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Da água para o vinho

O Globo, Opinião, p. 14
26 de Jan de 2015

Da água para o vinho

Tema em discussão: Hidrelétricas na Amazônia

Entre as novas hidrelétricas dos rios Madeira, Tocantins, Xingu, Teles Pires e as que foram construídas pioneiramente na Amazônia há uma gigantesca diferença. De dimensões amazônicas - para se usar uma expressão que faz referência a esse imenso território.
No passado, foram cometidos erros graves, tanto do ponto ambiental como social. Já os novos projetos são concebidos buscando-se colocar as usinas em um contexto de desenvolvimento das regiões que as envolvem, considerando-se as questões sociais, econômicas e ambientais. E nacional, pela contribuição que podem dar para assegurar o fornecimento de eletricidade proveniente de um fonte limpa e renovável. Não é mais possível se pensar em investimentos vultosos, de longo prazo, sem o conceito da sustentabilidade.
Nesse sentido, o projeto da usina de Belo Monte, por exemplo, ficou condicionado a uma série de de compensações, em valores da ordem de R$ 3,6 bilhões, dos quais a maior parte será desembolsada antes mesmo que o aproveitamento hidrelétrico acione a primeira turbina. Situada numa região paupérrima, Belo Monte teve que assumir obras de infraestrutura que deveriam ser de responsabilidade do poder público. Escolas foram construídas ou reformadas, assim como hospitais e postos de saúde. Estradas pavimentadas, redes de água, coleta e tratamento de esgotos - antes inexistentes - vão melhorar consideravelmente a qualidade de vida dos municípios. Somente em Altamira, cinco mil famílias deixaram de viver em palafitas, sempre em situação de risco no período da cheia. A construção da usina criou um mercado para os agricultores locais, movimentou o comércio e aumento significativamente as receitas municipais. E, principalmente, gerou oportunidade de emprego e de qualificação profissional para milhares de pessoas que não tinham perspectiva. Pescadores artesanais, que se viam ameaçados pela construção das barragens e diques, passaram a ser apoiados por centros de pesquisas e vários se tornaram piscicultores.
No rio Tapajós, a proposta de construção de grandes usinas é outra. Depois de prontas, não terão acesso por terra e nem será permitida a formação de núcleos urbanos nas suas proximidades. Com isso, se conseguirá isolar e preservar os parques vizinhos, além proporcionar receitas permanentes para os municípios relativamente distantes, mas em cuja jurisdição geográfica as usinas estarão situadas.
Em Rondônia, a construção das usinas do rio Madeira contribuiu para alavancar a economia do Estado, que cresceu, no período, muito acima da média nacional. Problemas sociais graves, esquecidos pelo país, vieram à tona, pelo interesse que essas obras despertaram na opinião pública, e não só no Brasil. Fábricas de equipamentos, que jamais seriam atraídas para a região, hoje estão instaladas e produzindo na área da Suframa.
Não se pode questionar a construção de hidrelétricas na Amazônia com a visão do passado, porque os conceitos mudaram quase que da água para o vinho. E não é segredo que o país precisa de energia.

O Globo, 26/01/2015, Opinião, p. 14

http://oglobo.globo.com/opiniao/da-agua-para-vinho-15138821

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