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Coleta seletiva ineficiente joga pelo lixo até R$ 749 milhões por ano

OESP, Metrópole, p. C1
05 de Jun de 2010

Coleta seletiva ineficiente joga pelo lixo até R$ 749 milhões por ano
Cálculo feito pelo Ipea a pedido do 'Estado' leva em conta prejuízos para a indústria e para os cofres públicos e os danos ambientais

Bruno Paes Manso

A ineficiência da política de coleta seletiva feita pela Prefeitura em São Paulo e o transbordo de materiais recicláveis para aterros sanitários causam prejuízos anuais de até R$ 749 milhões para a sociedade. As perdas ocorrem principalmente por causa dos custos adicionais nas indústrias pelo uso de material virgem em vez de reciclado, dos danos ambientais e de gastos de orçamento público com a destinação final de lixos em aterros.
Todo ano, São Paulo manda mais de 1 milhão de toneladas de papel, papelão, plástico, aço, vidro e alumínio misturado ao lixo convencional, em vez de enviar esse material para a reciclagem. Em tempos de economia aquecida, o consumo das famílias aumenta e, por consequência, o descarte de embalagens. Como as atuais 16 centrais de triagem da Prefeitura já não dão conta do material coletado, a tendência é que esse desperdício cresça.
Os cálculos de quanto dinheiro a sociedade perde por São Paulo não conseguir organizar uma coleta seletiva de qualidade foram feitos pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a pedido do Estado. "As contas são conservadoras. Não levamos em consideração as perdas sociais e não somamos alguns materiais recicláveis porque tivemos dificuldade em obter dados. As perdas são certamente maiores", afirma o pesquisador do Ipea Jorge Hargrave, autor do estudo.
Gargalo. São Paulo recicla mensalmente cerca de 3,1 mil toneladas de lixo, o que corresponde a apenas 1% do lixo produzido na cidade. A título de comparação, em Estocolmo, na Suécia, o sistema de coleta seletiva consegue reciclar 25% do lixo produzido pela população.
O principal gargalo no sistema de coletas em São Paulo nos dias de hoje é a quantidade insuficiente de centrais de triagem, que selecionam o lixo separado pelos moradores e vendem o material para as empresas.
Contêineres. O processo de reciclagem em São Paulo se inicia na separação do lixo feita pelos habitantes. O grosso do material vai para 5.118 contêineres espalhados em apartamentos, condomínios, praças e prédios públicos ou para as ruas e avenidas por onde passam os caminhões da coleta seletiva oficial. O lixo reciclado é recolhido por 20 caminhões dos consórcios Ecourbis e Loga Ambiental, que também fazem a coleta de lixo doméstico comum, levado aos aterros sanitários.
Os caminhões descarregam o material em 16 centrais de triagens espalhadas pela cidade. Essas centrais, formadas por cooperativas de catadores que comercializam o lixo com as empresas, são tocadas por ex-moradores de rua.
De acordo com a política municipal do setor, criada por lei em 2003, na gestão Marta Suplicy (2001-2004), deveriam ser construídas 31 centrais de triagem em todas as subprefeituras até 2007, já na gestão iniciada por José Serra e concluída pelo atual prefeito, Gilberto Kassab.
Atrasos. As obras estavam previstas no novo contrato de coleta de lixo, que entrou em vigor em 2005. Um ano antes, já existiam 14 centrais. Hoje, passados seis anos, apenas duas novas triagens foram entregues pela Prefeitura. No cronograma das concessionárias de lixo, as obras estarão concluídas só em 2015.
A falta de centrais de triagem escancarou a crise no sistema de coleta seletiva em São Paulo. Atualmente, as centrais não conseguem mais receber todo o lixo separado pela população. Como resultado, os caminhões de coleta seletiva percorrem diversas centrais antes de conseguir descarregar o lixo.
Nas regiões sul e leste de São Paulo, a Ecourbis deixa de coletar cerca de 10% do lixo separado pelos munícipes. Os sacos que permanecem na rua acabam sendo coletados no dia seguinte pelos caminhões tradicionais e são jogados em aterros comuns, desperdiçando material que ainda teria valor econômico.

Lá tem

Barcelona, Espanha
A população separa o lixo e deposita os sacos em lixeiras conectadas a uma rede subterrânea de tubos, a 5 metros de profundidade. O sistema suga a vácuo o material, de hora em hora, durante o dia e à noite. O lixo segue por um canal e chega até uma central de seleção fora da cidade. O lixo orgânico segue para um sistema de produção de energia. A intenção é acabar com a coleta por caminhões em cinco anos.

Nova York, EUA
O lixo é divido em comum, papel, plástico e alumínio e colocado em sacos ou latas identificados para receber o material. Multas são aplicadas a condomínios e residências que erram na separação. Existe uma lista detalhada e explicativa disponível à população. Em saco transparente com etiqueta verde, por exemplo, jogam-se jornais, revistas, catálogos, papéis em geral, correspondências, listas telefônicas, livro de capa mole, sacos de papel, papelão e embalagens feitas com esse material, que devem ser desmontadas e amarradas.

Estocolmo, Suécia
Sistema semelhante ao de Barcelona. Os moradores separam o lixo (papel, alumínio, vidro e orgânico) em recipientes específicos, que sugam o material por canos que percorrem o subterrâneo do bairro até depósitos de coleta. Lá, os caminhões recolhem o material também por meio de sugadores a vácuo.

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100605/not_imp561866,0.php

Cronograma atrasado prejudica inclusão de catadores de lixo
Cada central de triagem da Prefeitura emprega cerca de 60 pessoas, com renda média de [br]R$ 900 por mês

Além de causar o desperdício de pelo menos 3,1 mil toneladas mensais de produtos que poderiam ser reciclados, o descumprimento da lei municipal de 2003 - que determina a criação de 31 centrais de triagens nas Subprefeituras da cidade - impede que ex-moradores de rua obtenham renda mensal que, somada, chegaria a R$ 810 mil.
Cada central de triagem emprega em média 60 trabalhadores, que recebem cerca de R$ 900 por mês. Os empregados fazem parte de cooperativas de catadores, formadas quase integralmente por ex-moradores de rua que coletavam material reciclável de forma autônoma, como fonte de obter renda.
A Coopere do centro emprega cem funcionários e, neste mês, cada um deles recebeu R$ 1,1 mil com a venda de lixo reciclável.
Metade do material vem dos caminhões da limpeza urbana. A outra parte é retirada em quatro caminhões gaiola fornecidos pela Prefeitura. Metade dos funcionários tem mais de 50 anos e todos viviam em situação de rua, a maior parte dormindo em albergues da cidade. Sete deles são soropositivos.
"Não existe hoje melhor política social para ajudar a retirar moradores das ruas do que as cooperativas de triagem", explica Rene Ivo, fundador da Coopere e coordenador do Grupo de Trabalho da Coleta Seletiva Solidária do Centro Gaspar Garcia. "Empregamos um ex-morador de rua que tinha cinco diplomas de cursos oferecidos pelo Município, como vidraceiro e eletricista. Aprenderam o ofício, mas não foi suficiente para garantir trabalho."
Verba. Os custos para a construção de uma central de triagem são estimados em R$ 900 mil - entre construção do galpão e compra de equipamentos. Estão programados R$ 6 milhões de recursos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para a construção de dez galpões. A verba não saiu porque a Prefeitura está definindo as áreas para a instalação desses prédios. Quatro já foram aprovadas: na Lapa, no Ipiranga, em Aricanduva e em Santo Amaro. O restante deve ser feito pelos consórcios, cuja previsão de conclusão das obras é 2015. /B.P.M.

http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20100605/not_imp561880,0.php

OESP, 05/06/2010, Metrópole, p. C1

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