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Combate a escravidao comeca na sala de aula

CB, Brasil, p.7
25 de Jul de 2005

Combate à escravidão começa na sala de aula
Comissão Pastoral da Terra lança em escolas do Maranhão e do Piauí uma campanha de prevenção ao aliciamento de mão-de-obra
Paloma Oliveto
Nas escolas do Piauí e do Maranhão, discutir o trabalho análogo à escravidão é tão importante quanto estudar Português e Matemática. A inclusão do tema na salas de aula foi a forma que o movimento da Igreja Católica Comissão Pastoral da Terra (CPT) encontrou para prevenir o aliciamento nos dois estados brasileiros que mais exportam mão-de-obra escrava para o resto do país. Com a campanha De olho para não virar escravo”, a expectativa dos agentes da pastoral é que os jovens levem para as famílias informações suficientes para evitar que seus pais saiam de casa rumo às senzalas modernas. No Brasil, 25 mil pessoas estão sujeitas à servidão por dívida, segundo a Organização Internacional do Trabalho.
Agricultores miseráveis são o principal alvo dos gatos”, como são chamados os aliciadores que atuam para fazendeiros. Enganados com promessas de emprego em outros estados, os trabalhadores são levados para as propriedades rurais, onde descobrem que já estão endividados por causa da viagem. Outras formas de mantê-los presos são a retenção de documentos e o uso de seguranças armados nas saídas da fazenda.
Para erradicar o trabalho escravo seria necessário atingir suas causas profundas, decorrentes do modelo de desenvolvimento que opta pela monocultura de exportação. Enquanto a reforma agrária não é efetivada, temos que buscar outros caminhos, como a prevenção”, diz o frei Xavier Plasat, um dos coordenadores da campanha da CPT. Voluntários, os professores sensibilizados pelo enfrentamento do trabalho escravo não apenas cedem as escolas para a realização de seminários e exibição de vídeos, mas dão continuidade ao debate abordando o tema em diversas disciplinas.
Segundo a coordenadora de Erradicação do Trabalho Escravo no Maranhão, Marta Bispo, apesar de nova, a experiência já apresenta resultados positivos. Os alunos estão se mostrando interessados e mais esclarecidos”, afirma. Ela também se empolga com a adesão de estudantes universitários e da comunidade à rede de enfrentamento. Mas lamenta que algumas secretarias municipais de Educação não tenham o mesmo empenho. É uma causa comprometedora; as pessoas, infelizmente, têm medo”, diz. No estado, a campanha acontece em 20 escolas.
O Piauí conta com uma rede de 50 professores capacitados pela CPT e pela organização não-governamental (Ong) Repórter Brasil para trabalharem o tema na sala de aula. Uma das estratégias foi montar, junto com os estudantes, um dicionário com verbetes ligados ao trabalho escravo. Também há atividades artísticas, como dança, jogral, teatro, música e poesia. Com a ajuda dos professores, os estudantes se tornam os promotores do diálogo com a família e a comunidade”, diz Antônio Carvalho, coordenador regional da CPT. Por enquanto, o programa atende aos municípios de União, Miguel Alves e Barras.
Abordar as vítimas em potencial do trabalho escravo é uma tarefa que leva tempo e requer paciência. Segundo os agentes da CPT, não é fácil convencer pessoas que estão passando fome a desconsiderar as propostas feitas pelos gatos”. No trabalho de prevenção, além das escolas, a estratégia é buscar essas pessoas nos bares, nos sindicatos de trabalhadores rurais, nas igrejas. A cartilha tem linguagem simples e conta o passo-a-passo do aliciamento. Para atrair a atenção, as informações são impressas em formato de sanfona. Conforme o leitor vai abrindo o material, aparecem quadrinhos explicativos. Também são confeccionados e distribuídos cartazes e calendários.
Com a ajuda de organizações não-governamentais, a CPT realiza seminários para a comunidade, quando são exibidos os vídeos Califórnia Brasileira”, sobre o trabalho nos canaviais, e 13 de março”, que aborda a questão da escravidão. Trabalhadores libertados são convidados a contar suas experiências e, no final, há debates. O próximo encontro vai acontecer na cidade de Codó (MA), no dia 19 de agosto. A expectativa é reunir pelo menos 150 pessoas.

Senzala moderna
25 mil pessoas são mantidas sob condições análogas às de escravidão
2.887 trabalhadores escravos resgatados no ano passado pelas equipes móveis do Ministério do Trabalho e Emprego
633 processos administrativos foram iniciados pela Procuradoria Geral da República entre fevereiro de 2003 e maio de 2004 para verificar denúncias criminais de trabalho escravo
188 empregadores rurais estão na lista suja do Ministério do Trabalho e Emprego, atualizada pela quarta vez este mês

CB, 25/07/2005, p. 7

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