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Conhecimento dos recursos genéticos contribui para manutenção da biodiversidade amazônica

Gazeta Mercantil Norte- Belém-PA
Autor: Silvia Fujiyoshi
19 de Fev de 2002

A biodiversidade amazônica pode ser comprometida mesmo com a aplicação de sistemas de manejo florestal, inclusive em áreas certificadas, se não houver conhecimento dos recursos genéticos de cada espécie e sua respectiva dinâmica de reprodução. A afirmação é do pesquisador Milton Kanashiro, coordenador do projeto Dendrogene - Conservação Genética em Florestas Manejadas na Amazônia, feita ontem, durante a abertura de um workshop que termina hoje com o objetivo de indicar novos critérios de manejo para a exploração madeireira.
Estão reunidos no evento pesquisadores, ecologistas, certificadores, técnicos do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e empresários. A proposta do evento é de confrontar os diversos critérios de manejo florestal concebidos pelos participantes do workshop para construir um modelo único e, também, chegar a propor novos indicadores. Tanto o evento quanto o projeto Dendrogene são conduzidos pela Embrapa Amazônia Oriental, contando com várias parcerias institucionais e empresariais.
As informações básicas sobre a ecologia da reprodução e os recursos genéticos de cada espécie madeireira são fundamentais para respaldar os indicadores específicos do manejo florestal. A distância de vôo dos polinizadores entre as espécies, os períodos de florescimento e frutificação, o índice de reprodutividade e a própria forma de reprodução devem ser levantados para garantir a conservação da variabilidade das espécies.
Conforme Milton Kanashiro, a redução da variabilidade das espécies implica em menores chances da espécie se adaptar às mudanças naturais ao longo do tempo. Isso resultaria, primeiro, na perda da biodiversidade florestal, e, depois, no enfraquecimento das próprias espécies remanescentes. `A exploração madeireira pode vir a interromper os processos reprodutivos das espécies, causar a redução da variabilidade genética e, a longo prazo, as espécies podem deixar de se adaptar a certas situações climáticas`, comenta.
O projeto Dendrogene busca avaliar os impactos da exploração madeireira manejada sobre os recursos genéticos florestais, simulando o comportamento de algumas espécies madeireiras de amostra por meio de informações genéticas. Os experimentos estão acontecendo há dois anos em cerca de 500 hectares da Floresta Nacional do Tapajós, no município de Belterra, com recursos da ordem de R$ 12 milhões investidos pela Embrapa e o Departamento do Governo Britânico para o Desenvolvimento (DFID).
Base de dados
O primeiro produto a ser gerado pelo Dendrogene é uma base de dados, com informações biológicas e ecológicas de alguns grupos de espécies, que estará disponível na internet ainda este ano. A base de dados deverá suprir a falta de informações genéticas, que tem sido uma das principais limitações para que os indicadores dos critérios de manejo florestal sejam consistentes e realmente colaborem para a sustentabilidade da floresta.
A partir dos experimentos do Dendrogene também deverá ser adaptado para as características amazônicas um software de auxílio ao planejamento de manejo florestal, baseado no conhecimento sobre os recursos genéticos e a dinâmica de reprodução. Hoje, o software só é disponível especificamente para florestas temperadas. Essa ferramenta informatizada deverá ser complementada com fichas detalhadas sobre as espécies para observação e identificação adequada.
As pesquisas também estão acontecendo nas localidades de Moju, no campus experimental da Embrapa, e em Paragominas, na área da empresa madeireira Cikel Brasil Verde S/A. Em Moju, a Embrapa realiza levantamentos detalhados sobre a flora de uma área de um hectare para a promover atividades de educação ambiental futuramente. Em Paragominas, a área da Cikel serve também para levantamentos botânicos.
No próximo ano a área da Floresta Nacional do Tapajós começará a ser explorada para analisar o comportamento das espécies antes e após a exploração. As pesquisas do Dendrogene deverão prosseguir até 2005. Segundo o chefe geral da Embrapa Amazônia Oriental, Adilson Serrão, o Dendrogene é um projeto de grande qualidade científica, envolvendo cerca de 20 parceiros institucionais e empresariais. `O Dendrogene pode ser insumo para respaldar políticas públicas e ajustar a legislação de manejo florestal`, afirma.
Aprimorar critérios de manejo
`A floresta é muito diversificada e complexa. Não se pode adotar uma regra geral de manejo e exploração. Trata-se do manejo florestal por espécie`, destaca Tasso Azevedo, do Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora). Segundo ele, o conhecimento sobre como as espécies funcionam é o `coração do manejo florestal` para a garantia da conservação da biodiversidade das espécies.
A certificação é um processo de validação social de que o manejo florestal está acontecendo de forma ambientalmente adequada, economicamente viável e socialmente justa. Mas, a certificação do manejo não é uma garantia de sustentabilidade, mas sim um esforço para reduzir os riscos de impactos sobre a biodiversidade florestal. Assim, lembra Azevedo, os critérios de certificação devem ser aprimorados constantemente.
Segundo o técnico do Ibama do Pará, José Ribamar Costa, desde que foi revogada a Instrução Normativa 15 não está em vigor qualquer critério de avaliação dos planos de manejo. Mas, `os levantamentos do Dendrogene, com os aspectos dos recursos genéticos na escolha das espécies a serem exploradas, deverão ser trazidos para a legislação ambiental`, destaca.
Conforme o engenheiro florestal Alcir Almeida, gerente florestal da Cikel Brasil Verde S/A, as pesquisas sobre as condições genéticas e reprodutivas das espécies florestais poderão vir a indicar novos ciclos de corte, mais longos ou mais curtos. Hoje, o ciclo de corte pré-fixado é de 30 anos para todas as espécies. Também o corte, que hoje é permitido para todas as espécies com tronco com 45 centímetros de diâmetro em diante, pode ser reavaliado conforme os processos de desenvolvimento de cada espécie.
Para o chefe geral da Embrapa Amazônia Oriental, Adilson Serrão, o projeto Dendrogene é uma resposta aos compromissos assumidos pelo País e pela Amazônia em relação à Agenda 21 para o uso e conservação da biodiversidade e de seus recursos genéticos. De acordo com o coordenador do Dendrogene, Milton Kanashiro, pesquisas sobre o uso medicinal das espécies florestais da Amazônia também estão sendo realizadas já como diretriz do Ministério da Saúde para a inserção de plantas medicinais em tratamentos do Sistema Único de Saúde (SUS).

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