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Em Brasília, MST vaia Lula e 2 ministros

OESP, Nacional, p. A13
25 de Nov de 2004

Em Brasília, MST vaia Lula e 2 ministros
Evento, financiado com recursos públicos, vira palco para sem-terra criticarem governo federal

Gilse Guedes

Patrocinada com dinheiro da União, a Conferência Nacional Terra e Água virou palco de protesto contra o governo e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No evento, que reuniu mais de 9 mil trabalhadores rurais, sobraram vaias aos ministros da Agricultura, Roberto Rodrigues, do Desenvolvimento, Luiz Furlan, e a Lula, que não foram ao evento. Apenas um representante do governo foi elogiado, o presidente do Incra, Rolf Hackbart, que anteontem acusou representantes do agronegócio de envolvimento nos assassinatos de sem-terra.
Uma das principais lideranças do MST, João Pedro Stédile, disse que Rodrigues é o grande "vilão" da reforma agrária por ser visto como aliado do agronegócio. "Por que nós queremos vaiar o Rodrigues? Nós vaiamos os interesses e a política que ele representa", discursou Stédile, arrancando da platéia uma longa vaia ao ministro.
Depois, direcionou seus ataques a Lula. "Queremos mostrar ao presidente Lula que somos amigos dele, mas não somos burros. Nós o elegemos para mudar o modelo neoliberal e até agora não mudou nada", criticou Stédile, que também não poupou o ministro da Fazenda, Antonio Palocci.
Segundo ele, Palocci não "gosta de conversar com o povo" e o governo está dando mais espaço ao agronegócio e às exportações. Para Stédile, os representantes do agronegócio, entre eles Rodrigues e Furlan, se articularam no governo e são os "puxa-saco" do setor.
Decepção
Mesmo descontentes com o governo, a maioria das 9 mil pessoas presentes no Ginásio Nilson Nelson queria ver Lula. A presença do presidente foi prometida pelos organizadores para anteontem e adiada para ontem. Depois de conversar com assessores da Secretaria-Geral da Presidência, o secretário-executivo do Fórum Nacional de Reforma Agrária, Gilberto Portes, decepcionado, disse à platéia que Lula não iria. Foi nesta hora que o presidente foi vaiado. "O que importa para nós não é o presidente vir bater nas costas da gente. O importante é o que nós vamos fazer daqui para frente", disse Portes.
Antes de saber que Lula não iria, o presidente da Comissão Pastoral da Terra (CPT), d. Tomás Balduíno, disse que "teria de haver um motivo grave de segurança nacional para ele não vir". Ele apoiou as declarações de Hackbart. "O governo não pode se submeter ao agronegócio e ao setor exportador."

Carlos Lessa critica governo e elogia MST
Demitido há uma semana da presidência do BNDES, Carlos Lessa enviou uma carta aos organizadores da Conferência Nacional Terra e Água com ataques ao governo Lula. No texto, ele propõe que o povo assuma a responsabilidade de viabilizar a democracia econômica e social. "A nação real é a nação do povão", disse Lessa, que alegou problemas de saúde para não ir ao evento. Para ele, uma das grandes esperanças de que a mudança para um novo modelo econômico é possível é a força do MST.

Lula pensou em demitir Hackbart
Presidente do Incra vinculou agronegócio a mortes de sem-terra

João Domingos
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva ficou profundamente irritado com as declarações do presidente do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Rolf Hackbart, para uma platéia de sem-terra, em Brasília. Ele associou representantes do setor de agronegócios à morte de trabalhadores rurais no País. Lula chegou a comentar com alguns de seus ministros que determinaria a demissão de Hackbart.
Lula só não concretizou a demissão porque não quis agravar o clima de tensão com os sem-terra, informaram assessores do presidente. Hackbart, no entanto, ficou, como dizem os políticos, na "marca do pênalti". Por causa da declaração dele, Lula cancelou sua participação na Conferência da Água e da Terra, marcada para ontem.
Na avaliação do governo, Hackbart foi de uma inabilidade sem tamanho. Esse tipo de coisa que ele disse, comentou um dos assessores especiais do presidente, já tem muita gente para dizer, principalmente líderes do MST. Portanto, não haveria nenhuma justificativa para que o presidente do Incra, importante autarquia para o equilíbrio da disputa entre sem-terra e proprietários, repetisse o que diz o MST. Principalmente, sabendo-se que o setor de agronegócios é fundamental para o crescimento da economia, geração de empregos e equilíbrio da balança comercial. O setor de agronegócios movimenta 34% do Produto Interno Bruto (PIB).
No final da tarde de ontem, Hackbart a uma determinação do Palácio do Planalto e começou a dar explicações sobre sua fala. Ao Estado, negou que houvesse a exigência. Mas fez questão de traduzir melhor suas palavras. "Quero dizer que elas foram faladas num determinado contexto e é isso que quero repetir."
Declarações
As explicações do presidente do Incra para suas declarações de ontem: "Quis dizer que os setores produtivos da área rural, o patronal, da agricultura familiar e dos assentamentos são fundamentais para a economia brasileira; que a reforma agrária promove o desenvolvimento do meio rural, a justiça e a paz no campo para milhares de sem-terra, povos da floresta, ribeirinhos e quilombolas; que infelizmente, alguns fazendeiros ainda se utilizam da violência, do trabalho escravo e da intimidação para impedir o desenvolvimento do setor rural".

Fazendeiro será indiciado por mortes de sem-terra

Eduardo Kattah

O delegado Wagner Pinto, que preside o inquérito sobre o assassinato de cinco integrantes do Movimento dos Sem-terra (MST) em Felisburgo (MG), já definiu que o fazendeiro Adriano Chafik Luedy será indiciado por homicídio qualificado e tentativa de homicídio. Chafik é proprietário da Fazenda Nova Alegria, onde está localizado o acampamento Terra Prometida, atacado no último sábado por um grupo armado.
De acordo com as investigações, o fazendeiro não só foi o mandante como participou da operação contra os sem-terra. "Ele arquitetou e participou da ação criminosa", disse o delegado.
A prisão temporária de Chafik já foi decretada pela polícia, mas até o final da tarde de ontem não tinha sido concretizada. Equipes da Polícia Federal realizavam operações no sul da Bahia, onde o fazendeiro possui outras propriedades. Diante da repercussão do caso, havia a expectativa de que ele pudesse se apresentar espontaneamente.
O gerente da Fazenda Nova Alegria, Sebastião Cardoso, detido anteontem, deu informações que levaram à apreensão de armas (seis escopetas, duas carabinas, três revólveres e uma pistola semi-automática) na propriedade. "É uma prova material bastante relevante para a elucidação dos fatos", observou o delegado.

Stédile chama agricultores de palhaços
Transgênicos: Líder do Movimento dos Sem-Terra (MST), João Pedro Stédile chamou ontem os agricultores gaúchos de "palhaços" por plantarem soja transgênica no Rio Grande do Sul. Segundo ele, os grandes produtores rurais são defensores dos organismos geneticamente modificados, como a soja transgênica, porque podem cobrar royalties dos outros produtores por serem detentores de suas patentes. "Os palhaços dos gaúchos têm de pagar royalties", disparou. Stédile disse ontem que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu que trabalhará pela mudança do projeto de biossegurança, visto como um retrocesso pelos sem-terra. A proposta foi aprovada por uma comissão especial da Câmara.

OESP, 25/11/2004, Nacional, p. A13

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