VOLTAR

Espécies ameaçadas

CB, Brasil, p.10
26 de Nov de 2005

Espécies ameaçadas
Estiagem na Amazônia afetou o ciclo de reprodução de muitos animais que vivem nos rios da região alerta a ONG WWF-Brasil. Problema é maior para aqueles que já estavam sob risco de extinção

Ullisses Campbell
Da equipe do Correio

A tão esperada chuva já começou a cair sobre a Amazônia, mas será necessária pelo menos uma década para o ecossistema se recuperar dos danos causados pela estiagem. A seca comprometeu o ciclo de mais de uma centena de espécies de peixes, répteis, anfíbios e até aves que dependem da água. A maioria desses bichos, diga-se, já estava ameaçada de extinção. Agora, os ambientalistas rezam para que a seca não se repita em 2006, o que tornaria a situação desses animais da Amazônia que vivem nas águas ainda pior.
Segundo um relatório do WWF-Brasil, os animais mais prejudicados são os peixes. "Como milhares deles morreram neste ano, a pesca de 2006 já está prejudicada porque os filhotes morreram e não haverá reprodução a tempo , ressalta Antônio Oviedo, coordenador do Programa de Várzea do WWF. Ele diz que, se a seca ocorrer todos os anos, os peixes da Amazônia sumirão do mapa em breve.
Poucos animais são tão sensíveis à temperatura da água quanto os peixes de rio. Sem capacidade para controlar a temperatura do corpo, eles precisam de água fria ou com temperatura ambiente para sobreviver. Com a estiagem, a temperatura da água subiu, ocasionando escassez de oxigênio e, como conseqüência, ocorre a falta de ar e baixa oferta de alimentos. "Por isso a gente vê na tevê aquelas imagens fortes de vários peixes mortos na superfície dos rios".
Com a chegada tardia das chuvas, os peixes da Amazônia levarão tempo para se recuperar das conseqüências da seca. Algumas espécies de porte médio, como o tambaqui, serão encontrados no ano que vem com uma tamanho bem menor. Principalmente porque a espécie se alimenta de frutos que caem das árvores sobre o rio. Com a estiagem, os frutos não alcançam a água e os peixes ficam magros, perdendo valor econômico.
Rios sem peixes afetam principalmente quem depende deles para sobreviver. Na Amazônia, a população ribeirinha está diretamente ligada à pescaria. Espécies comerciais geram emprego e renda na região. Aves, como o mergulhão, também sofrem com a escassez. "0 fenômeno da seca e suas conseqüências estão sendo observados. A previsão é que haja uma queda na quantidade de animais retirados dos rios nos portos daqui", alerta Antônio Oviedo
Fenômeno
Não são apenas os peixes que sofrem com a ressaca da estiagem. 0 biólogo Orlando Laguna, do Centro de Quelônios da Amazônia, revela que o fenômeno já afeta o ciclo das tartarugas-da-amazônia. A espécie, que já consta na lista dos animais ameaçados de extinção, enfrenta problemas para se reproduzir nas margens dos rios. Com as águas baixas, os ninhos desses répteis ficam mais expostos, facilitando a ação de predadores naturais. Nas margens dos rios que secaram, nas proximidades da cidade amazonense de Tefé, as tartarugas não conseguiram escavar a terra petrificada e acabam deixando centenas de ovos a céu aberto. "Ainda não conseguimos prever o tamanho do impacto da seca sobre o ciclo das tartarugas. No Pará, já encontramos 18 delas mortas. No Amazonas, outras 23", diz o biólogo.
Animais típicos dos rios da região, como ariranhas e botos também estão desaparecendo por conta da seca As chuvas que caíram agora ocorreram mais nas cabeceiras dos rios. "Isso significa que a vida dos animais ainda vai demorar a normalizar.
Há rios totalmente secos na região", ressalta o ambientalista Romério Mamede, do Museu Emílio Goeldi, do Pará.
A seca que castigou a Amazônia ocorreu por conta de um aquecimento global semelhante ao E1 Nino. As águas do Oceano Atlântico superaqueceram e levaram para lá todas as nuvens que estavam sobre a floresta carregadas de chuvas. Com isso, a água que deveria ser despejada sobre a Amazônia caiu toda no oceano. "Estamos rezando para que no ano que vem esse fenômeno não se repita", conta o presidente da Associação de Pescadores de Santarém, Raimundo Nunes. A oferta de pescado na região caiu pela metade este ano.
Como o homem é apontado com principal responsável pelo aquecimento global, não adianta muito rezar, avisa o professor Saulo Ramos, da Universidade de Campinas (Unicamp). "0 problema da seca na Amazônia é apenas um sinal do que vem por aí, caso não se tome providências para frear o aquecimento global e a emissão de gases de efeito estufa, como os liberados pela queima de carvão, petróleo e gás natural", alerta Nunes. A previsão do W WF é que a temperatura aumente ainda mais, entre 1.4 e 5.8 graus centígrados, até o fim deste século.

CB, 26/11/2005, Brasil, p. 10

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.