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Estudo flagra crime ambiental indígena

FSP, Ciência, p. A13
Autor: ANGELO, Claudio
07 de Set de 2004

Estudo flagra crime ambiental indígena
Resíduo agrícola e esgoto lançados por nativos canadenses na pré-história asfixiaram lago no centro-sul do país

Cláudio Ângelo
Editor de Ciência

Os índios iroqueses do Canadá ficaram famosos por terem enfrentado bravamente os invasores franceses no século 17. Um grupo de cientistas revelou, no entanto, um lado menos honroso da tribo: eles também eram criminosos ambientais. Uma de suas vítimas foi um lago na Província de Ontário, assassinado por esgoto e resíduos agrícolas indígenas, que nunca mais se recuperou.
O "crime" aconteceu entre os séculos 13 e 15, quando uma aldeia iroquesa com cerca de 300 pessoas se estabeleceu às margens do lago Crawford. Os nutrientes lançados pelos índios no corpo d'água de 2,5 hectares (o tamanho de três campos de futebol) causaram uma proliferação excessiva de algas que literalmente asfixiou o fundo do lago, esgotando todo o oxigênio da água.
Esse fenômeno, chamado eutrofização, é um velho conhecido dos moradores de São Paulo e do Rio de Janeiro. Foi o que aconteceu com o rio Tietê e com a lagoa Rodrigo de Freitas: nutrientes presentes nos esgotos alimentaram demais certos tipos de alga, cuja posterior morte e decomposição aumentam a demanda por oxigênio. Animais e plantas que dependem desse oxigênio, bem como algas que não respondem bem aos novos nutrientes, acabam morrendo.
Num estudo publicado neste mês no periódico científico "Geology" (www.geology.com), o grupo liderado pelo americano Erik Ekdahl, da Universidade do Michigan, analisou camadas de sedimento extraídas do fundo do lago, que haviam sido depositadas ao longo dos últimos mil anos.
Os pesquisadores verificaram que, entre os anos 1268 e 1486, época da ocupação iroquesa, vários indicadores do estado de saúde do lago sofreram uma queda acentuada. A razão de átomos de carbono para nitrogênio, por exemplo, é baixa, o que indica uma alta produtividade do ecossistema lacustre.
Também foi observada a deposição de camadas anuais de sedimento, que em lagos "vivos" não chegam a se formar devido à ação de animais no fundo. As diatomáceas, um tipo de alga unicelular, sofreram uma mudança populacional: espécies que reagem mal a descargas de nutrientes foram eliminadas do ecossistema.
"Assim que os humanos aparecem, a flora de diatomáceas, que havia estado estável por centenas de anos, muda quase instantaneamente", disse Ekdahl à Folha. "Ela nunca mais volta ao estado pré-perturbação."
O tipo de resíduo despejado na água pelos índios ainda está sendo investigado. Há evidências de nutrientes de solo, liberados durante preparação para plantio ou construção de casas, e de esgoto produzido por humanos.
O novo estudo é mais uma evidência contra a hipótese dos "índios ecologistas", defendida por alguns antropólogos e cultuada por ambientalistas. Populações nativas têm sido acusadas pelos cientistas ao longo dos últimos anos de devastar as florestas tropicais da América Central -caso dos maias- e de ter provocado a extinção dos grandes mamíferos nas Américas e na Austrália no final da Era do Gelo.
"Esse é um tópico quente de pesquisa", disse o geólogo americano. "Há várias evidências que sugerem que populações humanas, nativas ou não, sempre influenciam o ambiente em volta delas. Mas seria um salto muito grande concluir que nós estamos subestimando o impacto de cada população indígena."

FSP, 07/09/2004, Ciência, p. A13

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