o recente acordo assinado com o Peru para a construção de seis hidrelétricas. "Quase toda energia do país é produzida por térmicas. Mas há uma previsão de que o gás acabe por volta de 2025. Portanto, há o risco de fazermos uma usina e ficar tudo com eles."
Importação. Mas, pela afirmação do diretor do Departamento de Energia do Itamaraty, André Corrêa Lago, o acordo deve seguir exatamente essa tendência. "Nosso objetivo é usar hoje uma energia que no futuro vai abastecer o mercado peruano. A ideia é ajudá-los a aproveitar o grande potencial hidrelétrico, importar os excedentes e depois deixar para eles."
Segundo o diretor, outro projeto no radar é o Complexo Hidrelétrico de Garabi, entre o Brasil e Argentina. Serão construídas duas barragens, com capacidade de 1.300 megawatts (MW). O empreendimento está em fase de estudos de inventário do Rio Uruguai e de viabilidade. Mas o ministro acredita que seja possível iniciar obras complementares, como estradas e infraestrutura dos locais, até o fim do ano.
Os primeiros acordos entre Brasil e Argentina surgiram com a construção de um gasoduto de 25 km entre os dois países, que não transporta um único metro cúbico de gás natural. Isso porque a Argentina interrompeu a exportação do gás por causa de escassez no seu mercado. "Na América Latina, qualquer acordo de integração regional é de alto risco", diz o diretor do Centro Brasileiro de Infra-Estrutura (CBIE), Adriano Pires.

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100703/not_imp575754,0.php

OESP, 03/07/2010, Economia, p. B3

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