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CR Almeida: MP pede anulação de registro de terras

O Liberal-Belém-PA
21 de Mar de 2003

O procurador da República Felício Pontes Júnior pediu ao juiz federal de Santarém, Nelson Loureiro, a nulidade e cancelamento da matrícula, transcrições e averbações no registro de imóveis do Cartório Moreira de 4,7 milhões de hectares em favor da empresa Indústria, Comércio, Exportação e Navegação do Xingu Ltda (Incenxil), pertencente ao grupo CR Almeida. Na semana passada, quatro procuradores federais - o próprio Felício Júnior, Ubiratan Cazetta, José Augusto Potiguar e André Menezes - denunciaram sete envolvidos no caso, acusando a todos de falsidade ideológica e, alguns, de sonegação de impostos.

"Dentro dessas terras há uma grandiosa área da União Federal, como reservas indígenas, floresta nacional e projetos de assentamento do Incra registrados irregularmente em nome dos réus", afirma Felício Pontes no pedido ao juiz. Ao requerer a antecipação da tutela para o cancelamento do registro em cartório das terras, ele sustenta haver "farta comprovação da ilegalidade dos registros imobiliários". E argumenta "fundado receio de difícil reparação em virtude da possibilidade de transferência ou alienação da área". O pedido, observa o procurador, foi acolhido pelo então juiz da 2a Vara Cível de Altamira, José Torquato de Alencar.

Tutela - Com a remessa dos autos para a Justiça Federal de Santarém, depois de a juíza da 2ª Vara Cível de Altamira, Danielle de Cássia Silveira Buhrnhein, ter reconhecido a incompetência absoluta do juízo daquela comarca para julgar a causa, o Ministério Público Federal reafirma ao juiz Nelson Loureiro o pedido de antecipação da tutela e requer a ratificação da decisão da juíza de Altamira com a determinação de cumprimento da medida pelo Cartório Moreira.

Felício Pontes Júnior disse a O LIBERAL que a tentativa do MPF sempre foi a de deslocar o processo para a Justiça Federal. "Com essa providência assegurada, passamos agora para o segundo objetivo: restabelecer o bloqueio de registro do imóvel para que não possa ser negociado de forma nenhuma".

Apostando na celeridade do julgamento do caso, o procurador acredita que a Justiça Federal de Santarém terá uma solução até o final do ano, voltando os 4,7 milhões de hectares ao patrimônio do Estado do Pará e da União. "Sobre esse imóvel incidem cinco áreas federais. Basta que uma delas seja reconhecida pela Justiça Federal para que o título de propriedade seja julgado nulo definitivamente".

Recupera - O procurador federal se arrisca a dizer que seja talvez impossível existir no Pará um latifúndio de 4 milhões de hectares de área contínua. "Ele fatalmente atingirá uma área do Estado ou da União, como área de várzea, terreno de marinha, gleba do Incra etc., ou até mesmo a sede de um município".

Com o trabalho da Procuradoria da República no Pará contra a grilagem de terras públicas, Felício Pontes disse que mais de 10 milhões de hectares já tiveram seus registros anulados em cartórios do Estado. Isso, porém, não basta. É necessário continuar atacando de frente o problema. Este ano, uma das áreas prioritárias é Porto do Moz, onde há um grande foco de grilagem por parte de madeireiros que pode desencadear conflito com a população ribeirinha.

Empresa diz que terras lhe pertencem

Em agosto do ano passado, Cecílio do Rêgo Almeida e seu genro, Marco Antônio Cassou, presidente e diretor do grupo CR Almeida, além do advogado Eduardo Toledo, estiveram na sede do jornal "O Estado de São Paulo" para contestar informações que envolviam o nome da organização com a grilagem de terras. Segundo eles, a CR Almeida possui 7 milhões de hectares de florestas na região dos rios Iriri, Curuá e Xingu, no Pará, adquiridas através da compra de cotas da Indústria, Comércio e Exportação e Navegação do Xingu Ltda (Incenxil), cujos antigos proprietários - Umbelino José de Oliveira Filho e Sebastião Lúcio de Oliveira - haviam hipotecado as terras junto ao Banco do Pará.

Em relação às acusações de grilagem de terras e sobreposição das fazendas de propriedade da CR Almeida com terras públicas de reservas indígenas, reservas florestais, núcleos de colonização e zona militar, eles apresentaram vários documentos, como relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito da Câmara Federal destinada a investigar a ocupação de terras públicas na região amazônica (CPI da Grilagem), onde se concluiu que "não incide sobre a Fazenda Curuá qualquer área de abrangência das Forças Armadas".

Acordo - Ainda de acordo com os documentos da CR Almeida, a "Floresta Nacional de Altamira é posterior à propriedade do Xingu e está inserida dentro dos limites de sua gleba denominada Fazenda Curuá, não havendo conflito de interesses, no que diz respeito ao conceito de propriedade"; a "Incenxil e o Incra encontram-se em adiantado relacionamento jurídico, visando interromper impasses judiciais para definitiva implantação de um projeto de preservação e desenvolvimento ambiental" e "não existem matrículas de reservas indígenas naquela localidade e a matrícula da Fazenda Curuá precede eventuais que venham a ser feitas".

O relatório diz, ainda, que por decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Pará, "as terras são de domínio privado". A empresa também apresentou o relatório final da CPI da Grilagem na Assembléia Legislativa do Estado do Pará, que considerou "ilegítima a pretensão de posse e propriedade da área de terras denominada Fazenda Rio Curuá, com área de 5.694.964 hectares, segundo dados do Iterpa pela empresa Incenxil". A CPI transfere a apuração para o Poder Judiciário, onde o processo está parado desde 1996.

Procuradores rejeitam alegação de filho Roberto Almeida

Um dos sete denunciados à Justiça Federal pelos quatro procuradores da República no Pará, o empresário Roberto Beltrão de Almeida, filho de Cecílio do Rêgo Almeida, comandante do grupo CR Almeida, negou em seu depoimento à Polícia Federal ter participado de forma mais direta das negociações para a aquisição das terras.

Segundo os procuradores, embora tente negar a autoria desse fato, atribuindo-o a seu procurador, Cid Ricardo Furstenberger, isso está estampado no depoimento prestado à Polícia Federal pelo vendedor das terras, o já falecido comerciante de Altamira, Umbelino José de Oliveira. "Em momento algum, Umbelino faz em seu depoimento qualquer referência à pessoa daquele procurador", afirmam os denunciantes.

Tanto Cid Ricardo Regalado Furstenberger quanto sua mulher, Rita Edwiges Padilha Penteado, à epoca da negociação atuavam no escritório da CR Almeida em Belém. Os dois, salientam os quatro representantes do Ministério Público Federal, em momentos anteriores à efetivação do negócio, "agiram como mandatários de Cecílio do Rêgo Almeida, levando a cabo negociações preliminares".

A participação do casal nessas negociações, observam os procuradores, está indicada nos depoimentos à PF da servidora da Funai, Edna Miranda Ferreira, do próprio Roberto Beltrão de Almeida e do então presidente do Iterpa, Ronaldo Barata. "Após a aquisição das terras, atuaram como gerentes operacionais da área, como se constata do depoimento de José Inácio Sobrinho, representante do grupo CR Almeida no Pará".

Jurídico - Ao fazer a denúncia contra outros envolvidos no caso, os procuradores dizem que em relação a Cid Ricardo e Rita Edwiges " não há nos presentes autos elementos que autorizem a conclusão no sentido de que tenham agido com dolo em relação à falsidade ideológica de que se ressentiu o trespasse da Fazenda Curuá". Acrescentam que ambos não eram à época dirigentes de nenhuma das empresas do grupo CR Almeida e nem integravam a área jurídica da organização.

"Estiveram em Belém, pouco tempo antes da alienação, representando Cecílio para efeito de mera consulta junto ao Iterpa. Não participaram dos atos concretizadores do negócio e, ainda que se afirme, à vista do exposto, que tenham tomado parte nas tratativas, é perfeitamente possível que tenham incorrido em erro de tipo, provocado pelos interessados no negócio ou, ainda que dolosa sua conduta, fosse inexigível conduta diversa. Em qualquer caso, excluída está, em princípio, a justa causa para a ação". O MPF, porém, se reserva ao direito de aditar a presente denúncia em relação a essas pessoas "caso, no decorrer da instrução, surjam novos elementos de convicção".

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