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Curió garimpa dólar americano

CB, Brasil, p. 23
05 de Jun de 2004

Curió garimpa dólar americano
Prefeito de Curionópolis negocia empréstimo de US$ 40 milhões para mecanizar extração de ouro em Serra Pelada. Operação desperta suspeitas e provoca muita discussão no Pará

Guilherme Evelin
Da Equipe do Correio

Não há certeza se é farsa ou realidade, mas Serra Pelada pode parar nas mãos de americanos.
Sob o comando do lendário major Sebastião Curió, prefeito de Curionópolis (PA), a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada realiza hoje uma assembléia para decidir sobre uma operação de financiamento de US$ 40 milhões (mais de R$ 120 milhões) para mecanizar o garimpo no entulho da mítica mina de ouro que atraiu milhares de brasileiros para o sul do Pará nos anos 80.
0 empréstimo, segundo carta de intenções assinada em fevereiro pela cooperativa, será concedido por uma empresa especializada em compra e lapidação de pedras preciosas, a Phoenix Gems, sediada no estado de Michigan, nos Estados Unidos. De acordo com o documento, o financiamento servirá para a aquisição de máquinas para a exploração, em parceria entre a empresa americana é a cooperativa de garimpeiros, do ouro existente nos 12 milhões de toneladas de rejeitos das escavações feitas em Serra Pelada. Nem o Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), porém, tem certeza da existência da Phoenix Gems - e a operação de empréstimo já foi considerada ilegal pelo governo federal.
"Nenhuma empresa ou grupo econômico, nacional ou estrangeiro, pode adquirir direitos para fazer exploração em Serra Pelada, sem a análise, a aprovação e a averbação pelo DNPM. Isso é lavra clandestina e o governo não vai tolerá-la", diz o diretor-adjunto do DNPM, João César de Freitas Pinheiro. A titularidade para fins de mineração na área de Serra Pelada pertence à Companhia Vale do Rio Doce e o DNPM assevera que a cooperativa de garimpeiros, controlada por Curió, sequer tem direitos de explorar os rejeitos da mina.
Tensão
Apesar disso, segundo disse Genésio Nunes, diretor-secretário da cooperativa, dez mil pessoas estão sendo mobilizadas para aprovar hoje, no estádio Curiozão, a parceria com a Phoenix. Um clima de tensão se instalou na região porque outras associações de garimpeiros, que não estão sob a influência do prefeito de Curionópolis, também reclamam direitos sobre Serra Pelada.
'Essa empresa americana é de fachada. Esse dinheiro vai servir para a campanha política de Curió, que será candidato à reeleição", denuncia Raimundo Benigno, presidente do Sindicato dos Garimpeiros. "Os rejeitos de Serra Pelada pertencem a quem colocou dinheiro lá ", reclama Pedro Paulo da Silva, coordenador de uma associação de ex-donos de barrancos no garimpo.
O Correio tentou entrevistar ontem à tarde Curió, que se firmou como liderança política no sul do Pará depois de ter liderado os contingentes do Exército que reprimiram a guerrilha do Araguaia na década de 70. Mas na Prefeitura de Curionópolis, a única pessoa a atender o telefone era um vigia.
Entulho
Entre novembro de 2002 e fevereiro de 2003, três líderes de garimpeiros foram assassinados por causa das disputas entre as diferentes associações. Desta vez, os ânimos estão de novo acirrados por uma cláusula incluída na carta de intenções assinada pela cooperativa de garimpeiros com a Phoenix, que prevê que a empresa americana passará a ser titular do entulho, se houver inadimplência no pagamento do empréstimo de US$ 40 milhões.
Estima-se que, em meio aos rejeitos de Serra Pelada, exista uma montanha de ouro, que poderia chegar a 72 toneladas. Em 1991, uma avaliação feita pela empresa Bishimetal Exploration, do grupo japonês Mistubishi, calculou que existe em média seis gramas de ouro fino em cada tonelada de rejeito de Serra Pelada. Para recuperá-los, é necessário investimento em equipamentos de mineração com tecnologia apropriada.
0 governo federal criou um grupo de trabalho interministerial para tentar superar as disputas em torno de Serra Pelada e retomar a atividade de mineração na área, hoje praticamente inexistente. As seis mil pessoas que moram em Serra Pelada vivem basicamente de uma garimpagem pouco lucrativa e que pode ser qualificada de subsistência.

CB, 05/06/2004, Brasil, p. 23

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