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A construção do futuro sustentável

O Globo, Opinião, p. 7
Autor: FONSECA, Sergio Bueno da
05 de Ago de 2005

A construção do futuro sustentável

Sergio Bueno da Fonseca

Em 1992, no Rio de Janeiro, o mundo começou a descobrir que tinha limite. Um limite que compromete a própria existência da espécie humana. A palavra "sustentabilidade" começou a freqüentar as rodas de conversas. Não podemos esgotar o mundo e entregarmos para as gerações futuras um deserto poluído. Crescer é fundamental, mas com a inteligência de percebermos os limites da Terra.
A Agenda Global para construção de um desenvolvimento sustentável ampliado e progressivo no limiar do século XXI, conhecida como Agenda 21, foi assinada em 1992 por 179 chefes de Estado e de governo, transformando-se na grande contribuição da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada no Rio de Janeiro - a Rio 92.
Signatário do documento global, o Brasil iniciou em 1997 o processo de construção da Agenda 21 brasileira com a escolha de seis áreas temáticas: agricultura sustentável; cidades sustentáveis; infra-estrutura e integração regional; gestão de recursos naturais; redução das desigualdades sociais e ciência e tecnologia para o desenvolvimento sustentável.
Em 2003 é ampliada a Comissão de Políticas de Desenvolvimento Sustentável e da Agenda 21 brasileira (CPDS), que de forma paritária representa a comunhão entre o governo federal e a sociedade civil executando uma agenda de compromissos com o Brasil do futuro. Esses compromissos se materializaram em um programa inserido no Plano Plurianual de Governo - PPA 2004/2007, que é um norteador do Orçamento da União para o período.
O ano de 2005 começa com a Polícia Federal prendendo madeireiros, com o assassinato da Irmã Dorothy, com a devastação da Floresta Amazônica com tratores e incêndios criminosos. Parece que o Brasil Insustentável está vencendo a luta e impondo sua agenda de futuro.
Por outro lado, o grande avanço proposto pelo Programa do PPA 2004-2007 Agenda 21 é de natureza conceitual e vem se consolidando nos últimos anos com o entendimento da amplitude do desenvolvimento sustentável.
Josué de Castro, médico e humanista brasileiro, afirma em seu livro "Geopolítica da fome" que só existe um tipo de desenvolvimento, o desenvolvimento do homem. Indira Gandhi, em seu pronunciamento na Conferência de Estocolmo, em 1972, declarava: "O maior inimigo do meio ambiente é a miséria."
O desenvolvimento só será sustentável no mundo, no Brasil ou na sua cidade, se baseado em outra matriz econômica, cultural e social. Hoje o padrão de consumo é ditado a partir de 20% da população mundial que vive nos países mais ricos e que consome 89% de tudo o que é produzido pela Humanidade. Esse padrão é altamente desperdiçador, gerando volumes insustentáveis de lixo. A grande questão não é política, nem tampouco ideológica, é simplesmente factual: o mundo não dispõe de recursos naturais suficientes para manter esse padrão de consumo no futuro. Se não mudarmos o padrão, esgotaremos os recursos do planeta, comprometendo a nossa sobrevivência.
A insustentabilidade é subproduto da concentração mundial da riqueza. Hoje, a diferença entre ricos e pobres não encontra paralelo na História da Humanidade. No Relatório da ONU de 1999 sobre Consumo e Consumo Sustentável, temos os seguintes dados alarmantes:
1 - As 258 pessoas mais ricas do mundo são donas de 45% da renda mundial;
2 - As 3 pessoas mais ricas do mundo têm mais dinheiro que o PIB dos 48 países mais pobres;
3 - 1 bilhão de pessoas no mundo vivem abaixo da linha de pobreza.
O maior inimigo da Agenda 21 e do Desenvolvimento Sustentável são a ignorância, a falta de informação, a apatia e o descrédito, frutos da não-cidadania. Para mudarmos este paradigma econômico, esta matriz cultural e este modelo social que cria a insustentabilidade do crescimento que vivemos, temos de conquistar corações e mentes, provando que um outro mundo é possível.
Não somos os primeiros a habitar este planeta, mas o que nos diferencia das gerações passadas é que cabe a nós a garantia do futuro.

Sergio Bueno da Fonseca é coordenador da Agenda 21 - Secretaria de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável do Ministério do Meio Ambiente.

O Globo, 05/08/2005, Opinião, p. 7

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