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De Kyoto a Curitiba

CB, Opinião, p. 21
Autor: FONTOURA, Jorge
08 de Abr de 2006

De Kyoto a Curitiba

Jorge Fontoura
Doutor em direito, é vice-presidente do Centro de Estudos de Direito Internacional (Cedi)

As conferências mundiais MOP 3 e COP 8, das Nações Unidas, sobre biossegurança e biodiversidade, que se realizaram há pouco no Brasil, transportaram, por alguns dias, Curitiba e todo o seu imaginário para as grandes questões ambientais da macropolítica internacional.
Valiosa oportunidade para exibir a cidade e todo seu acervo de qualidades urbanas a mais de centena de delegações presentes, os meetings de fundo ecológico se realizam em cenário distinto daquele que compõe a imagem internacional do Brasil. Somos, principalmente aos olhos do Primeiro Mundo, país exótico e de belezas naturais, porém afogado em dilemas endêmicos de subdesenvolvimento e atraso. Logo, em comércio e política, parceiro de confiabilidade relativa. Sabemos, todavia, que o Brasil, hoje o quarto contendor em número de causas na Organização Mundial do Comércio, atrás apenas dos norte-americanos, canadenses e europeus considerados como bloco econômico, não é apenas o que vê ou quer ver o olhar dos outros. Possuidor de economia densa e diversificada, ainda que atrelada à burocracia estatal perversa e predadora, o país de excelência na OMC é profundamente distinto do retratado na imagem externa. No que concerne ao meio ambiente, a escolha do Brasil para sediar recorrentes conferências, desde os primeiros anos 90, revela a ambigüidade de sermos vilões e heróis da mesma saga.
Agora, biodiversidade e biosegurança alimentar e transgenia se inserem nas agendas da hora, em cerca de 25 hectares por minuto, a redundar em 13 milhões de hectares por ano. Caso os governos estejam efetivamente empenhados em contribuir para mudar o quadro, será fundamental a adoção de regime internacional integrado por múltiplos tratados, desde que adotados com efetividade e eficácia.
Vale, no momento, lembrar, a par dos resultados pouco alentadores das duas semanas de negociações recém-findas, do valioso precedente do superaquecimento global e do Protocolo de Kyoto. Não obstante todos os ingentes esforços da comunidade internacional, visando a estabelecer metas para a redução da emissão de gases de efeito estufa, a ausência ou a desistência em participar do compromisso por parte de expressivos países megapoluidores, como é o caso dos Estados Unidos, impede o sucesso da proposta. Trata-se de exemplo notável de norma internacional efetiva, porque formalmente adotada por alguns, mas não eficaz, pela ausência de resultados práticos decorrente da não-adesão dos maiores poluidores.
Em recente matéria de capa da Economist, ao lamentar o descaso de alguns países em relação ao superaquecimento terrestre, o opiniático semanário norte-americano lembrava que a modelar cidade japonesa de Kyoto havia indiretamente se associado a grande fiasco de política internacional, e que provavelmente se arrependia de ter sediado a 3ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas, em 1997. Agora, com as emblemáticas conferências da ONU em Curitiba, é de esperar que delas resultem compromissos jurídicos efetivos e eficazes.Não seria bom, a exemplo de Kyoto, Curitiba estar perpetuamente associada à história de mais uma grande frustração.

CB, 08/04/2006, Opinião, p. 21

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