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Cidades ignoram política ambiental

OESP, Vida, p. A24
13 de Dez de 2008

Cidades ignoram política ambiental
Mais de 90% registraram alteração no meio ambiente, mas só 18,7% têm conselho ativo e verba para o setor

Alexandre Rodrigues

Mais de 90% dos municípios do País sofreram impacto de alterações ambientais nos últimos dois anos. Mas sua estrutura para políticas de ambiente ainda não é compatível com a gravidade do diagnóstico. É o que informaram prefeitos e secretários das cidades ao Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que divulgou ontem a Pesquisa de Informações Municipais 2008.

Embora a proporção de cidades com conselhos municipais de ambiente tenha mais do que dobrado na última década - subindo de 21,4% para 47,6% entre 1999 e 2008 -, só 1.880 dos 2.650 órgãos consultivos criados para envolver cidadãos na formulação de políticas fizeram pelo menos uma reunião nos últimos 12 meses. Se for considerado o município com conselho ativo e recurso específico para o setor, só 18,7% se enquadram nesse item. Em pouco mais de 16% há secretaria exclusiva, e a área só conta com 0,8% do total do funcionalismo municipal do País. Apenas um quarto das cidades faz licenciamento de impacto ambiental local.

Queimadas e desmatamento são as duas maiores causas de alterações ambientais freqüentes nos municípios do País. Em 2002, o assoreamento de corpos d'água, que contribui com o transbordamento de rios nas enchentes, tinha sido o impacto mais citado pelos gestores. Esse porcentual permaneceu no patamar de 53% em 2008, mas a inclusão de queimadas e desmatamento na lista fez com que essas duas categorias assumissem a dianteira, com 54,2% e 53,5%, respectivamente. Os Estados do Norte e Nordeste apontaram, proporcionalmente, mais impactos ambientais do que os do Centro-Sul.

Em média, os municípios indicaram 4,4 ocorrências de alguma alteração ambiental impactante e freqüente em 2007 e 2008. Na Região Norte, o desmatamento foi assinalado por 71% das cidades; no Nordeste, por 65%. O mesmo se repete em relação às queimadas. Como conseqüência, queixas de poluição do ar, mais ligada no passado aos grandes pólos industriais, foram mais relatadas por prefeituras da Região Norte (36,3%) do que do Sudeste industrializado (19,2%). Ao condensar os impactos ambientais que os gestores consideraram ter afetado as condições de vida de seus habitantes, as regiões Norte e Nordeste tiveram, proporcionalmente, mais cidades atingidas (24% e 20%, respectivamente) do que Sul (9%) e Sudeste (11%).

A cidade de São Paulo listou dez problemas, entre eles poluição do ar e da água, contaminação do solo e degradação de áreas protegidas. No Estado, o assoreamento de rios, que favorece enchentes, foi apontado por 58,1% das cidades. Em segundo lugar, aparecem as queimadas (50,4%), ligadas ao corte de cana, e a poluição de cursos d'água (34,9%), cujo pior exemplo é o do Rio Tietê.

SISNAMA

De acordo com especialistas, os números mostram que é necessário fortalecer órgãos municipais de ambiente. "Muitos falham em seus objetivos de preservação por não adotarem uma gestão plena, como a responsabilidade pelo licenciamento ambiental. Fica tudo na mão do órgão estadual. Nenhum centavo obtido com a multa de um posto de gasolina irregular, por exemplo, vai para o município", diz Clarismino Luiz Pereira Jr., presidente da Associação Nacional de Órgãos Municipais do Meio Ambiente. Para Mario Mantovani, da SOS Mata Atlântica, é hora de fortalecer o Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama), que unificaria os órgãos federal, estadual e municipal. "Isso garantiria mais verba para resolver os problemas das cidades", diz.

1/3 das cidades tem favelas; entre maiores, só prefeito de Cuiabá nega problema

A Munic também investigou a gestão municipal brasileira para os setores de transporte e habitação, temas ligados ao ambiente. Para captar a percepção dos prefeitos sobre a precariedade das moradias no Brasil, o IBGE perguntou se seus municípios têm favelas. Um terço deles respondeu que sim. Entre os municípios de porte médio (100 mil a 500 mil habitantes), o índice chega a 84,7%.

Já entre as maiores cidades do País, onde as favelas são parte do cotidiano, o resultado só não foi de 100% porque o prefeito de Cuiabá, Wilson Santos (PSDB), disse que a capital mato-grossense, com 600 mil habitantes, não tem favelas. A pergunta foi incluída no questionário sem definição clara, devido à dificuldade que o próprio instituto tem de conceituar aglomerados populacionais irregulares de baixa renda. A idéia era captar como a habitação irregular era vista pelos gestores.

A prefeitura de Cuiabá informou que não classifica as áreas carentes da cidade como favelas porque realiza obras para urbanizar as diversas comunidades que nascem de invasões de terrenos, esse sim um problema assinalado pelo prefeito como existente. "Tem favela sim", contesta Paulo Ávila, líder da Central Única de Favelas de Cuiabá. "Há uma coisa cultural aqui de não chamar de favela, chamam de grilo, por causa das invasões, mas também é pejorativo. Aqui tem comunidades sem asfalto, casas de madeira e gente em condições difíceis. É pouco, mas tem." Assim como Cuiabá, 53,2% das cidades acusaram a presença de loteamentos irregulares, mas nesse grupo também podem entrar condomínios de classe alta em áreas sem licenciamento ou que não correspondem ao projeto original. Em relação ao transporte, cerca de 30% têm serviço de ônibus municipal. Mais de 50% das cidades informaram ter mototáxis e em quase 60% moradores usam vans.

Prefeituras empregam 5 milhões de brasileiros

Cerca de 5% da população economicamente ativa do País recebe salários de prefeituras. A pesquisa Munic do IBGE identificou, neste ano, a continuidade da expansão do funcionalismo municipal, mas em ritmo menos acelerado. São 5 milhões de pessoas na administração municipal direta e indireta, incluindo empresas e fundações - aumento de 2,1% em relação a 2006. Nas pesquisas anteriores, o crescimento verificado em apenas um ano tinha sido maior: 5,4% entre 2004 e 2005 e 6,5% entre 2005 e 2006. Considerando os funcionários da administração direta, o crescimento entre 2006 e 2008 foi de 4,6%. O IBGE não contabiliza os terceirizados.

Para Vânia Pacheco, gerente da Munic, a desaceleração pode ser reflexo dos limites impostos pela Lei de Responsabilidade Fiscal. "Temos de considerar também que os municípios estão crescendo e nem sempre contratar é inchar a máquina. Pode ser uma forma de atender às demandas da população." A exigência legal de que aprovados em concursos sejam contratados como estatutários está diminuindo a participação de celetistas (CLT). Em 2004, eram 18,5%. Agora são 11%.

OESP, 13/12/2008, Vida, p. A24

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