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Centro de Curas e Terapias Yawanawá

Kaxiana - http://www.kaxi.com.br/noticias.php?categoria=2
Autor: Joaquim Tashka
27 de Mar de 2009

Era um antigo sonho do meu pai, construir uma casa tradicional Yawanawá, que pudesse servir como um lugar para guardar os materiais sagrados por ele confeccionado, como: as lanças, as flechas e as bordunas sagradas. Lugar onde ele pudesse ensinar a geração mais nova sobre o conhecimento tradicional do povo Yawanawá. Meu pai, Raimundo Tuinkuru, é um grande conhecedor da história, da vida, da liderança, dos costumes, da tradição e da espiritualidade Yawanawá. Aprendeu toda essa sabedoria de seu pai, o grande cacique e líder espiritual Antonio Luis Pekuti.

A cada dia que passava, via que o sonho de meu pai não iria se realizar nesta vida, por motivos de vários compromissos de trabalho e por falta de apóio para construir esta casa. Ele sempre reclamava de que a gente não estava valorizando o grande conhecimento que ele tinha, que ele ia acabar morrendo sem ver seu sonho se tornar realidade. Vi, esse sonho, ainda mais distante, com a divisão interna do povo Yawanawá em duas organizações ano passado. Já que para construir uma casa na dimensão que ele sonhava, necessitava da união e de muita gente trabalhando para construir.

Fui passar a semana do carnaval 2009, na aldeia Mutum. Levei comigo para conhecer o povo Yawanawá, um amigo de longa data, Osmar Coelho. Conheci Osmar em 2001, numa JAM organizado pelo organização norte americana Youth for Environment Sanity - YES, en Los Gatos, nos Estados Unidos. Desde então Osmar tem se tornado um grande amigo e apoiador de nosso trabalho.

Aproveitei esta viagem para reunir todas as 5 comunidades para planejar as atividades do ano de 2009. Durante nosso planejamento que denominamos de Plano Econômico e Social Yawanawá das aldeias Mutum, Tiburcio, Escondido, 7 Estrelas e Matrixã; perguntamos para as 5 lideranças se eles não aceitavam o desafio de construir um Shuvo, como forma de mostrar a união e a força de trabalho das 5 comunidades para deixar um legado aos velhos que mantinha o conhecimento tradicional Yawanawá.

As 5 lideranças presente, aceitaram o desafio de construir o Shuvo, sem nenhum tipo de apoio, apenas com a força de vontade e a coragem. Acordei pela manhã e fui logo marcando o local onde iria construir. Todos me olhavam um pouco desconfiado, se eu não estava louco de querer construir o shuvo do nada em apenas 2 semanas. Também olhava para eles, não acreditando que eles seriam capazes de fazer o trabalho. Após marcar os pontos de onde seriam fincados os esteios de sustentação, fui pra mata retirar as madeiras com um grupo de jovens.

Passei a tarde na mata retirando a madeira, e notei que era muito trabalho, então larguei meus companheiros e voltei antes para aldeia. Mais tarde todos voltaram pra aldeia rindo de mim, dizendo que eu tinha fugido e largado eles na mata, que precisava ficar mais na aldeia para apreender a fazer casa. Disfarcei meu constrangimento e mudamos de assunto para não entrar nos detalhes do meu ponto fraco de um Yawanawá que se criou metade na aldeia e metade na cidade. Naquela mesma tarde tive que baixar pra Tarauacá, onde pegaria um vôo para retornar a Rio Branco.

Outros compromissos do povo Yawanawá
Fiquei essas últimas semanas em Rio Branco cuidando de outros compromissos referente ao povo Yawanawá, que a Associação Sócio Cultural Yawanawá representa. Mesmo estando em Rio Branco, estava muito curioso para saber como estava indo a construção na aldeia. Para minha angústia, o telefone orelhão que fica na aldeia Nova Esperança, havia quebrado. Ficamos sem comunicação total.

Passado duas semanas recebi uma ligação de Tarauacá do Osmar, que tinha vindo a Tarauacá comprar prego e mais umas "mercadorias" para o pessoal da aldeia "fechar" a construção. Eu não podia imaginar o Shuvo pronto. Osmar me passou os detalhes da construção. Não dormi nesta noite.

Infelizmente tive que ficar mais uma semana em Rio Branco, esperando um outro amigo e apoiador do povo Yawanawá, Hylton Philipson e mais um outros amigos, que estavam vindo da Inglaterra visitar o povo Yawanawá. Encontrando com Hylton em Rio Branco, já fui contando detalhes do Shuvo pra ele, como se eu já tivesse visto antes. Subindo o Rio Gregório de barco com Hylton ele me perguntou um detalhe particular do Shuvo, tive que admitir pra ele, que eu pessoalmente não conhecia, que minha expectativa estava muito grande, que eu quase não estava me segurando de tanta curiosidade.

Na volta do rio para chegar na aldeia do Mutum, fechei os olhos e esperei chegar mais próximo para abrir. Finalmente quando percebi que já podia abrir os olhos, não podia acreditar na grandeza daquela construção na minha frente. Melhor ainda foi ver todo mundo em frente cantando pra receber a gente. Foi um das grandes emoções que tive na minha vida.

O Shuvo, que batizamos como Centro Cerimonial de Curas e Terapias Yawanawá, simplesmente é um lugar inacreditável. É uma construção de fazer inveja a qualquer construção moderna. Fiquei maravilhado. Meus amigos visitantes, ficaram perguntando quem tinha sido o arquiteto, falei pra eles que a construção tinha contado com a idéia e o trabalho de todos, que não tinha um arquiteto, mais era um conjunto de idéias e trabalho coletivo.

A parte de baixo mede 20 metros de um lado para outro, espaço suficiente para a comunidade fazer fogo, atar rede, fazer mariri, e fazer cerimônias. A parte de cima tem um assoalho em forma de triangulo, na qual o assoalho é retangular seguindo o contorno das palhas. A visão de cima é espetacular, é possível ver quem está chegando de barco, tanto pela parte de cima e da parte debaixo do rio Gregório. Tudo na sua devido perfeição. Parece uma fortaleza.

Inauguramos o Shuvo com uma noitada de Uni (ayahuasca), dançando e cantando até o amanhecer. Durante a cerimônia, tivemos visões fortíssimas de um recomeço de um novo trabalho, de um novo tempo.

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