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Empresa podera explorar genetica comercialmente

OESP, Geral, p.A13
26 de Jun de 2004

Empresa poderá explorar genética comercialmente
Ministério concedeu a 1.ª autorização de coleta de material biológico para fins comerciais
HERTON ESCOBAR
O Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEN), do Ministério do Meio Ambiente, concedeu a primeira autorização para que uma empresa privada realize coleta de material genético da biodiversidade brasileira para fins comerciais. A Extracta Moléculas Naturais, com sede no Rio, foi criada em 1998, mas há dois anos estava proibida de fazer coletas de campo, desde a criação do CGEN. A empresa mantém uma biblioteca química com cerca de 40 mil moléculas e compostos químicos vegetais extraídos da flora nacional, que são pesquisados para uso em medicamentos e cosméticos.
A licença, aprovada esta semana, legaliza a coleção de amostras já existente e autoriza a empresa a realizar novas coletas pelos próximos dois anos - renováveis por mais dois -, sem a necessidade de novas autorizações. A obtenção do material fica condicionada à assinatura de um contrato padrão, garantindo a repartição de eventuais lucros com os proprietários da terra - que podem ser um fazendeiro, o governo ou uma tribo indígena, dependendo da situação. "Cada novo extrato estará sujeito a um contrato correspondente", disse o secretário-executivo do CGEN, Eduardo Vélez. A empresa é a única que realiza essa atividade no País atualmente.
As exigências atendem à normatização da Medida Provisória 2.186, de agosto de 2001, que regulamentou o acesso ao patrimônio genético da biodiversidade brasileira. Entenda-se por isso o DNA, e todas as substâncias sintetizadas por ele, de todas as plantas e animais silvestres do Brasil, que podem ser pesquisados para fins científicos e/ou comerciais. A atividade de bioprospecção, como é conhecida, busca na natureza moléculas que possam ser de interesse para a indústria - seja para a produção de uma nova droga contra o câncer ou simplesmente para deixar um sabonete mais cheiroso. No caso da Extracta, um cliente apresenta um "alvo" biológico - uma bactéria que se queira destruir ou um processo celular que se queira estimular, por exemplo - e a empresa testa sua coleção de extratos vegetais sobre esse alvo, na esperança de que um deles tenha o efeito desejado.
O problema é o seguinte: se esse material dá origem a um produto, e esse produto é colocado no mercado, quem deve ficar com os lucros? Quais são os direitos de uma tribo indígena, por exemplo, que já usava uma planta medicinal há séculos e teve esse conhecimento aproveitado pela indústria? Ou de um fazendeiro que abriu sua propriedade para a coleta do material?
A coleção da Extracta é toda baseada em 5 mil tipos de plantas, todas retiradas de propriedades particulares na mata atlântica e na Amazônia.
Pelas normas do CGEN, cada proprietário terá direito a 2,5% do lucro obtido pela Extracta sobre qualquer produto desenvolvido a partir do material biológico retirado de suas terras. "A definição desse porcentual ainda é um tema de grande discussão", afirma Vélez. "O fato é que ainda não temos parâmetros técnicos para dizer se isso é muito ou pouco, porque é um conceito totalmente novo. Só o tempo vai nos dar a medida exata."
O diretor-geral da empresa, Antonio Paes de Carvalho, arrisca alguns valores. Segundo ele, nenhum laboratório multinacional coloca um produto no mercado por menos de US$ 200 milhões. Pelos contratos da Extracta, a empresa ficaria com 3% desse lucro (US$ 6 milhões) e os provedores do material, com 2,5% disso (US$ 150 mil). "Foi um processo longo e que exigiu compromissos, mas acho que com um final feliz", disse Carvalho, sobre a autorização do CGEN.
Apesar da liberação para retomada das coletas, disse Veléz, a empresa ainda precisará de autorizações caso a caso para realizar os contratos de bioprospecção. Desde 1998, a Extracta trabalha sob um contrato de US$ 3,2 milhões com a gigante farmacêutica GlaxoSmithKline, que se encerra nos próximos quatro meses. A multinacional pediu que a empresa testasse sua coleção sobre oito alvos de interesse farmacológico. Segundo Carvalho, foram identificadas dez moléculas com ação biológica relevante. O trabalho é sigiloso, mas duas já tiveram sua função revelada: uma contra a enzima elastase, envolvida em doenças pulmonares crônicas, e outra contra uma bactéria de infecção hospitalar resistente a antibióticos.
"Há uma nova ênfase da indústria pela busca de fármacos naturais e estamos no processo de assinar novos contratos", disse Carvalho. "A natureza esconde uma imensa riqueza química, que só agora estamos começando a conhecer."

OESP, 26/06/2004, p. A13

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