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Como ter um consumo sustentável?

O Globo, Economia, p. 42
27 de Nov de 2011

Como ter um consumo sustentável?
Especialistas dizem que é preciso mudar hábitos e cobrar ações das empresas e do governo

Nadja Sampaio
nadja@oglobo.com.br
Luiza Xavier
luiza.xavier@oglobo.com.br

RIO - Consciência ambiental, sustentabilidade, uso racional dos recursos naturais. À primeira vista, esses termos podem parecer estranhos ao universo da defesa dos direitos do consumidor. A verdade, porém, é que a relação entre a preservação do meio ambiente e o consumo está cada vez mais estreita. Especialistas observam que, para diminuir a poluição do planeta, é preciso mudar os hábitos e incorporá-los ao dia a dia, de forma que a nova prática atinja a família, o trabalho e outros ambientes. Nesta penúltima reportagem da série para marcar os 30 anos da Defesa do Consumidor, comemorados no último dia 25, vamos mostrar que essa preocupação com o futuro do planeta começa com mudanças cotidianas e deve chegar à cobrança de uma nova postura das empresas e do governo.
Lisa Gunn, coordenadora-executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), ressalta que desde a Rio-92 ficou claro que os nossos principais problemas socioambientais são derivados dos atuais padrões de consumo. Para que haja sustentabilidade no planeta é preciso que os hábitos sejam mudados, não adianta tomar atitudes esporádicas:
- Para que haja mudança significativa é preciso que todos sejam responsáveis e façam a sua parte, o consumidor, as empresas e o governo - afirma a coordenadora do Idec.
'Os atuais padrões de consumo são insustentáveis', afirma Lisa
Lisa salienta que, além de separar o lixo orgânico do seco, é preciso cobrar a coleta seletiva:
- Os atuais padrões de consumo são insustentáveis. Se todo mundo tiver um carro, as cidades ficarão intransitáveis. Por outro lado, é preciso ter um sistema de transporte de massa eficiente para que se possa abrir mão do carro. Ainda assim, o ideal é que se pesquise e se escolha um carro que seja mais econômico e tenha menos emissão de poluentes.
Na opinião de Lisa, mesmo que a Política Nacional de Resíduos Sólidos ainda não esteja regulamentada, os consumidores devem cobrar das empresas maior rapidez na implementação dessas políticas.
A estudante de publicidade Natalie Amendola aprendeu, ainda na escola, como se tornar uma consumidora consciente. Hoje, aos 21 anos, ela é daquelas que se preocupam com o impacto causado pelo setor produtivo sobre a sociedade e o meio ambiente.
- No colégio onde estudei havia palestras e reuniões sobre reciclagem, uso racional da energia e da água. Desde aquela época me interesso por esses temas, e hoje considero-me uma consumidora consciente. Penso, reflito antes de entrar numa loja - conta ela, que afirma já ter deixado de comprar roupas de uma marca depois que a fábrica foi acusada de utilizar na produção empregados em situação análoga à escravidão:
- Não sou radical, mas dou preferência aos produtos de boas empresas. Na alimentação, tento comprar sempre orgânicos produzidos por pequenos agricultores.
Natalie, que mora com a família, separa o lixo doméstico e o leva até uma cooperativa perto de sua casa:
- Sinto-me meio isolada em casa, Só minha mãe me apoia. Meus irmãos, mais novos, ainda não têm essa preocupação. Ter essas atitudes dá trabalho, é mais fácil fazer como os outros, jogar o lixo sem separar.
A coordenadora institucional da Pro Teste Associação de Consumidores, Maria Inês Dolci, observa que é preciso incorporar novos hábitos:
- O consumo sustentável abrange tudo. É preciso pensar nisso desde a hora em que se acorda, economizando água, luz, telefone. Comprando menos detergentes e levando a sacola para o supermercado. Não comprar o que pode não usar para não ter desperdício. Tem que começar em casa e fazer sempre. Não se muda da noite para o dia, é preciso ir incorporando, ampliando as ações e dando exemplos para outros grupos, como trabalho, vizinhança.
Para o ator Max Fercondini, o interesse pelo tema meio ambiente aumentou quando ele se tornou apresentador do programa "Globo Ecologia". Hoje, ele se considera um consumidor mais consciente:
- O programa me dá bastante acesso a informações e pesquisas sobre o assunto. Leio muito a respeito. Não faço apologia, mas temas como mudanças climáticas costumam vir à tona nas rodas de amigos. Tenho alertado muito as pessoas sobre o uso excessivo da água. E também de produtos descartáveis. Deixei de usar aparelhos de barbear feitos de plástico.
Otimista quanto à ampliação do consumo consciente e responsável, Fercondini destaca que as empresas estão muito lentas para atender a uma demanda que cresce a cada dia.
Atitudes como as da professora de geografia Aline Magalhães - que costuma se deslocar de bicicleta pela cidade, evitando veículos poluentes -revelam que, se não se apressarem, as empresas poderão perder uma grande oportunidade de conquistar clientes fiéis, que fazem questão de se associar a marcas que primam pela qualidade e responsabilidade social:
- A postura das empresas em relação à sociedade e ao meio ambiente influencia totalmente minhas decisões de compra. Já deixei de consumir fast-food e produtos de empresas que não respeitam os trabalhadores. Estou sempre pesquisando na internet sobre isso. Prefiro produtos orgânicos e evito até copo descartável, levo uma caneca para o trabalho. Precisamos compreender que os recursos naturais são finitos.
Nem todas as inovações valem a pena, afirma advogado
Professor do curso de Direito Ambiental da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (UniRio) e presidente da Comissão de Meio Ambiente do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), Paulo Bessa, ressalta que as iniciativas de consumidores que buscam ser sustentáveis, como a reciclagem do lixo, são válidas e importantes. Entretanto, ressalta que é preciso estar atento para não acabar se dedicando a ações sem efeito.
- A reciclagem é importante, porém mais importante é diminuir a geração de resíduos, porque, muitas vezes, a própria reciclagem também consome muita energia - diz o advogado.
Segundo ele, a volta das sacolas para compras e das garrafas de vidro retornáveis revela que muitos produtos do passado eram menos nocivos ao meio ambiente.
- O que mostra que não é só porque é novo que é melhor. Precisamos ver quais são as inovações que valem a pena.

O Globo, 27/11/2011, Economia, p. 42

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