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A crise da água

OESP, Economia, p. B2
Autor: MING, Celso
20 de Mar de 2004

A crise da água

Celso Ming

Segunda-feira é o Dia Mundial da Água, outra boa oportunidade para bater no mesmo tambor.
A Grande São Paulo não é a única metrópole tomada pela "crise da água". Um relatório de 2002 do Tribunal de Contas da União (TCU), destinado a apurar a eficiência do governo federal na gestão dos recursos hídricos, mostra que 19 regiões metropolitanas enfrentam sérios problemas de abastecimento: São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Recife, Salvador, Fortaleza, Belém, Curitiba, Porto Alegre, Baixada Santista, Campinas, Florianópolis, Natal, Vitória, Distrito Federal, Londrina, Maringá, Norte-Nordeste Catarinense e Vale do Itajaí. É uma área em que vive um terço da população brasileira, ou 56 milhões de pessoas.
Um dos casos mais graves é o do Recife. O texto-base da Campanha da Fraternidade 2004, cujo tema deste ano é a crise da água, refere-se ao problema de Pernambuco, que enfrenta a mais baixa disponibilidade de água do País, ou de 1,2 mil metros cúbicos anuais por habitante, nível próximo do limite de 1 mil metros cúbicos, abaixo do qual a ONU considera "estresse hídrico".
A cidade do Recife vive um regime de racionamento permanente - são dois dias com água e um sem. A Companhia de Saneamento de Pernambuco (Copesa) fornece apenas 64% da água demandada pela cidade. Outros 21% são obtidos por meio de poços artesianos particulares. Ainda assim, a conta não fecha.
Efeitos perversos - "Há um déficit no fornecimento de 2 metros cúbicos por segundo", explica o professor Waldir Duarte, da Universidade Federal de Pernambuco. A excessiva exploração do aqüífero na região vai provocando dois efeitos perversos: salinização da água e redução no volume do lençol freático.
O Distrito Federal é outra região-problema: a disponibilidade de água é de apenas 1,5 mil metros cúbicos anuais por habitante, pouco superior à do Recife. Por enquanto, não há racionamento. Mas o professor Oscar Cordeiro Neto, da Faculdade de Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Brasília (UNB), alerta para o fato de que os níveis de consumo na região são insustentáveis diante das atuais disponibilidades. Como a renda per capita em Brasília é alta, o consumo de água é elevado para os padrões brasileiros.
São 250 litros diários por pessoa. Apenas para comparar, em São Paulo não passa de 160 litros por habitante por dia.
Conforme mostra o relatório do TCU, a Companhia de Saneamento do Distrito Federal (Caesb) avalia que o reservatório de Descoberto, que abastece 65% da população do Distrito Federal, "corre grande perigo devido ao aumento do número de moradores ao seu redor".
A Caesb prevê que, mantendo-se o atual crescimento populacional de 2,66% ao ano, "a capacidade de abastecimento da cidade estará esgotada até 2007".
Desequilíbrio - O professor Aldo Rebouças, do Instituto de Estudos Avançados da USP (IEA), adverte que, na raiz da crise, há um erro histórico: o de que até agora ninguém pensou em gastar melhor. "A gestão dos recursos sempre foi feita do ponto vista da ampliação da oferta, e não de um gerenciamento adequado da demanda."
Rebouças argumenta que essa filosofia foi a principal responsável pela ineficiência das companhias de saneamento no combate ao desperdício e às perdas, entendidas estas como a diferença entre o que distribuído e o que é faturado.
O estudo do TCU vai na mesma linha: "A gestão dos recursos hídricos sempre se pautou na idéia de que possuímos o recurso em abundância. Resulta disso o estímulo ao desperdício e ao mau uso da água, uma das causas dos problemas enfrentados por diversas localidades."
Segundo o TCU, das 27 companhias de saneamento brasileiras, 9 apresentam índices de perda superiores a 50% e duas, a Caema, do Maranhão, e a Sanemat, do Mato Grosso, índices próximos a 70%. O mesmo estudo esclarece que não são aceitáveis perdas superiores a 30%.
Outra conseqüência da ênfase desequilibrada no gerenciamento da oferta é a falta de preocupação com a qualidade. São os casos do reservatório de Descoberto (DF) e da Represa de Guarapiranga, em São Paulo, cujo custo do tratamento é seis vezes superior ao de outros reservatórios da Região Metropolitana.
E mais um dado dramático: 80% do esgoto produzido no País não recebe nenhum tipo de tratamento.
Estados onde mais falta água
Disponibilidade em m3/hab/ano
PE 1.270 RN 1.654
PB 1.394 AL 1.692
DF 1.555 RJ 2.189
SE 1.625 SP 2.209
Fonte Texto Base - Campanha da Fraternidade

Com Danilo Vivan

OESP, 20/03/2004, Economia, p. B2

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