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Demarcação de território é um dos principais desafios indígenas

O Informativo do Vale http://www.informativo.com.br/
Autor: Carolina Schmidt
11 de Abr de 2018

Alunos e professores do Centro de Ciências Humanas e Sociais e do Curso de História da Univates dedicaram o dia de ontem (10) para debater questões indígenas. O cientista social e mestre em Antropologia, Mauro Silvestrin, e o historiador e mestre em Arqueologia, Luiz Carlos da Silva Júnior, realizaram um bate-papo e apresentaram os principais desafios. Entre eles, a demarcação de terras, apontam os pesquisadores, que também são servidores da Fundação Nacional do Índio (Funai).

De acordo com Silva Júnior, 98,3% das terras demarcadas no país estão na Amazônia Legal, sendo 1,7% restam para regiões como Nordeste, Sudeste, Centro-Oeste e Sul. Com a divisão atual, 45% da população indígena fica confinada ao espaço de menor percentual. Entre os governos de Fernando Collor e de Fernando Henrique Cardoso, entre 1990 e 2002, houve somente um movimento neste sentido, na região da Amazônia Legal.

A partir da presidência de Luís Inácio Lula da Silva, houve uma mudança de olhar. "Com isso, surgiram os maiores gargalos para a Funai. Hoje, para a fundação, as áreas prioritárias são a Bahia, Mato Grosso do Sul e os três Estados do Sul. Essas regiões são as que têm confronto agrário por causa dessa questão. Existe um déficit de demarcação enorme nesses outros locais em comparação com a Amazônia", explica Silva Júnior. Para ele, uma das maiores dificuldades é mostrar que o Bioma da Mata Atlântica também é de extrema importância, assim como o território amazônico. "Hoje, está em extinção e é restrita para questões florestais e indígenas. Esse bioma também precisa ser valorizado."

Com os acadêmicos da Universidade do Vale do Taquari, os pesquisadores debateram ainda sobre história, antropologia e arqueologia indígena no Estado, as relações entre as comunidades de índios e o Estado brasileiro.

Em questão

Natural do Mato Grosso do Sul, Mauro Silvestrin é cientista social pela Universidade Federal do Paraná. Ingressou em 2012 na Funai para realizar um trabalho com o povo caingangue e charrua no Rio Grande do Sul, na Coordenação Regional de Passo Fundo. Também morou dois anos na comunidade indígena do município de Nonoai.

1 O Informativo do Vale - Qual a importância em preservar a cultura e patrimônio indígenas no Rio Grande do Sul?

Mauro Silvestrin - A importância é ímpar, pois cada forma cultural de se ver e se entender um mundo é um repositório que traz soluções diferentes para problemas concretos e entendo que essa é a grande beleza da diversidade humana. Aqui no Rio Grande do Sul, temos ainda uma ideia hegemônica sobre a imigração europeia, sendo que polaco não é igual a alemão e italiano, sendo que transmitimos uma gênese europeia a partir de formas muito distintas, mas que foram colocadas no mesmo balaio. Com isso, esquecemos aqueles que já estavam aqui na terra como os índios que, na verdade, são os primeiros gaúchos. Se tem alguém que pode ser chamado de gaúcho é o caingangue, e o estereótipo do gaúcho sobre a questão de ser gaudério e de usar boleadeira veio dos charruas e minuanos. No entanto, não tem alguém que possa falar pelos dois, pois já foram exterminados. Por isso, precisamos mostrar essa pluralidade dentro do Estado com os alemães, italianos, japoneses, negros, índios.

2 O Informativo do Vale - O mudou sobre as questões indígenas ao longo dos anos?

Silvestrin - Não mudou muita coisa se compararmos com o ano do descobrimento do Brasil, em 1500. Hoje sabemos que ainda está em curso o massacre dos indígenas e a retirada de direitos conquistados a muitas duras penas. Uma das tentativas foi no ano de 1911, com marechal Rondon, que, a partir de uma ideia positivista, pretendia criar uma instituição de defesa aos índios. Mas os problemas que vivenciavam naquela época estão até mais agudos, pelo modelo de desenvolvimento econômico neoliberal. Como hoje acontecem os mesmos fatos, é lamentável. Aqui no Estado, temos costume de matá-los aos poucos com uma reintegração de posse, um inquérito contra uma liderança e uma discriminação. Essas formas são tão cruéis e tão subjetivas que a gente passa a ver como algo natural, pois os antepassados que vieram da Europa tinham essa mentalidade para conquistar a terra. Então, esse processo se arrasta há séculos. e fica cada vez mais difícil para os indígenas terem representatividade.

3 O Informativo do Vale - O que terá que ser feito para mudar o cenário?

Silvestrin - Desde o começo, deveriam ter sido resguardadas as questões constitucionais para os índios, como o direito à vida, de estarem blindados à tortura e a qualquer tipo de discriminação. Se fossem respeitados os direitos mínimos e básicos das populações indígenas, posso assegurar que elas estariam melhores. Como possibilidade de mudança, aposto nas comunidades jovens indígenas que estão cada vez mais se instrumentalizando dos nossos conhecimentos para defender seus direitos. Não acredito em mudança de pensamento da sociedade tão rápida, porque são 30 gerações com a mentalidade de que o índio tem que ser exterminado. A luta não vai terminar tão cedo. Costumo dizer que o último Dia do Índio foi em 19 de abril de 1500, depois nenhum dia mais foi. A data é comemorada pelos caingangue como um momento de luta e conscientização para as comunidades externas conhecerem um pouco da cultura e se apropriarem um pouco desse conhecimento. Eles trazem questões de como é ser indígena hoje e ao longo dos 518 anos. Hoje, a data ainda é de muita luta, porque eles vendem seu artesanato para colocarem comida na mesa e ainda são muito discriminados. No Dia da Igualdade Racial, em materiais públicos oficiais, ele não aparece, por exemplo. O índio ainda é visto como uma figura que não contribuiu para a formação da história.

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