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Com o outubro mais seco em 83 anos, reservatórios do Nordeste estão no limite

OESP, Economia, p. B1, B3
31 de Out de 2012

Com o outubro mais seco em 83 anos, reservatórios do Nordeste estão no limite

RENÉE PEREIRA

Os reservatórios da Região Nordeste estão em estado de alerta. Segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), apresentados durante reunião do Programa Mensal de Operação, o volume de chuva que tem caído nas principais bacias da região é o pior dos últimos 83 anos - o que tem dificultado a recuperação dos reservatórios. Para complicar a situação, nem todas as termoelétricas definidas pelo ONS conseguiram entrar em operação.
Só em outubro, o nível de armazenamento do Nordeste despencou 8,2 pontos porcentuais, de 42,6% para 34,4%, o menor nível desde 2003. Os reservatórios estão apenas 5,8 pontos acima do limite de segurança para o abastecimento do mercado - um mecanismo de alerta criado pelo governo após o racionamento de 2001.
A esperança é que as chuvas de novembro e dezembro sejam mais consistentes e consigam recompor os lagos das hidrelétricas. "A formação do El Niño provocou uma seca muito forte no Nordeste e depreciou o nível dos reservatórios. Mas ele está perdendo força", avalia Paulo Toledo, sócio da comercializadora Ecom Energia. Para ele, é cedo para falar em desabastecimento.
O nível de armazenamento do Nordeste é o pior do País, seguido pelo sistema Sudeste/Centro-Oeste, que recuou quase dez pontos porcentuais em outubro. A maior preocupação é que, embora também esteja numa situação difícil, a região tem enviado energia para suprir a necessidade do Nordeste. Entre os dias 27 e 29, as usinas instaladas no Sudeste e Centro-Oeste contribuíram com 1.120 MW. O Norte mandou 1.048 MW.
Com o consumo em alta e reservatórios em baixa, o intercâmbio foi necessário para cobrir o vácuo deixado por algumas termoelétricas que não entraram em operação. Na semana passada, o ONS determinou que todas as térmicas, movidas a óleo combustível, óleo diesel e carvão, começassem a funcionar para poupar água nos reservatórios. Considerando as usinas a gás, que já estavam em operação, eram mais de 11 mil MW em todo o sistema nacional.
Algumas nem foram acionadas. Outras operaram de forma parcial, abaixo da capacidade. Nos relatórios do ONS, os motivos variam de falta de combustível, menor rendimento das unidades e problemas internos das usinas - possivelmente falta de manutenção. Ou seja, como em 2007, quando foram chamadas para incrementar a geração do sistema, algumas térmicas não estavam preparadas para a produção de energia.
A expectativa é que essas usinas representem um custo para o consumidor de cerca de R$ 500 milhões só em novembro, segundo cálculos da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres. Com o nível dos reservatórios baixos, é possível que elas tenham de continuar gerando por mais tempo.

Cidade baiana está sem chuva há 2 anos
Pior seca dos últimos 50 anos atinge cidades como Ichu e Caém, no interior da Bahia, e provoca perdas de até 80% em algumas culturas

TIAGO DÉCIMO / SALVADOR

O pecuarista Leonardo Oliveira, de 40 anos, conta as horas para a chegada da chuva prevista pela meteorologia na região onde está a fazenda da família, na zona rural do município de Caém, no nordeste baiano, a 333 quilômetros de Salvador. "A previsão é que a estação chuvosa comece nos primeiros dias de novembro", diz. "Só nos resta esperar."
Em Caém, não chove consistentemente há um ano e meio. Em algumas cidades da região, como Ichu, a estiagem já dura dois anos, na pior seca dos últimos 50 anos no centro-norte baiano. Os prejuízos para a pecuária e a agricultura, segundo a Secretaria de Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária do Estado (Seagri), já são contados em bilhões de reais - apesar de não haver um cálculo formal. As perdas chegam a 80% em algumas culturas, como a de mandioca. A produção de sisal teve retração de 60%. A queda na produção de leite é de 30% no Estado.
Oliveira foi um dos poucos criadores de gado da região a não enviar o rebanho a fazendas do sul do Estado, onde outros produtores estão alugando terras abastecidas pela chuva para não permitir a morte precoce dos animais. Sua família confiou que a represa construída no terreno para enfrentar com folga os frequentes problemas de estiagem fosse suficiente para atravessar mais um período de seca.
"O rio (Itapicuru) que abastece a represa secou em julho", conta o pecuarista. "A represa ainda manteve a fazenda em funcionamento até setembro, mas agora secou também. Estamos contratando carros-pipa e comprando palma para hidratar os animais, mas a situação ficou bem crítica, pois eles não têm mais como ser transportados. Só nos resta rezar para que a chuva caia logo."
Na semana passada, começaram as baixas do rebanho, de 130 cabeças. "Já perdemos dez e a maioria está debilitada", conta Oliveira. "Por causa da situação, também tivemos de demitir metade dos trabalhadores, mas temos esperança de recontratá-los quando a situação melhorar."
A situação do gado da fazenda de Oliveira, apesar de grave, pode ser considerada amena quando comparada com a média do nordeste baiano, onde está a chamada região sisaleira, conjunto de 20 cidades nas quais mais da metade da população, de cerca de 500 mil habitantes, mora na zona rural.
Ali, segundo a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado da Bahia (Faeb), os prejuízos na produção de feijão, milho e mamona, mais comuns entre pequenos produtores, chegaram a 100%, e a mortalidade dos rebanhos, a 40%. "Os produtores estão vendendo as matrizes (animais reprodutores) para amenizar as perdas", diz o presidente da entidade, João Martins.
Sem meios para enfrentar a longa estiagem, o governo do Estado apela para ações emergenciais, como envio de carros-pipa e distribuição de cestas básicas para amenizar o sofrimento dos produtores rurais.

Estiagem já atinge 80% de Pernambuco

MONICA BERNARDES / RECIFE , ESPECIAL PARA O ESTADO

A estiagem em Pernambuco, que segundo especialistas do setor é a pior dos últimos 30 anos, já atinge 80% do território estadual. São 115 municípios com estado de emergência reconhecido pela Secretaria Nacional de Defesa Civil. Esse número é ainda maior de acordo com dados da defesa civil local, chegando a 121. A população atingida já ultrapassa 1,18 milhão.
De acordo com a Agência Pernambucana de Águas e Clima (Apac), 80 barragens estão com o nível abaixo do considerado normal para esta época do ano. A situação no sertão é ainda mais preocupante: 80% dos reservatórios secaram completamente.
No dia 26, o governador Eduardo Campos (PSB) encaminhou carta à presidente Dilma Rousseff para pedir agilidade às ações emergenciais da Operação Seca e informar as ações emergenciais adotadas pelo Estado. Em meio a esse turbilhão de números alarmantes, agricultores e pecuaristas lutam para tentar manter vivas as plantações, os rebanhos e a própria esperança. Falta pasto para os animais e os caminhões-pipa têm sido a única forma de abastecimento para grande parte da população.
Do total de municípios em emergência, 59 estão do agreste, 56 no sertão e 6 na zona da mata. Em Carpina, na zona da mata, a 60 quilômetros do Recife, 75% das culturas de feijão, pimentão, jerimum (abóbora), cebola e tomate foram perdidas.
Em Petrolina, no sertão, o polo de fruticultura irrigada também sofre as consequências da seca. Na comunidade de Pereiro, o chão rachou e a vegetação está completamente seca. Os moradores caminham longas distâncias para pegar água. As cisternas são abastecidas por carros-pipa, e os animais estão sem pasto. Só resta um pouco de lama na única barragem da região, que abastece cerca de 200 famílias.

Ceará e Piauí têm a pior seca em décadas

FORTALEZA, TERESINA

Ceará e Piauí enfrentam a pior seca das últimas décadas. O retrato no interior dos Estados é de desolação, com gado morto e safras de milho, feijão e arroz perdidas. Os prejuízos na agricultura dos dois Estados atingem 90% da produção.
No Piauí, o trabalhador rural está sobrevivendo dos programas do governo, como a Bolsa Estiagem, Bolsa Família e Seguro-safra. Eles não têm o que comer e falta água para consumo humano e animal. De 224 municípios, 184 prefeitos do Estado decretaram estado de emergência.
O agricultor Francisco Rufino, de Solonópole, no Ceará, teve de sair do campo e migrar para a cidade para sobreviver com o seguro-safra que recebeu. "Não dava mais para continuar no campo. Não tinha uma gota de água sequer", lamenta.
As pessoas que vivem no semiárido do Piauí dividem os pontos de água com os animais. A água não tem mais qualidade, por causa do baixo nível dos reservatórios. Ela já se mistura ao barro em razão da evaporação natural sob um sol de 40 graus e a coleta é feita pelos populares e pelos carros-pipa.
No município de Caracol, a 605 quilômetros de Teresina, um homem cometeu suicídio. Ele morava na zona rural e teve muitos prejuízos com a seca. "Nos últimos 50 anos, esta é a pior seca nesta região", lembra o frade franciscano Frei Jonecildo da Silva Cruz.
Em Picos, a 306 quilômetros de Teresina, o criador Rovilson Leal Pereira, morador do povoado Angical dos Domingos, resolveu levar o que restava do rebanho para o município de Elesbão Veloso, cerca de 150 quilômetros de distância, para evitar a morte dos animais. "Aqui não tinha pasto para eles porque não choveu. O gado morreria de fome se eu o deixasse aqui."/ LAURIBERTO BRAGA E LUCIANO COELHO, ESPECIAL PARA O ESTADO

OESP, 31/10/2012, Economia, p. B1, B3

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