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Cresce risco para 300 ameaçados no Pará, avalia bispo

OESP, Nacional, p. A14
09 de Mai de 2008

Cresce risco para 300 ameaçados no Pará, avalia bispo
Avaliação é de que absolvição de acusado de ser mandante da morte de irmã Dorothy agrava quadro no Estado

Moacir Assunção

Trezentas pessoas, entre religiosos, líderes sindicais e de movimentos sociais, estão sob ameaça de morte no interior do Pará por denunciarem crimes como grilagem, extração ilegal de madeira e exploração de mulheres. O número foi levado ao Conselho de Defesa dos Direitos das Pessoas Humanas (CDDPH), órgão da Secretaria Especial dos Direitos Humanos da Presidência da República, por três bispos que também integram a lista de jurados de morte no Estado - onde foi assassinada há três anos a irmã Dorothy Stang.

A situação, de acordo com eles, tende a se complicar mais com a absolvição, na última terça, do fazendeiro Vitalmiro Bastos Moura, o Bida, acusado de ser o mandante da morte da freira.

Segundo o bispo de Marajó, d. José Luiz Azcona, ele mesmo sob ameaça, o governo do Pará, apesar de ter conhecimento da situação, não tomou providências para enfrentar o problema. "Ora, se existem 300 pessoas marcadas para morrer, há uma sociedade doente, pobre e moribunda", criticou. Ele recusou proteção oficial, mas o bispo de Altamira e Xingu, d. Erwin Krautler, anda constantemente com dois policiais militares desde que começaram as ameaças contra sua vida.

Além deles, recebem ligações ameaçadoras o bispo d. Flavio Giovanelle e o padre de Anapu - cidade em que Dorothy foi morta -, José Amaro Lopes. Segundo os religiosos, as ameaças são feitas pelo que chamam de consórcio do crime, formado por gente poderosa, acostumada a abusar da violência contra a população humilde.

A governadora do Estado, Ana Júlia Carepa (PT), disse, em nota, que reconhece uma lista de 60 pessoas supostamente ameaçadas de morte, protegidas por 80 policiais militares. Na próxima segunda-feira, uma comissão de representantes da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) se reunirá com Ana Júlia para discutir a questão. O coordenador do programa de proteção a defensores dos direitos humanos da secretaria, Fernando Matos, também se surpreendeu com o número. Uma "força-tarefa" formada pela secretaria estará no Pará nos dias 19 e 20 deste mês.

'Absolvição mancha a imagem do Brasil no exterior', diz Lula

Vannildo Mendes e Carlos Mendes

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, "mancha a imagem do Brasil no exterior" e "levanta dúvidas" sobre o julgamento.

Bida havia sido acusado de encomendar o assassinato da freira Dorothy Stang. Ela foi assassinada a tiros em fevereiro de 2005, em Anapu, sul do Pará, onde desenvolvia trabalho missionário junto a comunidades rurais. Lula disse esperar que a sentença seja revista.

No primeiro julgamento, em maio de 2007, Bida foi condenado a 30 anos de prisão, como mandante do crime. Na terça-feira, em novo julgamento, ele foi absolvido pelo Tribunal do Júri de Belém. A decisão revoltou a família da religiosa e entidades de direitos humanos.

Mesmo frisando que, como presidente da República, não poderia "dar palpite", Lula criticou a decisão. "Como brasileiro e como cidadão comum, obviamente que estou indignado com o resultado."

O promotor de Justiça Edson Cardoso de Souza protocolou ontem recurso de apelação para levar o fazendeiro a um terceiro julgamento. "A decisão dos jurados contrariou as provas dos autos no caso do Bida", afirmou.

Para Greenpeace, decisão reforça fama de 'terra sem lei'

Patrícia Campos Mello e Jamil Chade

Entidades de direitos humanos e ambientalistas protestaram ontem contra a absolvição de Vitalmiro Bastos Moura. "É uma vitória da impunidade", disse Scott Paul, diretor do Greenpeace. "Isso contribui para a reputação de 'terra sem lei' do Pará."

A freira Joan Krimm, amiga de Dorothy Stang, se disse chocada. "Mais uma vez a Justiça perdeu. E não se trata só de Dorothy, há mais de 800 mandantes soltos" disse Joan, que viveu 10 anos no Brasil. "Não sei se o governo se dá conta, mas não são apenas as freiras e a família de Dorothy - todo o mundo está assistindo a essa injustiça."

Em Genebra, ativistas de direitos humanos pediram a intervenção da ONU. "Isso é uma loucura", disse Julie de Rivero, da ONG Human Rights Watch, referindo-se à absolvição de Bida.

A ONU informou que vai estudar como reagir. Uma medida pode ser pedir ao governo explicações formais. Outra pode ser recriminar a atitude do júri.

O relator da ONU para assassinatos sumários, Philip Alston, concluiu sua investigação sobre o Brasil. O relatório ainda não é público, mas, segundo pessoas que o leram, conclui que o Judiciário é falho e há corrupção e considera preocupante a ação de pistoleiros na proteção de latifundiários.

OESP, 09/05/2008, Nacional, p. A14

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