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Contrabando ameaça peixes da Amazônia

O Estado de São Paulo
Autor: Edson Luiz
11 de Fev de 2001

Pescadas ilegalmente, 15 mil toneladas de várias espécies vão para a Colômbia anualmente.

Em aproximadamente 15 anos, peixes como o surubim, caparari, jaú e a piramutaba podem desaparecer dos rios da Amazônia, principalmente na Bacia do Solimões. A cada ano, 15 mil toneladas dessas espécies estão sendo contrabandeadas para a Colômbia e depois reexportadas para a Europa e Estados Unidos. Grandes frigoríficos colombianos estão financiando os ribeirinhos, que encontram na atividade ilegal a única alternativa de sobrevivência.

"Dezenas de caminhões encostam nos portos brasileiros e depois levam o peixe para Letícia, na Colômbia, como se nada estivesse acontecendo", denuncia o pesquisador Hiroshi Noda, vice-diretor do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa). "Os preferidos são os bagres."

A denúncia do pesquisador foi confirmada pelos fiscais do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), que fizeram grandes apreensões de peixe, no ano passado, posteriormente distribuídos para entidades filantrópicas. Os próprios funcionários do Ibama, porém, reconhecem que sem alternativa, os ribeirinhos, principalmente do Alto Solimões, ficam nas mãos dos contrabandistas de peixe. "Mas, infelizmente, isso levará algumas espécies a desaparecerem em 10 a 15 anos", diz o chefe da fiscalização do órgão, José Lerlande Barroso.

Hoje, em torno de 72% da população ribeirinha do Alto Solimões vive da pesca, mas grande parte já aderiu ao contrabando, por ter um comprador seguro para o pescado. "Os colombianos financiam câmaras frigoríficas para essas pessoas, facilitando tudo", afirma Lerlande. O Ibama e a Polícia Federal suspeitam que o contrabando de peixe pode ser uma fachada para lavagem de dinheiro do narcotráfico. Mas, além de tudo, o contrabando tira da população às margens dos rios a maior fonte de proteína.

"A forte pressão sobre os recursos pesqueiros na calha central e nos lagos de várzea, cuja demanda aumentará consideravelmente, diminuirá uma fonte de proteína animal de baixo custo", afirma o sociólogo Samuel Benchimol, um dos maiores especialistas em Amazônia e meio ambiente no País. Num ensaio feito para o Centro de Estudos Estratégicos do Ministério da Ciência e Tecnologia, Benchimol alerta: "A pesca predatória poderá provocar fome no interior e eliminar a possibilidade de sobrevivência da sociedade cabocla."
Um levantamento preliminar feito pela fiscalização do Ibama em conjunto com a PF identificou que os peixes preferidos pelos contrabandistas são o surubim, capararí, jaú, piraíba, pirarara, piramutaba e o peixe-lenha. Cada tonelada é vendida a R$ 300,00, ou simplesmente trocada por alimentos. "Os compradores chegam a pagar adiantado para garantir que o ribeirinho não se arrependerá do negócio", informa um fiscal do Ibama que teme uma ação na área, em razão dos grupos que estão por trás do contrabando. "Se não forem do narcotráfico, são pessoas perigosas do mesmo jeito."

Diversos pequenos frigoríficos foram instalados nas regiões ribeirinhas de rios situados próximo dos municípios de Tabatinga, São Paulo de Olivença, Santo Antônio do Içá, Fonte Boa e Manacapuru. Todos eles na Bacia do Solimões. "Se colocarmos uma barreira no rio, com certeza eles encontram outra forma de fazer contrabando. Ali é uma fronteira aberta", diz Lerlande Barroso. Na semana passada, somente no barco colombiano Dom Carmelo, a PF e o Ibama apreenderam 6 toneladas de surubim.

Quelônios - Além do peixe, o Ibama identificou um extenso tráfico de tartarugas e tracajás. Somente nos últimos dez anos, 600 mil espécies foram apreendidas e devolvidas ao seu hábitat natural. "Esse é um problema sério, porque não sabemos a origem das tartarugas. Corremos sempre o risco de levá-las para um local de onde elas não são naturais e provocar um desequilíbrio genético", diz o chefe da fiscalização do Ibama.

Mas o problema mais sério, causado principalmente pela falta de alternativa para a população ribeirinha, é a venda indiscriminada de carne de jacaré.

Por causa do preço baixo - cerca de R$ 3,00 - , o animal é trocado por açúcar, sal, leite em pó ou bebiba alcoólica. "Eles aproveitam a necessidade das pessoas e fazem a troca", explica Barroso.

Se o governo pelo menos tem estatísticas sobre o contrabando de algumas espécies, o mesmo não se pode dizer da biopirataria. Do que sai do Brasil - folhas, insetos ou até lascas de madeira - não se tem idéia. Muito menos do valor disso. "Ninguém sabe o custo disso para o País", afirma o pesquisador do Inpa Charles Clement.

Pelo menos há um mapa imaginário de onde saem as principais espécies. Do Alto Rio Negro (AM), há coleta geral de todos os tipos de espécies de fauna, flora e microrganismo. O mesmo ocorre em Santo Antônio do Içá (AM) e na Serra do Divisor (AC). Em Japurá (AM) há coleta de folhas e terra, além de insetos, enquanto no Rio Abacaxi a coleta maior é de insetos e no Rio Canumã, o contrabando é de borboletas. Nos últimos anos, porém, somente 12 pessoas - todas estrangeiras - foram presas pela prática da biopirataria.
Todas foram liberadas em seguida.

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