VOLTAR

Casal perdeu três filhos em sete anos

Zero Hora - Porto Alegre - RS
15 de Mar de 2001

Desnutrição severa matou caingangue de um ano de idade acampado em Bagé

O casal caingangue Cenira, 31 anos, e Cláudio Sales, 30 anos, acampado em um terreno baldio da Rua Sílvio da Silva Tavares, em Bagé, viu se repetir na terça-feira, mais uma vez, a cena de perder um filho.
Com um ano, Gilnei foi o terceiro filho do casal a morrer nos últimos sete anos. O médico legista João Manoel Testa atestou morte por desnutrição severa.
Amorte do indiozinho surpreendeu a família. Ele estava brincando com um dos três irmãos à beira do fogo em que a mãe cozinhava. Ismael, dois anos, encostou um canudinho quente no braço do menino, que chorou por instantes e depois caiu. Somente um tempo depois, Cenira percebeu que o menino estava inerte.
– Quando toquei nele, estava molinho, mas bem pretinho – relata a mãe, que chegou ao pronto-socorro com o menino já sem vida.
Alojados no município desde a segunda-feira, os caingangues retornaram a Bagé em busca de tranqüilidade e com a intenção de fixar residência. A Fundação Nacional de Saúde (Funasa) estima que cerca de 800 índios caingangues e guaranis estejam itinerantes pelo Estado.
A família Sales espera conseguir em Bagé uma casa para morar. A maior necessidade é um fogão e algumas panelas. Sales pretende também um emprego para sustentar a família.
– Não sei como se faz, mas posso aprender a ser carpinteiro – diz.
Há dois anos, quando estiveram no município, os caingangues conheceram a professora aposentada Maria do Carmo da Rosa Azambuja, 49 anos. A amizade lhe rendeu um afilhado, Ismael, e a confiança dos índios.
– Queremos morar aqui, porque temos amigos – afirma Cenira.
O grupo de quatro adultos e agora três crianças – além de Ismael, Jocimar, oito anos, e Maicon, cinco – veio do Posto de Irapoá, em Tenente Portela, e perambula pelo Estado há 10 anos, vendendo artesanato. Analfabetos, sem certidão de nascimento nem profissão – sabem apenas caçar, pescar e produzir artesanato –, os Sales têm uma renda mensal de R$ 30 oriunda da venda de balaios. Embora represente 20% de um salário mínimo, o casal diz que as condições em que vivem ainda são melhores do que as oferecidas na aldeia.
– Lá, sim, estávamos sozinhos – diz Cenira.
Informada da morte de Gilnei, a Secretaria Municipal de Saúde e Meio Ambiente de Bagé providenciou uma cesta básica com 20 quilos de alimentos – arroz, feijão, massa, açúcar e óleo – para as duas famílias. Ontem à tarde, as crianças receberam assistência médica e roupas.

CONTRAPONTO
O que diz a Fundação Nacional de Saúde (Funasa):
A técnica em enfermagem da Funasa do Pólo Base de Passo Fundo, Elenir Coroaia, afirma que não existe um programa de atendimento para populações indígenas itinerantes. Segundo ela, as famílias só receberão assistência se voltarem à aldeia.

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.