VOLTAR

Empresas transformam água em dinheiro

CB, Economia, p. 15
18 de Mai de 2005

Empresas transformam água em dinheiro
Indústria investe em programa de reaproveitamento e aumenta ganhos. Produtividade de algumas companhias supera média mundial

Luís Osvaldo Grossmann
Da equipe do Correio

As indústrias brasileiras, e do Distrito Federal, começam, aos poucos, a descobrir como fazer economia com a reutilização da água. Em um país com cerca de 13% da água potável do planeta, mas onde o desperdício chega a 40% do consumo, são iniciativas que fazem diferença, em especial no cofre das empresas. Por enquanto, o reaproveitamento ainda é restrito a uma minoria de indústrias, mas no DF já há exemplos concretos de como é possível transformar a água em dinheiro.
Na semana passada, a Ambev, que tem uma unidade no Gama, onde produz as cervejas Brahma, Skol e Antarctica, comemorou uma nova marca na economia de água. A fábrica no DF é a segunda mais eficiente da empresa em toda a América Latina, atrás apenas da de Curitiba (PR). No Gama, são gastos 3,39 litros de água para cada litro de bebida produzido. A média entre todas as fábricas da empresa é de 4,37 litros.
"O Distrito Federal tem uma das três fábricas da Ambev onde o consumo de água já está abaixo do marco internacional no setor, de quatro litros para cada litro de bebida produzido", comemora a gerente corporativa de meio ambiente da empresa, Beatriz Oliveira. A grande mudança, ela explica, é comportamental: conscientizar os funcionários para a reutilização da água.
Isso porque, proporcionalmente, o investimento financeiro é pequeno na comparação com o ganho. Na fábrica do Gama, por exemplo, foram investidos R$ 350 mil em reaproveitamento da água. "Em 2001, a Ambev consumia 5,62 litros de água para cada litro de bebida produzido. A diferença, de lá para cá, é suficiente para abastecer uma cidade de 60 mil habitantes por um ano", diz Beatriz.
A conscientização funciona nas pequenas tarefas. Afinal, a economia se dá, essencialmente, na reutilização de água para a limpeza das instalações da fábrica. "Há um benefício financeiro direto, porque o custo é reduzido", completa a gerente de Meio Ambiente.
Concorrente direta da Ambev (que tem a licença da Pepsi no Brasil), a fábrica da Coca-Cola em Taguatinga é outra a apresentar um desempenho superior à média da empresa no país. E mais, com a utilização de 2,15 litros de água para cada litro de bebida produzido, a unidade do DF está à frente não apenas da média nacional da companhia (2,34 litros), como da mundial, que é de 2,9 litros/litro de bebida.
Minoria
O uso eficiente da água ainda é pouco praticado no Brasil e no Distrito Federal. Além das empresas já citadas, há outros exemplos de iniciativas isoladas. Algumas empresas da construção civil utilizam um sistema simples para devolver a água ao meio ambiente. "Nós damos a orientação para que as empresas utilizem o filtro de brita, que permite reter o cimento e, assim, devolver a água usada na limpeza das betoneiras", explica a gerente técnica do Sindicato da Indústria da Construção Civil do DF (Sinduscon), Isabela Ferreira.
No geral, porém, os esforços ainda são restritos. "Estamos tentando realizar um trabalho para reutilização da água, mas ainda em caráter inicial. O foco no DF, até agora, foi nos resíduos sólidos", explica o coordenador da área de Gestão Ambiental do Sebrae-DF, James Reeberg. Mas o Distrito Federal não é uma exceção entre as indústrias do país. Segundo um estudo da Hidrogesp, que oferece serviços de gestão do uso da água, apenas 1% das empresas no Brasil faz reaproveitamento, mesmo o mais simples, como utilizar o que sobrou da produção específica de determinada fábrica para limpar o chão ou os veículos.
É certo, no entanto, que o reúso da água significa economia garantida. O mesmo estudo da Hidrogesp mostra que, se todas as indústrias brasileiras reutilizassem a água que compram das concessionárias, liberariam cerca de 1,65 bilhão de litros por dia, suficientes para abastecer constantemente 8,2 milhões de pessoas. Resultado que seria sentido no bolso. Basta perceber os ganhos da fábrica da Volkswagem em Taubaté, no Vale do Paraíba (SP). Como a empresa reutiliza 70% dos 100 mil metros cúbicos de água que consome mensalmente, economiza cerca de R$ 250 mil por mês.
"Ainda somos muito tímidos na questão do uso eficiente da água", reconhece o diretor da Agência Nacional de Águas (ANA), Benedito Braga. Mas ele mesmo aponta o ganho com a prática. "Quem utiliza melhor a água tem vantagens comparativas, porque, na medida em que precisamos buscar água cada vez mais longe, ela fica mais cara. Alguém vai pagar por isso", completa.
Em outros países, a preocupação com a água já produziu resultados mais robustos. Nos Estados Unidos, o consumo industrial diminuiu 36% desde 1950. A Alemanha mantém o mesmo nível de utilização da água desde 1975, embora a produção, no mesmo período, tenha aumentado 44%. E, no Japão, o consumo industrial diminuiu 24% desde 1989.
No fim do ano passado, a Federação das Indústrias do Estado de São Paulo lançou uma cartilha para orientar o setor na gestão eficiente do uso da água. Ela traz dicas para evitar o desperdício nas empresas, mostrando que é possível reduzir o consumo entre 20% a 50% e conseguir com isso um aumento nos lucros em até 10%. Segundo a publicação, o custo da água representa, em média, 1% do faturamento de uma empresa, podendo chegar a mais de 4%.
A preocupação também parece, agora, ter chegado ao país de forma institucionalizada. Em março deste ano, o governo federal instituiu a Década Brasileira da Água, reconhecendo-a como estratégica no cenário internacional e com o objetivo de promover a criação e a implementação de políticas voltadas ao gerenciamento e uso sustentável do recurso natural. A medida vem de carona na resolução das Nações Unidas, que definiu o período 2005-2015 como o Decênio Internacional para a Ação - Água, fonte de Vida.

CB, 18/05/2005, Economia, p. 15

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.