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Expedição Imagem do Javari: Possuelo lamenta interrupção do atendimento médico aos índios da região

Amazônia-.org.br-São Paulo-SP
Autor: Daniela Kawakami
06 de Mai de 2004

O chefe da Coordenação de Índios Isolados da Fundação Nacional do Índio (Funai), Sydney Possuelo, lamentou ontem, em entrevista por telefone, a interrupção da Expedição Imagem do Javari. A expedição, que pretendia levar atendimento médico e diagnóstico aos índios do Vale do Javari foi interrompida no último final de semana por determinação da Justiça Federal.

O Vale do Javari se localiza no sudoeste do Amazonas, na fronteira com o Peru. Desde julho de 2001, a Funai vem relatando à Funasa o surto de uma doença infecto-contagiosa ainda não identificada entre os índios da região. A expedição, organizada por Possuelo e pelo médico radiologista Sérgio Brincas, pretendia examinar cerca de mil índios não isolados das tribos Matis, Marubo, Kanamari e Korubo.

Funasa - A juíza federal Fabíola Bernardi argumenta que a Funasa já desenvolve um programa de diagnóstico na região, e que, portanto, não há necessidade de que a expedição - sem a coordenação do órgão oficial de saúde - realize o mesmo trabalho.

Mas Possuelo e Brincas afirmam, justamente, ignorar qualquer atendimento da Funasa durante todo o período da expedição. "Não vi nenhum atendimento médico, não vi profissionais de saúde. Não existe assisténcia médica no local", disse Brincas. Segundo Possuelo: "Desde o dia que nós subimos [o rio], até o dia que nos descemos, não tem ninguém da Funasa. Não tem um médico, não tem um atendente. Eles vão dizer 'o médico fica em Atalaia [do Norte]'. Bom, Atalaia não é onde ficam as comunidades indígenas. Não adianta dizer isso".

O Conselho Indígena do Vale do Javari (Civaja) afirma em carta de janeiro deste ano que: "relatório da FUNAI do ano de 1982 revela a existência de hepatite na área indígena desde aquela época, no entanto, até hoje as autoridades competentes não tomaram as providências necessárias. O que está sendo esperado? Que morram mais índios? Quer-se a extinção dos povos indígenas do Vale do Javari?".

Procurada pela redação do site Amazonia.org.br, a Funasa preferiu manifestar-se através de nota técnica: "no que diz respeito à situação epidemiológica do Vale do Javari, a Fundação Nacional de Saúde esclarece que realiza investigações epidemiológicas sobre a incidência de vários tipos de hepatite e outras doenças virais na região desde 1993". A nota afirma ainda que "o problema das hepatites virais no Vale do Javari está sendo abordado de modo interinstitucional, (...) estando em fase de estruturação a rede de laboratório com definição de fluxos e fornecimento de kits diagnósticos". Segundo Possuelo, a Funasa realizou há cerca de dez meses a coleta de 260 amostras de sangue dos índios da região. Entretanto, nenhum diagnóstico foi ainda obtido pois a entidade aguarda até hoje os kits diagnósticos mencionados. Em contraposição, a expedição realizou, em ritmo intenso de trabalho, cerca de 400 diagnósticos em cinco dias.

Índios isolados - Uma das maiores preocupações de Possuelo é que a epidemia da doença ainda desconhecida atinja os índios isolados do Vale do Javari - talvez uma das regiões com a maior concentração de tribos isoladas do planeta. "Se tal viesse a acontecer, estaria configurada uma tragédia sobre a qual sequer teríamos qualquer conhecimento", afirma o sertanista.

Repercussão - A Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), entede que "qualquer atividade que contribua a garantir a continuidade histórica dos nossos povos, a melhoria das suas condições de vida, será sempre bem-vinda, desde que seja implementada como o conhecimento prévio e consentimento dos índios". A entidade acrescenta ainda que "a demora, a falta de clareza e indecisão do governo federal em mostrar qual é de fato a política que, depois de 15 meses de mandato, deve assumir para atender os problemas e as demandas históricas dos povos indígenas em todas as dimensões de sua vida (terra, saúde, educação, cultura e sustentabilidade), reflete-se em todos os âmbitos do poder público, a nível teórico, político e operacional".

Já o diretor-presidente da Fundação Estadual dos Povos Indígenas do Amazonas (FEPI), Bonifácio José concorda com a decisão da juíza e afirma que a assistência deva partir da Funasa. "Acho muito bem-vindo o apoio, o recurso. Mas no meu entendimento, tem que operar via Funasa com a equipe responsável do distrito [sanitário especial indígena] para fazer este trabalho", afirma Bonifácio.

Jurisprudência - Para Possuelo "se cumpriu a lei, mas não se fez Justiça. A juíza mandou encerrar [a expedição], nós imediatamente acatamos. Mas isso é um perigo terrível, pois cria uma jurisprudência. Só a Funasa pode entrar lá [na reserva indígena] e 'fazer a saúde' - e se ela não faz, os índios morrem lá dentro! O que é isso? Nem o órgão de representatividade dos povos indígenas, que é o próprio Civaja, nem a Funai, podem ir lá".

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