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Desenvolvimento e meio ambiente

GM, Opinião, p. A3
Autor: BICUDO, Ricardo
26 de Jan de 2004

Desenvolvimento e meio ambiente
"Degradação ambiental" e "pobreza" são parâmetros de uma mesma lei.

Os países em desenvolvimento encontram-se em situação singular para desenvolver seus projetos e alcançar patamares mínimos de progresso. As condições atuais que enfrentam para viabilizar projetos de infra-estrutura são barreiras difíceis de serem transpostas. Pelo menos três merecem atenção: usam modelos de engenharia inadequados à sua realidade, em geral adaptados do Primeiro Mundo; estão sob a vigência de uma ordem econômica complexa e cruel - a economia de mercado -, que impõe verdadeiros malabarismos no ajuste dos parâmetros técnicos e econômicos às leis do deus mercado, e encontram-se sob o jugo imaturo e dispendioso dos licenciamentos ambientais, o principal objeto das discussões da hora.

Combinados entre si, esses fatores são um nó difícil de ser desatado. A ponta do nó que nos interessa é o conflito entre nossos desenvolvimentistas e ambientalistas. A gestão política primeiro. É óbvio e natural o choque de idéias e interesses nas sociedades democráticas, e o embate em si não é problemático, mas causa a marginalização das questões centrais, as que realmente importam nesta discussão. Os extremos estão no foco, com seu jeito radical e fundamentalista, e as questões e as soluções reais distantes. Prescreve-se, então, a medicina apropriada quando o bom senso se omite: o tempo. E pagamos a conta desse tratamento com subdesenvolvimento. Ainda confio na mediação equilibrada da inteligência do País, isenta do espírito dos extremos e do pensamento sistemático e alheia à pressão internacional. Será preciso mobilizá-la.

"Degradação ambiental" e "pobreza" são parâmetros de uma mesma lei circular; bem, isso é algo para não ser mais discutido, mas deve ser colocado no centro da questão. O homem só protegerá a natureza na medida em que se sentir protegido na sociedade em que vive. De outro modo não há como formar consciência ecológica, e qualquer esforço de educação ambiental será inócuo. Hoje, proteção ao meio ambiente é tema para minoria: a maior parte da nação não quer falar do assunto; para ela é nitidamente uma questão secundária, pois permanece o sentimento de desamparo. Tocar na indiferença, aonde for, deve ser o foco.E a técnica. Quando vejo aquelas propagandas contrárias à construção de usinas hidrelétricas do tipo "Terra sim, barragem não", fico impressionado com a nossa incompetência para tratar politicamente o que é de caráter técnico. Tropeçamos na própria ignorância. Um país de dimensões continentais como o Brasil tem espaço para abrigar todas as tendências. Muitos planos foram elaborados, porém nada ainda que possa ser identificado como sério e eficiente no sentido de definir uma política nacional de desenvolvimento sustentável (termo já banalizado), um zoneamento do uso, ocupação e preservação dos recursos disponíveis, com legitimidade para ser de fato respeitado por todos os setores. Uma certeza devemos ter: há espaço para tudo nesse super-Brasil continental. Só aqui se cogita em reservar mais de 11% do território para nativos. É ridícula a discussão pelo espaço num país como este. Ou estamos falando da Suíça? Ou do Japão?
kicker: "O homem só protegerá a natureza na medida em que se sentir protegido"

Ricardo Bicudo - Engenheiro

GM, 26/01/2004, Opinião, p. A3

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