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Encontro das Mulheres indígenas

Documento do encontro das mulheres indígenas
18 de Abr de 2001

AUTONOMIA E REPRESENTAÇÃO POLÍTICA DAS MULHERES INDÍGENAS DA AMAZÔNIA LEGAL BRASILEIRA

Durante os dias 17 e 18 de Abril de 2001, estiveram reunidas em Rio Branco/AC, 35 lideranças indígenas das nações abaixo relacionadas, participando do I Encontro de Mulheres Lideranças Indígenas da Amazônia, promovido pelo Grupo de Mulheres Indígenas da UNI / Acre e Sul do Amazonas e o Movimento Articulado de Mulheres da Amazônia – MAMA, em preparação à III Conferência Mundial Contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Outras Formas Correlatas de Intolerância.
As lideranças indígenas elaboraram, através de exposições, trabalhos em grupos e debates, este documento que contêm as reivindicações e propostas para os temas Autonomia e Representação Política, Saúde, Educação e Combate a Violência para as comunidades indígenas da Amazônia Legal Brasileira.
Os grupos de trabalho foram orientados pelas seguintes perguntas:

1. Que tipos de discriminação vocês acham que sofrem dentro da aldeia e fora da aldeia?
2. O que vocês acham que deve ser feito para combater essa discriminação?

I. AUTONOMIA E REPRESENTAÇÃO POLÍTICA

Tipos de discriminação:

1. Legislação ultrapassada que nos considera incapazes.
2. Desrespeito ao patrimônio cultural e a diversidade.
3. A falta de elaboração, implementação e execução de políticas públicas que garantam a formação e a qualificação do/da profissional indígena.
4. não reconhecimento da identidade cultural do/da índio/a que mora fora da aldeia.
5. Elaboração e execução de projetos sem o prévio conhecimento e participação da comunidade.
6. A falta de acessos de índios/as qualificados/as nos órgãos do governo que trabalham com a questão indígena.
7. A falta de condições e recursos para a proteção das terras indígenas.
8. não cumprimento da Constituição Federal de 1988, que garantia a demarcação das terras indígenas em 5 anos.
9. A diminuição/redução de terras indígenas.
10. conceito equivocado (folclórico) do que é ser índio! (que não pode incorporar novos conhecimentos)
11. Política assistencialista, paternalista, integracionista e de exclusão que causou a dependência econômica e política dos povos indígenas.

AUTONOMIA DOS POVOS INDÍGENAS:

1. Que o Estado brasileiro nos reconheça como povos indígenas.
2. Imediata aprovação do Estatuto dos Povos Indígenas
3. Mudança na legislação: que seja reconhecida nossa capacidade plena.
4. Autogestão dos territórios
5. Reconhecer, respeitar e proteger os direitos intelectuais, os conhecimentos tradicionais e a diversidade biológica (patrimônio genético)
6. Direito e acesso à qualificação e formação de profissionais indígenas voltados a realidade de suas comunidades.
7. reconhecimento e o respeito a identidade indígena, daqueles/as que por força dos processos históricos de contato e colonização, vivem fora das aldeias e dos povos que estão ressurgindo.
8. Desenvolvimento econômico, com a exploração racional dos recursos naturais, com projetos amplamente discutidos e elaborados com a comunidade que garantam a etno sustentabilidade.
9. Reconhecimento e organização das nações indígenas.
10. Acesso aos quadros dos órgãos do governo que tratam da questão indígena.
11. Demarcação, extrusão, proteção e fiscalização das terras indígenas.
12. Incorporação de tecnologias, saudáveis do ponto de vista ambiental, que visem o etno desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida.
13. Reformulação da política indigenista oficial e a urgente reestruturação do órgão indigenista (FUNAI)
II. EDUCAÇÃO

Que escola queremos?

1. Uma escola que atenda os interesses da comunidade indígena
2. Com uma proposta curricular, pedagógica e política elaborada e pensada conforme os valores da Cultura indígena;
3. Que seja cumprida a legislação que assegura a formação em serviço e continuado do professor/professora, priorizando seu conhecimento da educação indígena;
4. Os programas de formação contempla o saber indígena respeitando o nível de entendimento cognitivo de cada professor/professora e elaborado conjuntamente com a comunidade;
5. Que a língua materna seja predominante na escola;
6. Que os governos assegurem nas políticas públicas ações que contemplem a legislação, sem intervalo de governo;
7. Oportunizar uma formação política crítica consciente dos seus direitos para nortear as áreas de conhecimento dos cursos de formação.
8. Capacitar os formadores/formadoras, técnicos - não indígenas - ligadas às várias instâncias do governo para conhecer a realidade indígena;

III. VIOLÊNCIA

1. A violência do passado que massacrou os povos indígenas
2. A violência atual que é humilhação, na falta dos direitos na terra, saúde, educação e outros.
3. A violência em relação ao direito a floresta, a fauna e ao restante dos nossos conhecimentos.
4. A maior discriminação que sofremos é quando vivemos nossa tradição, nossa pintura, nossa música, nosso ritual e o que também sofremos na cidade pelo não índio.
5. Violência contra mulheres indígenas, principalmente o estupro causado pelos não índios, funcionários da FUNAI e também pelos fazendeiros, seringueiros, militares, garimpeiros e posseiros vizinhos que ficam mais próximos das aldeias.
6. Violência psicológica moral e social.

Como combater a violência?

1. A união dos povos juntos sempre lutando pelos seus direitos.
2. A punição de fato aos agressores dos/as índios/as, que a justiça seja imparcial!
3. Combate a exploração sexual das meninas indígenas
4. Não instalação de bases militares, mineradoras e hidroelétricas em terras indígenas.
5. Política de prevenção e combate as alcoolismo.
6. Aprovação imediata da lei de biodiversidade (Senadora Marina Silva)
7. Ratificação da Convenção 169
8. Não aprovação da emenda constitucional que diz que são bens da União o patrimônio genético dos povos indígenas.
9. Combater a veiculação de imagens preconceituosas dos/as índios/as nos meios de comunicação.
10. Que exista o respeito a cultura dos povos indígenas mas combatendo os atos violentos dentro da própria aldeia.

IV. SAÚDE

Qual a saúde que queremos?

1. Utilização da medicina tradicional com o resgate das ervas, raízes... e suas finalidades.
2. Formação de mais mulheres agentes de saúde, técnicos/as em enfermagem, etc.
3. Instalação de Prontos Socorros para o trabalho/atendimento pelos e pelas agentes de saúde.
4. Reconhecimento dos/as Agentes de Saúde pelo Ministério da Saúde.
5. Trabalho de conscientização sobre a importância de se fazer o pré natal e acompanhamento no climatério.
6. Garantia dos exames preventivos de câncer de mama e colo uterino e também da próstata.
7. Reconhecimento e valorização das Parteiras Tradicionais Indígenas dando condições para a realização do trabalho através da distribuição de equipamentos necessários/kit da parteira, para a execução de sua atividade com segurança.
8. Treinamento e aperfeiçoamento das parteiras tradicionais da floresta.
9. Participação Parteiras Tradicionais Indígenas em todos os eventos relacionados à saúde
10. Trabalho de prevenção em DSTs/AIDS
11. Que os/as agentes de saúde não acumulem a função de professor/a
12. Trabalhar hortas medicinais nas comunidades indígenas para abastecer os postos de saúde.
13. Capacitação em saneamento básico debatido com cada povo.
14. Fazer uma conscientização da população indígena de que está sendo explorada pela indústria farmacêutica e se houver abuso comercial, entrar com ação punitiva contra a pessoa ou o laboratório ou o Instituto de pesquisa
15. Que nos hospitais da rede pública os povos indígenas tenham tratamento diferenciado
16. Assegurar acompanhante bilíngüe à pessoa indígena que dê entrada em hospital público
17. Capacitar enfermeira(os) e médicas(os) do sistema de saúde para o atendimento dos povos indígenas
18. Valorização dos especialistas tradicionais indígenas numa atuação conjunta com uma equipe que trata da saúde
19. Reconhecimento do/a profissional indígena na valorização da sua formação à nível de escolaridade e técnica
20. Atuação conjunta dos/as professores/as e agentes de saúde numa atividade educativa no campo da prevenção das doenças incluindo DSTs e AIDS.
21. Garantia da imunização/vacinação
22. Formas de combate ao alcoolismo que tem gerado muita violência (palestras atendimentos individuais)
23. Trabalho em conjunto: Professores/as junto com caciques/lideranças.
24. Fazer diagnósticos para identificar as causas de alcoolismo e uso de drogas nas aldeias.
25. Alcoolismo é uma doença e precisa ser tratado como doença – curativo, fazer também trabalho preventivo.
26. Tratamento odontológico – preventivo e curativo
27. Esclarecimentos para os/as jovens para a sexualidade e reprodução envolvendo a comunidade, professores/as, mães, avós, parteiras respeitando a cultura de cada povo
Observação:
Questões a serem aprofundas:
1. Participação político partidária dos povos indígenas
2. Parlamento indígena
3. Internacionalização da Amazônia

Participaram dos Grupos de Trabalho cerca de 35 mulheres lideranças indígenas representantes dos seguintes povos: Tiryó, Apalai, Tapuia, Sateré Mawé, Tukano, Kassupá, Oro Naó, Karitiana, Gavião, Kaikuna, Karipuna, Macuxi, Pareci, Bakairí, Guajajará, Krikaty, Juruna, Xipaia, Surui, Patachó, MaNchineri, Kaxinawá, Shanênawa, Iauanawá, Apurinã, Nukini, Poyanawá, Nawa, Kulina, Katuquina, Kamadeni, Shadawá, Jamamadi, Jaminawa, Marubo, Shawâdawa (Arara) e Kaingang (Convidada)

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