VOLTAR

Em visita ao povo do buraco d'agua

OESP, Caderno 2, p. D3
24 de Jul de 2004

Em visita ao povo do buraco d'água

É trágico para um povo tornar-se conhecido pelo nome dado por seus dominadores e não por aquele pelo qual se reconhecem, desde o passado ancestral. Mais do que uma crise de identidade, essa situação - que não é exclusiva dos caiapós, mas surpreende àqueles que descobrem que esses índios se chamam entre si de "mebêngôkre" (povo do buraco d'água) - revela a complexa e difícil relação entre o homem branco e a cultura indígena ameaçada em seus valores mais profundos.

Na tentativa de retratar esse rico universo dos caiapós metutires (habitantes da região de Capoto-Jarina, situada no limite entre o Parque Indígena do Xingu e a divisa do Pará) de maneira respeitosa, um grupo de 12 pesquisadores, fotógrafos e especialistas estudou ao longo de quase quatro anos os hábitos e costumes do grupo dos metutires.

O resultado do trabalho pode ser conhecido a partir de hoje, com o lançamento múltiplo, exposição, livro, CD e vídeo no Museu da Imagem e do Som (MIS). E dá forma ao desejo de seus idealizadores de realizarem uma aproximação distinta, mais pura, mais bela e talvez mais ingênua do universo indígena em busca de um contato que não tenha muito a ver com a violência comum que marca o encontro entre índios e brancos. "A proposta é trazer à tona um olhar poético e documental, sem os vícios da mitificação de um lugar onde o índio não seja nem belo nem feio, seja apenas índio, em toda a grandeza que essa condição implica", explica o diretor-geral do projeto, Vito D'Alessio na introdução do livro Caiapó Metutire.

Ele conta como foram as seis expedições junto a "essa gente de personalidade firme e por vezes desconfiada", que os obrigava a cada vez ficar dias sem tirar as máquinas das malas, esperando que se acostumassem com a sua presença. Essa intimidade se percebe nas fotos selecionadas por D'Alessio, nas quais se intercalam imagens do dia-a-dia da tribo, com seus rituais e costumes, e imagens mais amplas da natureza, reforçando a grande liberdade desse povo seminômade.

Às imagens contemporâneas, que retratam desde cerimônias de pesca coletiva a ritos de pintura corporal, somam-se algumas imagens de arquivo, em preto-e-branco, feitas na década de 40, e uma série de retratos do líder Raoni, um dos grandes responsáveis pela divulgação da cultura caiapó. As crianças também têm amplo espaço na pesquisa iconográfica.

Os textos vão além e resumem questões importantes dessa cultura. O primeiro deles, extraído do livro A Marcha para o Oeste; A Epopéia da Expedição Roncador-Xingu e assinado pelos sertanistas Orlando e Cláudio Villas Boas, descreve como se deram os primeiros contatos com os txucarramães (como eram chamados pelos antigos inimigos jurunas), na década de 50.

Em seguida, Paulo Pinagé aborda aspectos geográficos, mitos da origem, divisão do trabalho, distribuição das tarefas entre homens e mulheres e hábitos alimentares, entre outros. Obra semelhante, realizada pela Dialeto Latin American Documentary (empresa de D'Alessio e Renato Dutra) sobre os índios mehinaku recebeu sete premiações internacionais.

OESP, 24/07/2004, Caderno 2, p. D3

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.