VOLTAR

Ciro defende transposicao do Sao Francisco

FSP, Ciencia, p.A14
19 de Jul de 2005

Ministro da Integração Nacional participa de reunião científica anual para argumentar em favor de projeto polêmico
Ciro defende transposição do São Francisco
Ricardo Banalume Neto
Teve bate-boca e saia-justa, aplausos e vaias para todo lado. O ministro Ciro Gomes, da Integração Nacional, defendeu o polêmico projeto de transposição de águas do rio São Francisco -que ele chama de "integração de bacias hidrográficas"- para um auditório repleto na 57ª reunião anual da SBPC (Associação Brasileira para o Progresso da Ciência).
"Várias pessoas me aconselharam a não vir", disse o ministro. Não só porque o tema desperta grandes paixões no Nordeste, o que se notou pela explosiva reação da platéia em vários momentos, mas também por causa da atual crise política. Ciro também teve de defender o governo do presidente Lula.
O ministro defendeu que a troca do nome do projeto não é um mero artifício "marquetológico". "É um projeto de segurança hídrica para 12 milhões de nordestinos", afirmou Ciro. "Não acaba com a seca, que é um fenômeno natural, nem resolve todos os problemas."
Ele lembra que o projeto foi modificado desde que foi concebido, incorporando críticas feitas por opositores. A idéia, resumidamente, consiste na construção de dois canais para levar água do São Francisco para regiões mais ao norte da região. Originariamente se cogitou retirar água do rio a uma vazão de 300 metros cúbicos por segundo. Depois se reduziu a vazão para 63 metros cúbicos por segundo, e agora o projeto prevê apenas 26 metros cúbicos por segundo, somente para consumo humano e animal. O projeto também prevê agora o uso do excesso de água em caso de a barragem da usina de Sobradinho vertê-la.
"Isso é só 1,4% da vazão mínima na foz do rio", diz o ministro. Seriam construídos 720 km de canais, em dois eixos (norte e leste), e se prevê que cerca de 1.000 km de rios secos da região se tornariam perenes.
Segundo o ministro, o projeto está em processo de licitação, e no próximo dia 28 deverão ser abertas as propostas das construtoras para os 14 lotes da obra, que duraria 24 meses. O projeto total inclui também estações elevatórias e pequenas hidroelétricas, a um custo de cerca de R$ 4,5 bilhões.
Problemas do rio
Ciro diz que muitas das críticas ao projeto vêm por conta dos vários problemas do rio em seus 2.700 km. O São Francisco está "ferrado", repetiu várias vezes. Foram destruídas 95% das suas matas ciliares, ele está em boa parte assoreado, recebe esgoto de 250 cidades e lixo de outras 170 e possui um trecho onde ocorre transmissão de esquistossomose.
Segundo o ministro, o padrão mínimo de acesso à água foi estabelecido pela ONU como sendo de 1.500 metros cúbicos por habitante por ano. Na área da bacia do São Francisco o índice é de 4.500 metros cúbicos, e apenas 450 na área de influência do projeto.
Ele chamou de argumentos "egoístas, mas respeitáveis" aqueles feitos por opositores do projeto que dizem que a água deveria ser usada nos Estados de origem.
"Um governo de quatro anos ficou dois anos e meio comprometido com o diálogo", diz ele, lembrando as várias audiências públicas sobre o projeto, uma das quais envolveu até violência pública contra funcionários do Ibama por opositores do projeto.
"Não é verdade", gritou várias vezes a professora da UFBA (Universidade Federal da Bahia) Yvonilde Dantas Pinto Medeiros, membro do Comitê da Bacia Hidrográfica do rio São Francisco.
"Eu tenho provas, tenho vídeos, fotos", respondeu Ciro em meio à balbúrdia de aplausos e vaias.
Yvonilde fez palestra logo depois do ministro. "Não está claro no projeto quem são os reais beneficiários", diz ela, para quem a bacia doadora da água também deve ser compensada. "Não temos conhecimento das reais necessidades dos consumidores."
Para Yvonilde, "esse governo não tem sabido discutir o problema", e seria difícil implantá-lo agora, nesse "momento até de choque de credibilidade".
Apesar da escassez no semi-árido, "o Nordeste é rico em água", diz Aldo Rebouças, da USP. "Sabendo usar não vai faltar."
Já o secretário de Infra-Estrutura Hídrica do ministério de Ciro, Hypérides Pereira de Macêdo, defendeu a transposição como um modo de também aumentar a segurança.em relação ao abastecimento de água na região nordestina. "Bastam quatro rodas, mas ninguém viaja sem um estepe", disse ele. "Esses 26 metros cúbicos por segundo são o estepe."

FSP, 19/07/2005, p. A14

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.