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Da tribo ao mestrado. Trajetória do índio Pankararu

Vida Universitária n. 149, p.10
31 de Jul de 2004

Da tribo ao mestrado. Trajetória do índio Pankararu

Paulo Celso de Oliveira - Pankararu cursa Mestrado em Direito Econômico e Social na PUCPR. "O Brasil precisa concentrar esforços em duas frentes: promover o desenvolvimento econômico sustentável e investir na educação e saúde", receita. "De imediato, deve-se priorizar a solução de conflitos sociais e garantir investimentos para atividades produtivas. Isso só se consegue com diálogo e reestruturação de órgãos públicos e da sociedade. A par disso, são necessários fiscalização e combate às atividades lesivas ao meio ambiente, invasões de terras, garimpos clandestinos, desmatamentos e queimadas", adiciona.

Vida na tribo e na cidade
Paulo de Oliveira, 33 anos, é um dos 6 mil indígenas Pankararu que habitam a região de São Francisco, município de Tacaratu, PE. Ele morou com parentes até completar 15 anos, quando partiu para estudar. Sempre se interessou por história, cultura e preservação dos imbuzeiros, muricizeiros e ouricurizeiros, árvores que produzem frutos utilizados na alimentação e festejos.
Durante a Constituinte, em 1988, participou de reuniões com lideranças indígenas, em Brasília. Formou-se em Direito em 1994, pela Universidade Católica de Goiás. A partir de março de 2004, reside em Curitiba, dedicando-se praticamente o tempo todo ao Mestrado. "Estou aprimorando conhecimentos sobre a proteção dos direitos humanos e interesses difusos e coletivos, nos quais se incluem organização social, usos, costumes e terras indígenas. Qualidade de vida pressupõe preservação do meio ambiente", insiste.

Futuro está traçado
Depois de concluir o Mestrado, Paulo Celso atuará no campo do, desenvolvimento econômico sustentável dos povos indígenas. Segundo ele, as organizações e lideranças indígenas consideram que diante das pressões e invasões de terra já não é possível a proteção de seus territórios e do meio ambiente apenas com seus recursos. "A população indígena e suas demandas vêm crescendo. Em contrapartida, os recursos estão ficando cada vez mais escassos, e as comunidades começam a viver em situação precária", alerta.
"Diante dessas calamidades, as organizações indígenas passaram a atuar em defesa do desenvolvimento econômico sustentável, para promover o bem-estar, respeito aos conhecimentos tradicionais, modo de viver, usos, costumes e tradições, proteção das terras e do meio ambiente."
Números revelam avanços significativos
A Constituição Federal Brasileira de 1988 reconheceu a organização social, os costumes, as línguas, as crenças, as tradições e os direitos originários dos índios. As terras indígenas são destinadas à posse permanente dos índios, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
As comunidades desenvolvem alternativas para a solução de seus problemas e ampliam sua participação no cenário político, por meio da atuação de suas lideranças e organizações e formação de parcerias com o governo, Igreja, ONGs e .universidades. Nas últimas eleições municipais, foram eleitos 93 vereadores indígenas e reelegeu-se o prefeito do município da Bahia da Traição, localizado no litoral da Paraíba.
A partir de 1980, foram criados 33 distritos especiais de saúde indígena, formados 2 mil indígenas para atuar como agentes de saúde, aumentaram de 500 para 5 mil os profissionais que trabalham nesse setor. Há 1666 escolas indígenas, nas quais lecionam 3041 professores indígenas. Mais de 100 mil estudantes indígenas encontram-se matriculados em escolas do ensino fundamental e médio e 1300 fazem cursos de nível superior. Nas últimas duas décadas, formaram-se assessores indígenas de alto nível, incluindo pilotos, advogados, sociólogos, pedagogos, biólogos, enfermeiros, engenheiros florestais e agrônomos. Dez desses formados cursam mestrado e doutorado.

Tamanho do Brasil indígena
"No Brasil, há cerca de 220 povos indígenas, somando uma população de, aproximadamente, 350 mil pessoas, as quais falam 180 línguas. Em um território de 100 milhões de hectares, os povos indígenas estão presentes nas diversas regiões e ecossistemas do país, como a amazônia, mata atlântica, cerrado, pantanal e semi-árido.
Ao longo dos séculos, desenvolveram modos de vida que lhes permitiram manter equilíbrio dos ecossistemas e conhecer variedades de tubérculos, plantas medicinais e frutíferas. Estão preparados para oferecer suas experiências e contribuir para preservar o meio ambiente, os recursos hídricos e a biodiversidade e ajudar a compreender melhor as mudanças climáticas."

Modelo econômico em xeque
"É impossível melhorar a qualidade de vida sem desenvolvimento econômico e social. Porém, o modelo de desenvolvimento atual, a falta de atuação dos órgãos públicos e as atividades ilegais, que causam danos ao ambiente, geram insegurança e colocam em risco a estabilidade social e econômica da sociedade brasileira."
A tudo isso, Paulo acrescenta que a formação dos blocos econômicos regionais, as decisões do Banco Mundial e da Organização Mundial do Comércio - OMC também têm implicações diretas sobre o meio ambiente e o modo de vida dos brasileiros. "Muitos projetos causam impactos diretamente na vida das comunidades e enormes danos ao meio ambiente. Ao mesmo tempo, é desperdiçado montante significativo de recursos públicos em obras que não chegam a ser concluídas", reclama.
Recomendo, ainda, que a população se organize para evitar que a situação continue comprometendo a diversidade sócio-cultural e do meio ambiente. "É incontestável o crescimento do país para gerar renda, empregos e aproveitamento das riquezas, desde que promova o desenvolvimento econômico sustentável, não provoque desestruturação social e reduza o contingente de excluídos", conclui.

Balcão da cidadania
A Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro - Foirn e o Ministério da Justiça firmaram convênios para implementar o projeto Balcão do Cidadania, possibilitando aos indígenas acesso aos órgãos públicos para obter documentação básica: certidão de nascimento carteira de identidade, CPF, título de eleitor e carteira de trabalho.
Vida Universitária - PUC-PR, n.149, jun./jul. 2004, p. 10

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