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Casaldáliga critica opção pela "agroindústria depredadora"

Gazeta de Cuiabá-Cuiabá-MT
15 de Fev de 2004

A Gazeta - Está havendo também uma radicalização da questão indígena. Na reserva Raposa/Serra do Sol, em Roraima, por exemplo, índios, que lutam pela demarcação e homologação como área indígena contínua (sem enclaves brancos) fizeram reféns três religiosos. O que está acontecendo com a política indígena?

Casaldáliga - Sentimos a problemática indígena como o problema menos diretamente e radicalmente enfrentado pelo governo Lula. Sei que é um problema de muita complexidade porque atinge diretamente o latifúndio, por um lado. Por outro lado atinge a consciência fraca do povo em geral com respeito aos direitos outros, diferente dos povos indígenas. Estamos habituados em pensar em propriedade particular e a propriedade indígena é a propriedade de um povo. Os povos indígenas são outros povos, mesmo estando dentro do território brasileiro. Falta essa consciência. Você vê o caso concreto e internacional de Raposa/Serra do Sol, de Roraima! Está faltando só assinatura do presidente e o problema está aí, esperando. Estamos vivendo agora o problema dos xavantes que decidiram retornar à sua área, na gleba chamada Suiá-Missú e enfrentando a lerdeza do Judiciário. É verdade que ao longo dos 500 anos os governos da América Latina têm sido, na prática, e, com freqüência na legislação, anti-indigenista e partido para integração dos povos indígenas, descaracterizando-os como povos diferentes. Não se tem respeitado sua terra, sua cultura e sua autonomia.

A Gazeta - Falando em problemáticas, o que mais aflige o sr. em MT?

Casaldáliga - Mato Grosso continua sendo o Estado onde há mais problemática de terra, inclusive um dos Estados entre os três ou quatro mais marcados pelo trabalho escravo no campo. As estradas são verdadeiros desastres. Estamos vivendo aqui, nesse famoso nortinho do MT, o drama das estradas e das comunicações. Com atoleiro, os ônibus chegam com 10 e 15 horas de atraso e várias linhas foram cortadas. Me preocupa muito também a opção pela agroindústria, não porque eu seja contra a agroindústria, mas pela opção que se tem feito pela agroindústria monocultural, depredadora e muito obsessiva pela exportação. Uma agroindústria que olha para fora e esquece a família dentro.

A Gazeta - O governo Blairo Maggi é um dos incentivadores da agroindústria.

Casaldáliga - O nosso governador é o maior produtor individual de soja do mundo e uma das bandeiras dele é a agroindústria. Dá para perceber que muitas das suas políticas estão voltadas para isso. Ele foi eleito por causa disso. Então, sua política, seus assessores, seus projetos mediatos e imediatos estão voltados para isso que eu considero um risco e, às vezes, um desvio. Cada vez mais os governos do terceiro mundo deveriam se voltar para dentro, esquecendo bastante o imperialismo do FMI, a sangria da dívida externa e a obsessão por exportar, que é necessário exportar evidentemente, mas não ter obsessão por exportar a todo custo, deixando a saúde, educação, agricultura, as comunicações e a segurança alimentar em segundo ou terceiro planos.

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