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Com 0,4% da área do planeta, cidades emitem 75% do gás

OESP, Vida, p. A14
11 de Jan de 2007

Com 0,4% da área do planeta, cidades emitem 75% do gás
Em 2008, mais pessoas viverão em zonas urbanas do que em rurais; ONG analisa impactos

Cristina Amorim

Em algum momento de 2008, a humanidade ultrapassará uma barreira histórica: pela primeira vez mais pessoas viverão em zonas urbanas do que rurais. O marco é um lembrete de que as cidades precisam se adaptar a esta realidade e repensar sua estrutura e funcionalidade, ou o planeta não dará conta de alimentá-las.

O Instituto Worldwatch, com sede em Washington, nos Estados Unidos, mostra o tamanho do problema em seu relatório Estado do Mundo 2007: Nosso futuro urbano. Hoje as cidades ocupam apenas 0,4% da superfície do planeta. Não obstante, são responsáveis pela emissão direta e indireta de 75% dos gases do efeito estufa.

Alimentar tantas bocas e sustentar o estilo de vida urbano têm um preço alto. Não à toa a maioria desta emissão vem dos países ricos, porém a quota do grupo em desenvolvimento cresce rapidamente e se avoluma. Isso porque, em 2030, 4 de 5 habitantes de cidades estarão num destes países, e haverá 500 milhões a mais de pessoas vivendo em favelas.

Todos precisarão de comida, transporte e casa. Se atualmente a construção e a manutenção de prédios já responde por mais de 40% do consumo de energia, não é preciso ser um gênio em matemática para perceber que esta estrutura não vai se manter por muito tempo. 'Cidades que não mudarem em dez anos enfrentarão um desastre', diz o arquiteto Jaime Lerner, ex-governador do Paraná, que escreveu um prefácio do relatório.

AR LIMPO

Devido às hidrelétricas, o Brasil tem uma base energética mais limpa do que a de outros países - que obtêm energia da queima de combustíveis fósseis, como o carvão. Porém, isso não significa que as cidades brasileiras estejam livres de responsabilidade pelo efeito estufa, que provoca o aquecimento global.

Uma fonte urbana direta são os carros. Ainda que a tecnologia flex seja um sucesso do mercado nacional, o consumo de combustíveis renováveis - tal qual o álcool retirado da cana ou o biodiesel, como aposta o presidente Luiz Inácio Lula da Silva - ainda deixa a desejar.

O melhor dos mundos, defende Lerner, é deixar o carro em casa, o que só é possível quando a cidade é adaptada para que seus habitantes prefiram o transporte público rápido e menos poluente.

O sistema viário urbano que implantou em Curitiba foi adotado com sucesso em Bogotá, na Colômbia, e está sendo atualmente replicado em outras grandes cidades, como Los Angeles, nos Estados Unidos, e Pequim, na China. 'Em menos de três anos, qualquer cidade do mundo pode melhorar seu sistema de mobilidade.'

COLAPSO

A emissão de gases-estufa, que se concentram na atmosfera em níveis recordes, é apenas um sintoma de que urbanóides consomem os recursos naturais num ritmo difícil de ser compensado pelo ciclo natural. Impedir o colapso dessas estruturas exigirá modelos sustentáveis de urbanização, com o uso de novos materiais, economia de estruturas e redistribuição de espaços.

Para o presidente do instituto, Christopher Flavin, é exatamente isso que está em jogo: a capacidade de os ecossistemas fornecerem os alimentos, a madeira, a água e a estabilidade climática que sustentam as cidades. 'Nosso desafio é evitar o destino das grandes cidades maias, abandonadas não apenas por causa da pressão em suas fronteiras mas também devido ao colapso das terras cultiváveis e das fontes de água ao redor, após séculos de superexploração.'

O futuro, neste caso, está próximo. O aquecimento global provocará mudanças climáticas em níveis perigosos já nos próximos anos, como deve demonstrar em fevereiro o novo relatório da ONU sobre o assunto.

O instituto lembra que, das 33 cidades do mundo que terão pelo menos 8 milhões de habitantes em 2015, pelo menos 21 delas se encontram em regiões costeiras. Elas precisarão montar estruturas especiais para evitar uma inundação esperada pelo aumento do nível dos oceanos, causado pelo derretimento do gelo no Ártico.

Os países ricos têm trabalhado em planos para lidar com tais situações, mas não as nações em desenvolvimento. Há iniciativas isoladas, mas pouco dinheiro e pouca organização para colocá-las em prática. O mesmo pode-se dizer em relação ao estilo de vida urbano, carente de mudanças significativas.

'Em relação ao câmbio climático, o mundo vive a perplexidade. Este é o pior estado que existe. Há a visão de que as coisas precisam ser mudadas, mas ninguém sabe o que fazer', afirma Lerner. 'É preciso entender que sustentabilidade é a equação entre o que se poupa e o que se desperdiça.'

OESP, 11/01/2007, Vida, p. A14

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