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Castanha de baru amplia renda no Cerrado

OESP, Economia, p.B7
26 de Jan de 2004

Castanha de baru amplia renda no Cerrado Trabalho em cooperativa de produtores tornou o produto viável e atraente para o mercado consumidor
PRISCILA NÉRI
Há pouco mais de três anos, os moradores de três Estados do Cerrado brasileiro descobriram que podiam ganhar dinheiro com um fruto nativo pouco conhecido nas grandes capitais: o baru, uma castanha rica em ferro e proteína que brota de uma árvore típica da região. Mas para transformar o baru em uma fonte de renda, essas famílias - formadas por pequenos agricultores, pescadores, guias turísticos, extrativistas e assentados da reforma agrária - precisavam aprimorar suas técnicas de processamento e tornar o produto viável e atraente para o mercado consumidor.
O processo de capacitação das famílias foi encabeçado pelo Centro de Desenvolvimento Agroecológico do Cerrado (Cedac), uma organização não-governamental dedicada a promover o desenvolvimento sustentável do Cerrado. Depois de reuniões com associações locais já existentes, como a Associação de Produtores do Assentamento São Sebastião da Garganta e a Associação de Pescadores e Guias Turísticos de Aruanã, entre outras, o Cedac começou a ministrar cursos para ensinar aos produtores técnicas agrícolas de colheita, manejo e beneficiamento do fruto.
O projeto nasceu em 2000 com 112 famílias de seis comunidades e hoje reúne 1.238 famílias de 73 comunidades espalhadas por 30 municípios do nordeste goiano, norte mineiro e oeste baiano. Como resultado do trabalho, os produtores lançaram a marca Empório do Cerrado e formaram a Cooperativa Mista de Agricultores Familiares, Pescadores, Guias Turísticos e Vazanteiros do Cerrado, que passou a vender castanha e farinha de baru. A farinha é processada em uma unidade de beneficiamento que a cooperativa construiu no município de Caldazinha. O Cedac financiou o material de construção e os produtores cederam o terreno e a mão-de-obra.
Hoje, os produtos da cooperativa são comercializados por meio de uma Rede de Comercialização Solidária de Agricultores Familiares e Extrativistas do Cerrado. As castanhas de baru já podem ser encontradas em alguns supermercados da rede Pão de Açúcar, em São Paulo, e no comércio varejista local de Goiânia. O fruto tem sido bem aceito e a produção cresce ano a ano.
Em 2000, as famílias que participam da Rede colheram 332 sacos (40 kg por saco) de castanhas de baru. No ano passado, foram 8 mil sacos. Segundo o Cedac, o baru representa hoje entre 2% e 48% da renda líquida das famílias, variando de acordo com as outras fontes de renda que cada famílias tem à disposição.
Em 2001, a farinha de baru passou a fazer parte da merenda escolar da rede municipal de Goiânia. A farinha é usada na canjica, substituindo o coco ralado. Além de ter um maior valor nutritivo, a novidade ajudou a reduzir custos - a refeição de canjica feita com coco ralado custava em média R$ 0,40; com a farinha de baru, este valor caiu para R$ 0,21. De acordo com Alessandra Karla da Silva, engenheira agrônoma do Cedac, a Rede agora estuda a possibilidade de lançar novos produtos feitos a base do baru, como doce e bolachas, entre outros. "Também já desenvolvemos a tecnologia para fabricar carvão a partir do resíduo do baru, mas ainda faltam recursos para lançar o produto no mercado. Fizemos testes em parceria com o Ibama e comprovamos que o carvão de baru tem uma qualidade superior à da lenha nativa".
Para garantir o uso sustentável dos recursos do Cerrado, os associados se comprometem a respeitar alguns princípios comuns. É obrigatório deixar pelo menos 10% dos frutos no pé para permitir uma reprodução saudável; é proibido pôr fogo nas terras para facilitar a colheita; é proibido usar mão-de-obra infantil ou escrava; e as mulheres e os homens recebem igualmente por seu trabalho, de acordo com a produção.

Favela - Outro fruto nativo que a Rede comercializa é a favela, que é usada pela indústria farmacêutica. "Os laboratórios extraem elementos que são utilizados em medicamentos para o tratamento de glaucoma e de problemas de circulação", explica Alessandra. No ano passado, a Rede colheu 54 toneladas de favela. A união das famílias ajudou a eliminar os atravessadores, que intermediavam as vendas com as indústrias farmacêuticas e ficavam com a maior parte dos lucros. Hoje, as famílias recebem R$ 0,83 por quilo de favela. Antes de o trabalho começar, o rendimento era de R$ 0,10 por quilo.
"O impacto para as famílias tem sido enorme. Além de conhecer e valorizar melhor o Cerrado, o projeto ajudou a fortalecer a identidade dessas comunidades, que agora até começam a ter influência nas políticas públicas, como no caso da merenda escolar", avalia Alessandra. "Elas ganham uma autonomia que não tinham, e já não são mais tão excluídas como antes."
Segundo Alessandra, novos projetos da Rede podem incluir a produção de óleo de outros frutos típicos como o pequi, mamona e buruti, entre outros.

OESP, 26/01/2004, p. B7

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