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Etnias engrossam ocupacao da Funai

A Critica, p.A1;C1
06 de Jan de 2005

Capa:Etnias engrossam ocupação da Funai
O movimento, que começou com guerreiros e guerreiras da etnia Mura, conta agora com a participação de outras etnias. Tuchauas asseguram que ocupação só se encerra quando o administrador-executivo regional do órgão, Benedito Rangel, for exonerado do cargo

Os líderes indígenas querem que a função de administrador-executivo da Fundação Nacional do Índio (Funai) em Manaus seja exercida por um índio. "Queremos que seja um parente da gente. Branco não sabe a situação do índio e a Funai é lugar de índio", disse Roseno Apurinã
Indígenas pedem a saída do administrador
Direção nacional da Funai não pretende ceder às pressões do movimento, que pode sofrer intervenção da PF
O que teve início na segunda-feira como uma manifestação de índios da etnia mura pela demarcação de terras no município de Autazes, acabou se transformando num movimento de lideranças indígenas de várias etnias pela saída do administrador-executivo da Fundação Nacional do Índio (Funai) no Amazonas, Benedito Rangel de Morais. As lideranças indígenas ocupam, desde a manhã de segunda-feira a sede da Funai e prometem só sair de lá quando for assinada a exoneração de Rangel do cargo.
Reunidos na tarde de ontem no auditório do órgão, os índios fizeram denúncias contra Benedito Rangel. Segundo eles, a atual administração regional da Funai não os respeita e não representa seus interesses. A mobilização foi liderada pelo tuxaua Antônio Mura que, junto com 32 lideranças, ocupa a sede da Funai. Desde então, o movimento vem ganhando adesões e ontem já eram aproximadamente 100 índios, entre adultos e crianças, na sede do órgão.
Índios das etnias mura, ticuna, piratapuia kambeba, dessana, baniwa, marubo e sateré-mawe acusam Benedito Rangel de realizar "farras e bebedeiras" em Autazes com recursos da Funai. Eles alegam que o carro oficial da Funai trafega em locais que não representam os interesses do órgão, como motéis e supermercados e que falta transparência nos gastos feitos a partir de recursos destinados ao apoio das comunidades.
Coordenador Geral da Coordenação das organizações Indígenas da Amazônia (Coiab), Jecinaldo Barbosa Cabral, declarou que a entidade dá total apoio à manifestação dos indígenas, mas fez questão de esclarecer que o movimento não foi deflagrado pela Coiab e sim por lideranças indígenas da Funai liderando a ocupação do órgão.
Se nos tivéssemos recursos financeiros, teria muito mais gente aqui. Estamos no limite Já procuramos todos os canais de diálogo. Mas a Funai está passando por um retrocesso.
Houve, pop exemplo, uma paralisação no processo de demarcação de terras indígenas, diz Jecinaldo.
Benedito Rangel de Morais, afirma que falta legitimidade ao movimento que, segundo ele, teria surgido dentro da Funai, encabeçado por funcionários indígenas do órgão. A informação é desmentida pelas lideranças que ocupam a sede. "0 meu cargo é do presidente da Funai. Já coloquei à disposição. Mas esse movimento não tem respaldo. Eles querem colocar um índio como administrador da Funai e isso não vai ser bom para o órgão", disse. Quanto às acusações feitas contra ele, Rangel afirma que são levianas e servem apenas para tentar denegrir sua imagem. "Se eles têm alguma denúncia seria, que apresentem ao Ministério Público", desafiou.

Movimento ganha apoio de entidades
0 movimento pela exoneração do administrador-executivo da Fundação Nacional do Índio no Amazonas (Funai), Benedito Rangel de Morais, recebeu varias adesões durante n dia de ontem.
Índios urbanos, que moram em Manaus, ficaram sabendo do movimento pelo jornal E..foram à sede do órgão manifestar seu apoio. Lideranças de várias partes do Estado enviaram faxes de apoio ao movimento. Esse foi o caso, por exemplo, do Conselho Indígena do Vale do Javari e da União dos Povos Indígenas Mundurukú e Sateré, entre outros.
"Não é apenas a questão da demarcação das terras. Há muitas outras, como a aposentadoria. A Funai põe obstáculos, não se empenha. São direitos conquistados pela gente. Está na hora do senhor Rangel dar oportunidade para alguém que trabalhe pela nossa luta", disse Sinésio Mura.
Isael Munduruku estuda em Manaus. Ficou sabendo da ocupação pelo jornal e decidiu aderi-la.

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Antônio Mura Tuxaua
"Quem começou a guerra fui eu. Reivindiquei o direito da minha aldeia e solicitei às outras aldeias que me ajudassem. Meus parentes podem até ter sangue de barata, mas esse mura aqui tem sangue de guerreiro. Sou guerreiro até morrer. Não vou esfriar, nem vou correr. Estou reivindicando meus direitos. São mais de dez anos perseguidos pelos brancos dentro das nossas aldeias. Chega de agüentar abuso deles. Fretei um ônibus para chegar até Manaus com 32 indígenas do meu lado. Vamos ser vencedores da partida. Quem for podre que se quebre. Não vamos matar, não vamos flechar, não vamos ferir ninguém. Mas vamos lutar pelos nossos direitos".

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Cidade não tira identidade
A questão do índio urbano foi uma das mais discutidas pelas lideranças na tarde de ontem. Segundo eles, o índio que vem para a cidade é menosprezado pela Funai, como se tivesse deixado de ser índio e, portanto, perdesse seus direitos. "Mesmo morando na cidade, continuo sendo índio. Não mudei meu sangue", disse Assis Apuinã.
A Crítica, 06/01/2005, p. A1, C1

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