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Construção sustentável respeita o ambiente

OESP, Negócios, p. B10
09 de Fev de 2005

Construção sustentável respeita o ambiente
Conceito abraça, na contratação de mão-de-obra, o tema da responsabilidade social

Andrea Vialli

Para muitas pessoas, a idéia de construir de forma integrada ao meio ambiente pode remeter a casebres rústicos no meio do mato, com total renúncia aos confortos da vida moderna. Nada que se aproxime de inovações tecnológicas em reciclagem de materiais, reutilização de água, sistemas combinados de eficiência energética e outras soluções criativas.
Pois é essa imagem que o movimento da construção sustentável quer reverter. E difundir maneiras de construir com menor impacto ambiental e maiores ganhos sociais, sem, contudo, ser inviável economicamente. "De forma geral, pode-se aumentar a sustentabilidade de qualquer empreendimento sem aumento de custos", avalia o professor e pesquisador Vanderley John, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (Poli-USP), e um dos arautos do movimento no Brasil. "As construções planejadas com esse viés podem ser mais caras, por adotarem novas tecnologias que ainda não têm escala. Mas, mesmo assim, trazem benefícios em redução dos custos de manutenção", frisa. John ressalta que o conceito abraça o tema da responsabilidade social e inclui o respeito às normas trabalhistas na contratação de mão-de-obra, a existência de condições adequadas de segurança para os trabalhadores e o uso de materiais de construção produzidos dentro da legalidade. "Sabemos que no Brasil existe a concorrência de uma indústria ilegal de materiais de construção que não paga impostos", observa.
O embrião da construção sustentável foi o conceito de green building, que surgiu na Europa e nos Estados Unidos a partir da década de 1970. Com a crise energética decorrente dos altos preços do petróleo no mercado internacional, os construtores passaram a pensar modos de se construir de forma mais amigável ao ambiente, com uso de fontes alternativas de energia, como a solar. Nos anos 1980, houve o "boom" dos sistemas de avaliação da performance ambiental dos edifícios, o que fortaleceu o movimento.
Após pesquisas de mercado que apontaram o nicho de mercado dos consumidores conscientes, a construtora Setin resolveu apostar num empreendimento com esse perfil. Lançou, em outubro do ano passado, o Mundo Apto, que agrega fundamentos da construção sustentável a um conjunto de residenciais urbanos em São Paulo. Os dez edifícios que serão erguidos terão coleta seletiva dos resíduos e aquecimento de água misto (energia solar e gás), que, segundo a empresa, possibilita uma redução de custos da ordem de 80%, se comparados aos gastos com energia elétrica.
Os edifícios terão ainda sistema de reuso de água - a água dos chuveiros e lavatórios, após tratamento, volta para abastecer os sanitários e as torneiras das áreas comuns. Isso possibilita uma economia de água da ordem de 35% e confirma uma tendência ainda incipiente, mas já identificada em cidades que sofrem com problemas de abastecimento. E tudo isso não custa mais caro para o consumidor, garante Antonio Setin, presidente da Setin. "Um empreendimento com viés sustentável tem investimento de 5% a mais, que acaba sendo amortizado com a economia nos custos operacionais", diz.
Para Setin, construir de modo sustentável "tem um valor social muito grande", mas o consumidor não está disposto a pagar a mais por isso. Não obstante o ganho ambiental, os apartamentos do Mundo Apto seguem as tabelas do mercado para dois e três dormitórios e custam a partir de R$ 115 mil. "É uma questão estratégica. Se o projeto sair mais caro, não é sustentável, pois precisa ser viável em um mercado como o brasileiro", avalia o professor e pesquisador Vanderley John, da Poli-USP.
Com proposta diferente, mas conceito semelhante, as construtora Y.Takaoka e JAG lançaram os condomínios de lotes residenciais Gênesis I e II, localizados em uma área remanescente de Mata Atlântica, em Santana do Parnaíba. A boa aceitação do primeiro residencial, lançado em 2002 e entregue no ano passado, levou os construtores a planejar o segundo, cujos lotes estarão prontos em 2006.
A obra foi pensada para causar o menor impacto ambiental. No quesito água, por exemplo, a estação de tratamento que vai operar no Gênesis II terá tratamento em nível terciário, o que garantirá água potável. A rede elétrica e o cabeamento telefônico serão subterrâneos, para evitar a poluição visual. "Não adianta vender o conceito de sustentabilidade sem preocupação com o entorno", explica Marcelo Vespoli Takaoka, diretor-presidente da Y.Takaoka.
A aplicação do conceito de integração e respeito à natureza tornou o condomínio de 15% a 20% mais caro que um empreendimento convencional, por causa dos cuidados em sua construção e número de trabalhadores envolvidos - 300 diretos e 1,1 mil indiretos, durante os 20 meses de execução dos projetos. Mas, segundo Takaoka, o metro quadrado já está valorizando. "Muitos clientes que compraram o metro quadrado a R$ 250 já conseguem um valor de revenda de até R$ 500."
Para colocar o projeto dos residenciais Gênesis em prática, foram necessárias parcerias como a firmada com a Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS) e a Escola Politécnica da USP. A assessoria técnica ajudou a construtora a implementar corredores arbóreo-frutíferos, para conservação da fauna da região. Neles, são plantadas árvores frutíferas, usadas pelos animais tanto para alimentação como para migração.
Foi firmada também parceria com o programa Florestas do Futuro, da Fundação SOS Mata Atlântica. Em 5 anos, serão plantadas voluntariamente 150 mil mudas de árvores nativas nos empreendimentos Gênesis, o que vai garantir a preservação dos recursos hídricos da região. A iniciativa vai demandar cerca de R$ 1,5 milhão em investimentos.

Mercado é incipiente mas tem boas opções
Apesar de não ser comum, não faltarão produtos para quem quer adotar técnicas ecoeficientes ao construir
Andrea Vialli
Embora a sustentabilidade na construção civil ainda seja incipiente no Brasil, não faltam produtos e serviços no mercado para atender a essa demanda. Há soluções para economia de água, como sistemas para reuso, com estações compactas de tratamento de efluentes, além de bacias sanitárias que consomem apenas 6 litros por descarga e arejadores para chuveiros e torneiras.
Há também blocos e tijolos fabricados a partir de resíduos da própria construção, fachadas pré-moldadas que facilitam as reformas e economizam material de construção, telhas de embalagens longa-vida recicladas, cimentos com reduzido teor de calcáreo e madeira com selo de correto manejo florestal.
A construção sustentável propõe uma escolha mais criteriosa dos materiais que serão utilizados nas obras, com minimização dos desperdícios. E inclui compromissos sociais e ambientais que começam na própria indústria, com maior ecoeficiência nos processos.
"Sustentabilidade é produzir com menos consumo de água, energia, desperdício e geração de resíduos e poluição", afirma Paulo Schmalz, presidente da Amanco do Brasil, empresa fabricante de sistemas para construção e saneamento. A Amanco foi pioneira no mercado ao lançar a Akros, caixa acoplada de descarga que lança apenas 6 litros de água quando acionada.
PRÊMIO
Hoje cabe também à indústria descobrir maneiras de incentivar práticas mais sustentáveis de construção. A multinacional suíça Holcim, segunda no mundo na fabricação de cimento, criou em 2003 uma fundação, a Holcim Foundation, e um prêmio para difundir o movimento, o Holcim Awards.
Podem ser inscritos projetos de empreendimentos e reformas de imóveis que tragam a sustentabilidade em sua concepção. A premiação será mundial, com eliminatórias nos cinco continentes e, no final, distribuirá US$ 2 milhões em recursos para os melhores projetos.
O objetivo, além de fomentar o uso de tecnologias limpas na construção civil, é facilitar a disseminação das experiências e a troca de idéias entre especialistas do mundo todo.
A iniciativa não é voltada apenas para construtores privados. "Queremos estimular as prefeituras e governos a inscreverem projetos de saneamento e revitalização de áreas urbanas", explica Carlos Eduardo Garrocho de Almeida, diretor comercial e de relações externas da Holcim do Brasil.
As inscrições podem ser feitas até 31 de março exclusivamente pelo site www.holcimawards.org. A eliminatória brasileira será realizada em outubro, no Rio, "em um edifício sustentável ainda a ser definido", afirma Carlos Eduardo Almeida.

OESP, 09/02/2005, Negócios, p. B10

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